Pequim impõe silêncio a dissidente

Solto quarta-feira, artista plástico Ai Weiwei diz ao 'Estado' que está proibido de dar entrevistas sobre os meses que passou na prisão

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Por Cláudia Trevisan
Atualização:

O artista plástico Ai Weiwei não poderá sair de Pequim por pelo menos um ano, período no qual estará proibido de dar entrevistas e de escrever no seu blog e em sua conta no Twitter, que eram os seus principais instrumentos de crítica ao Partido Comunista. Essa foi a condição imposta para sua libertação, disse ontem o próprio artista em conversa telefônica com o "Estado". "Eu não sabia que seria solto até o último momento e obviamente estou muito feliz", declarou Ai, ressaltando que estava impedido de falar sobre sua prisão e soltura. O artista disse que não poderia fazer comentários sobre a informação da agência oficial de notícias Nova China de que ele teria confessado "seus crimes" - oficialmente, ele era acusado de sonegação fiscal. Tampouco está claro se as restrições a seu principal instrumento de ação política - a palavra - serão levantadas no prazo previsto. "Daqui a um ano, eles vão ver", observou Ai. Seu blog e Twitter tinham milhares de seguidores e eram o espaço no qual ele denunciava arbitrariedades e demandava explicações sobre fatos que o partido gostaria de esquecer. A morte de quase 6.000 alunos de escolas primárias e secundárias no terremoto que atingiu a Província de Sichuan em 2008 foi um dos principais elementos de tensão na relação entre Ai e as autoridades chinesas. O artista iniciou em seu blog uma campanha para identificar todos os estudantes mortos no desabamento de escolas que aparentemente não atendiam a padrões mínimos de segurança. O movimento foi interrompido em maio de 2009, quando a censura pôs fim à página do artista na internet. Ai continuou extremamente ativo no Twitter, onde postou 60.162 mensagens até 3 de abril, data de sua prisão. Apesar de sua ausência desde então, seu número de seguidores online continuou a subir e estava ontem em 88.491 seguidores - anteontem eram 88.263. O endereço é twitter.com/aiww. Na avaliação de Jerome Cohen, da Faculdade de Direito da Universidade de Nova York, a soltura de Ai, mesmo sob condições, é "o melhor resultado que se poderia esperar nas circunstâncias desse caso". Cohen é especialista em legislação chinesa e acompanha a situação dos milhares de presos políticos do país - quase todos sem a projeção internacional que provavelmente ajudou a colocar fim à prisão do artista plástico. Apesar de ser normalmente traduzido como "fiança" para o inglês, a situação na qual Ai foi libertado se assemelha no Brasil a um misto de liberdade condicional e espera de julgamento em liberdade. Segundo Cohen, o artifício é normalmente utilizado pelas autoridades como uma maneira de manter as aparências em casos de natureza controvertida. Nessas situações, a investigação pode continuar por até um ano - que coincide com o prazo de silêncio e restrição de locomoção imposto ao artista. Ao longo desse período, normalmente a investigação é abandonada, "desde que o suspeito se comporte nos termos do acordo negociado e nada ocorra para frustrá-lo".

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