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Paciência, no topo da lista do que falta no Cairo

Por BEN , HUBBARD , É JORNALISTA , BEN , HUBBARD e É JORNALISTA
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Já havia passado da meia-noite quando Mahmoud Hifny perdeu a calma. Ele havia suado no tráfego enquanto o ponteiro de combustível oscilava ameaçadoramente sobre o vermelho. Entrou numa fila que serpenteava até um dos poucos postos com gasolina do centro do Cairo. Duas horas depois, ainda esperava, num mar de carros cujos motoristas também haviam perdido horas. "Vamos nos livrar desses filhos de cães!", gritou Hifny, de 42 anos, para ninguém em particular, embora todos soubessem que ele se referia ao presidente Mohamed Morsi e seus aliados. Motoristas próximos assentiram com a cabeça. Uma poderosa confluência de crises engolfa o Egito no momento em que as temperaturas do verão sobem. O mal-estar econômico se espalha pouco antes do Ramadã, a temporada mais dispendiosa do ano para muçulmanos que jejuam durante o dia e celebram à noite. Por trás da insatisfação, está um presságio de que os protestos planejados para esse fim de semana pela saída de Morsi podem desencadear mais violência e empurrar o país para uma instabilidade política mais profunda. Os protestos e contraprotestos devem atingir o auge amanhã, aniversário da posse de Morsi como o primeiro presidente livremente eleito do país, embora a oposição diga que permanecerá nas ruas até que ele caia. Famílias se apressam para terminar suas compras para o Ramadã mais cedo, para o caso de as lojas ficarem fechadas. A polícia tem colocado barreiras para separar as filas por gasolina do trânsito normal e intervém ocasionalmente para impedir fura-filas e trocas de socos. Os motoristas passam o tempo conversando e discutindo com seus vizinhos, tirando soneca e brincando com celulares. Vendedores de jornais fazem um bom negócio. "Tentamos rir da situação, o que mais podemos fazer?", disse, em um dos congestionamentos, Khalid Shaaban, de 35 anos, enquanto ligava a música e chamava a mulher, a irmã e três filhos para baterem palmas e acompanharem o ritmo. "No tempo de Hosni Mubarak, sabíamos que as pessoas estavam roubando, mas nunca houve crises como essa", disse, referindo-se a ao presidente deposto em 2011. "Tudo porque o sujeito que está dirigindo o país agora não sabe dirigir." Alguns acusam os inimigos de Morsi de interferirem nos suprimentos para aumentar o apoio aos protestos. Outros sugerem que o presidente limitou a distribuição para atrapalhar os manifestantes. O ministro do Petróleo, Sherif Haddara, reduziu a importância da escassez, dizendo ter havido um erro técnico no armazenamento. Quanto aos cortes frequentes de eletricidade, o ministro do Desenvolvimento, Mohamed Ali Beshr, sugeriu que os egípcios sigam o exemplo do premiê Hesham Qandil, que trabalha no calor. "Transpiramos em seu escritório", disse Beshr, uma observação incapaz de aplacar os ânimos. "Ele tira a gravata e não aceita que liguem o ar-condicionado." / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

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