Perfil: Um general com discurso islamofóbico

Trump contratou Michael Flynn, apesar de alerta de Obama, que o demitiu por seu ‘frágil apego à verdade’

PUBLICIDADE

Por Cláudia Trevisan , Correspondente e Washington
Atualização:

Michael Flynn ocupou uma das posições mais importantes do governo americano e trabalhava a poucos passos do Salão Oval ocupado pelo presidente Donald Trump. General da reserva, ele se aproximou do candidato em 2015 e ganhou espaço cada vez maior na campanha, durante a qual professou visões islamofóbicas e disseminou teorias conspiratórias.

Michael Flynn se declarou culpado e fechou delação com o procurador especial Robert Muller Foto: Chip Somodevilla/Getty Images/AFP

PUBLICIDADE

Na Convenção do Partido Republicano, que oficializou a candidatura de Trump, em julho de 2016, Flynn foi o orador que estimulou os gritos de “Prendam ela!”, dirigidos pela plateia à democrata Hillary Clinton. A candidata foi investigada pela suspeita de colocar em risco informações confidenciais ao decidir usar um servidor privado de internet no Departamento de Estado, mas foi isentada de responsabilidade no encerramento do caso.

+ Trump escolhe estrategista militar para ser chefe de Segurança Nacional

“Se eu tivesse feito um décimo do que ela fez, estaria hoje na prisão”, disse Flynn na época. Ontem, depois de se declarar culpado de mentir ao FBI, o general da reserva encontrou manifestantes que gritavam: “Prendam ele!”.

Além da visão negativa do islamismo, Flynn compartilhava com Trump a simpatia pela Rússia e a convicção de que os EUA deveriam cooperar com o país na luta contra o terrorismo. Em dezembro de 2015, ele participou em Moscou da celebração do 10.º aniversário da Russia Today, rede de TV que é considerada um braço de propaganda do Kremlin. Flynn recebeu US$ 45 mil para discursar no evento, no qual se sentou ao lado do presidente russo, Vladimir Putin.

A Rússia não era o único país estrangeiro com o qual o general da reserva manteve contatos durante a campanha. No acordo de delação premiada divulgado ontem, ele admitiu ter mentido sobre os termos de contrato de US$ 530 mil pelo qual se comprometeu a defender interesses da Turquia nos Estados Unidos.

O trabalho foi realizado entre agosto e novembro de 2016, período no qual Flynn recebia relatórios confidenciais do governo americano dados à cúpula das campanhas democrata e republicana nos meses que antecederam a eleição. O contrato com a Turquia foi rescindido em 15 de novembro, três dias antes de ele ser apontado como futuro chefe do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca.

Publicidade

Em 8 de novembro, quando os americanos foram às urnas, o website The Hill publicou artigo no qual Flynn fazia uma defesa incondicional do presidente Recep Tayyip Erdogan e justificava sua repressão a opositores e dissidentes. “Nós temos de começar a entender que a Turquia é vital para os interesses dos EUA”, escreveu.

A legislação americana exige que atividades de lobby em favor de governos estrangeiros sejam registradas no Departamento de Justiça. Flynn só realizou o processo em março e, mesmo assim, forneceu informações falsas ao governo.

O general da reserva serviu por 30 anos no Exército. Em 2012, ele foi nomeado pelo ex-presidente Barack Obama para a chefia da Agência de Inteligência de Defesa, da qual foi demitido dois anos depois por incompetência e pelo “frágil apego à verdade”. A partir daí, começou a professar visões cada vez mais extremas em relação a muçulmanos.

“Nós estamos enfrentando outro ‘ismo’, da mesma forma que enfrentamos o nazismo, o fascismo, o imperialismo e o comunismo”, declarou em palestra proferida em agosto de 2016. “Ele é o islamismo, um câncer insidioso no corpo de 1,7 bilhão de pessoas neste planeta e ele tem de ser extirpado.” No encontro que teve com Trump logo depois da eleição, Obama alertou o sucessor sobre Flynn e recomendou que ele não participasse do governo. O bilionário ignorou o conselho. / C.T

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.