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Políticos tentam esvaziar órgão contra corrupção

Queniano enfrenta deputados para combater crimes contra economia

Por Renata Miranda
Atualização:

Há 29 anos, o queniano Aaron Ringera luta para conter crimes de suborno em um dos países com os maiores níveis de corrupção do mundo. A fala calma e pausada de Ringera pouco tem a ver com o trabalho agitado e dinâmico que ele desempenha: desde setembro de 2004, é o diretor da comissão Anticorrupção do Quênia, agência responsável por investigar e levar a julgamento casos de fraudes e subornos no país. O que já não era um trabalho fácil, ficou mais difícil desde o começo de março, quando alguns deputados do país apresentaram uma proposta para diminuir o poder da comissão. A comissão Anticorrupção do Quênia é uma agência do Estado que atua com independência em relação aos poderes. Desde que foi criada, em maio de 2003, implementou um código de conduta que obriga ocupantes de cargos públicos a declarar seus bens e fontes de renda anualmente. É esse o poder que o Legislativo quer tirar da agência. "Os legisladores acham que a comissão é muito poderosa e suas medidas estão em desacordo com a Constituição do Quênia, mas no fundo, eles têm medo", disse Ringera ao Estado, por telefone. Advogado formado pela Universidade de Nairóbi, o diretor da comissão alega que um tribunal constitucional já declarou que os poderes da agência não interferem nos direitos dos cidadãos quenianos. Segundo dados da Transparência Internacional, organização não-governamental que se dedica a medir a corrupção mundial, o Quênia ocupa o 21º posto no ranking dos países mais corruptos - entre os 163 pesquisados em 2006 -, uma posição pior do que a de vizinhos africanos, como Zimbábue e Ruanda. Dados da mesma instituição indicam que a corrupção custa ao Quênia, por ano, cerca de US$ 1 bilhão. Desde que assumiu o cargo há três anos, Ringera investigou 284 pessoas por denúncias de crime contra a economia. No ano passado, investigações da comissão Anticorrupção do Quênia forçaram a demissão de três ministros do país. Segundo a legislação do Quênia, um funcionário acusado é imediatamente suspenso do cargo. Se, terminada a investigação, for considerado inocente, é reintegrado. Ringera, de 56 anos, acredita que a maior conquista de sua gestão foi ter quebrado a cultura de impunidade que reinava no país. "Hoje, todos no Quênia sabem que se houver uma denúncia de corrupção contra alguém, uma investigação será feita independentemente do cargo que o acusado ocupa no governo ou sua posição social." Segundo a Transparência Internacional, entre os principais obstáculos para conseguir acabar de vez com a corrupção no Quênia estão a falta de vontade de líderes políticos e o conformismo da população. Ringera reconhece esses problemas, mas mesmo assim não desanima. "Lutar contra a corrupção não é um trabalho fácil, estamos sempre nadando contra a maré, mas é importante persistir e não desistir." Para o diretor da comissão, o problema da corrupção não se limita aos países africanos. "A corrupção é um problema global que, para ser controlado, precisa de parcerias entre o setor privado, o governo, a comunidade internacional e os próprios cidadãos."

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