Peronistas celebram 'Dia da Lealdade' sem Cristina Kirchner

Milhares de kirchneristas marcharam em Buenos Aires para celebrar data e declarar apoio a presidente

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Por Ariel Palacios e correspondente em Buenos Aires
Atualização:

BUENOS AIRES - Os peronistas celebraram nesta quinta-feira, 17, o "Dia da Lealdade", a data por excelência desse movimento fundado em 1945 pelo então coronel Juan Domingo Perón. Nesse dia, há 68 anos, um multidão de trabalhadores foi às ruas a liberação de seu ídolo, autor de diversas leis trabalhistas. A presidente Cristina Kirchner não participou das cerimônias, já que está de licença médica, motivada pela operação que sofreu na terça-feira da semana passada nas membranas cerebrais. No entanto, cartazes espalhados pela cidade mostravam em uma fotomontagem um virtual "encontro" entre dois casais peronistas: Néstor Kirchner e Cristina com Perón e Evita Perón.

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Milhares de militantes kirchneristas marcharam ontem no centro portenho, rumo à Praça de Mayo, para celebrar o "Dia da Lealdade" e declarar respaldo a Cristina, cujo governo enfrentará decisivas eleições parlamentares no dia 27. As pesquisas indicam que o governo sofreria uma dura derrota nas urnas. "Todos com Cristina" eram os dizeres das faixas. A poucos quarteirões dali os sindicatos aglutinados na Confederação Geral do Trabalho (CGT), central que rachou com Cristina no ano passado, fazia sua própria cerimônia, com críticas à falta de "peronismo" da presidente, a quem acusa de "trair" a classe trabalhadora.

O governador da província de Buenos Aires, Daniel Scioli, kirchnerista 'light' que desponta como virtual candidato à sucessão de Cristina em 2015, comandou uma das cerimônias governistas. Scioli afirmou que Cristina "voltará daqui a poucos dias", sugerindo um virtual retorno antes do final dos 30 dias de licença.

O principal rival do kirchnerismo nas eleições parlamentares, o ex-kirchnerista Sergio Massa, prefeito de Tigre, presidiu uma cerimônia onde reuniu representantes do peronismo dissidente.

Os participantes de todas as cerimônias entoaram a marcha "Los Muchachos Peronistas", canção que tem um refrão que diz "combatendo o capital". No entanto, muitos deles possuem boa relação com o capital, registrando significativos aumentos em seus patrimônios. Vários ministros do gabinete Kirchner moram no elitista bairro de Puerto Madero ou na elegante avenida Libertador. A própria Cristina é oficialmente a segunda presidente mais rica da América do Sul, atrás do presidente chileno, o bilionário Sebastián Piñera.

A "lealdade" é considerada a principal commoditie do partido. Mas tem seus limites, algo que pode ser verificado na atual fuga de aliados que a presidente Cristina padece. O fenômeno é corroborado por um velho ditado do partido: "os peronistas te acompanham até a porta do cemitério. Mas não entram ali".

COMANDO

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Ao longo dos últimos 67 anos, desde a eleição de Perón em 1946, os peronistas governaram o país durante 35 anos. E desde a morte do líder em 1974, todos os setores internos do peronismo afirmam que são os verdadeiros representantes do pensamento do mítico Perón.

Atualmente o peronismo divide-se entre "kirchneristas" e "peronistas dissidentes". Os kirchneristas também possuem uma subdivisão, a dos "cristinistas", em contraposição aos que consideram que, quando Kirchner estava vivo, o peronismo era mais autêntico. Além disso, estão os "sciolistas", uma vertente "light" e pró-consenso do kirchnerismo.

Os peronistas dissidentes também padecem diversas divisões internas e não contam com um líder único.

O movimento, desde sua criação, incluiu pessoas dos mais diversos posicionamentos políticos, desde ex-comunistas maoistas, passando por neoliberais ortodoxos (e também Chicago Boys flexíveis), keynesianos, entre outros. O ex-presidente Carlos Menem, emblema do neoliberalismo nos anos 90, atualmente senador, respalda Cristina e sua estatização da empresa petrolífera YPF. Em 1991 foi a vez do casal Kirchner apoiar sua privatização.

FELINOS

Perón indicava que as divergências dentro do peronismo não eram um problema. Ao contrário, contribuíam para a expansão inexorável de seu movimento: "quando os outros nos ouvem gritar acham que estamos brigando. Nada disso..somos como os gatos. Estamos nos reproduzindo!".

Em 1972, quando voltou brevemente à Argentina no final de seu período de exílio, Perón deu uma coletiva de imprensa na qual um jornalista estrangeiro lhe perguntou sobre as forças políticas que disputavam os

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votos dos argentinos. Perón mencionou os integrantes da União Cívica Radical, os socialistas, os conservadores, entre outros. Mas, não citou o peronismo. O jornalista lhe chamou a atenção sobre essa aparente omissão. Perón respondeu com ar maroto: "não...é que peronistas somos todos!"

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