PUBLICIDADE

Portas fechadas à imigração

Por Jamil Chade
Atualização:

   Cigana reage à prisão em Craiova, sul da Romênia: imigrantes ilegais estão sendo deportados da França e voltando para o país

 

A periferia de Grenoble, cidade no pé dos Alpes, ganhou o centro das atenções nos últimos dias. Jovens desempregados e filhos de imigrantes tinham atacado um policial em julho, queimando carros e transformando o bairro em um campo de batalha.O resultado foi a implementação de uma nova política de imigração por parte do presidente francês, Nicolas Sarkozy, com a expulsão de ciganos e a proposta de lei que determina que um estrangeiro que receba nacionalidade francesa não pode cometer nenhum crime. Caso o faça, sua cidadania francesa será sumariamente retirada. O bloco de apartamentos onde a crise ocorreu - conhecido como Villeneuve - foi construído nos anos 70, como uma verdadeira utopia de cidadãos da geração de 1968 que buscavam criar uma sociedade perfeita. Hoje, 70% dos moradores do bairro são estrangeiros e filhos de imigrantes. O local transformou-se no símbolo da dificuldade da Europa de integrar um verdadeiro exército de imigrantes de mais de 17 milhões de pessoas. Com leis mais duras sendo adotadas a cada ano e uma crise econômica provocando as maiores taxas de desemprego em décadas, as tensões latentes que já existiam se transformaram que confrontos reais. Dados oficiais da União Europeia mostram que as portas do continente de fato se fecharam. O número de expulsões aumentou, os retornos voluntários reverteram anos de expansão da imigração e o número de estrangeiros desembarcando sem visto caiu de forma recorde. "Se hoje eu tivesse de decidir se iria para a Europa com minha família, pensaria duas vezes", disse Nadine, uma francesa de origem argelina que vive em Villeneuve. Seus pais emigraram para a França e foi na Europa que tiveram seus três filhos. "Dizem que somos franceses, mas vivemos em guetos", afirmou Nadine, de 28 anos, e desempregada há 2 anos. "O pior é que, agora, somos usados para que políticos populistas ganhem voto de uma sociedade amedrontada", acusou. Segundo ela, nem mesmo motoristas de ônibus querem passar pela região à noite. "Temos um sério problema para garantir a integração da segunda geração de imigrantes, mesmo que eles sejam 100% franceses e pela lei tenham os mesmo direitos de todos os franceses", afirmou Pierre Chambon, diretor do Centro Comunitário de Villeneuve. Ele diz que "24% da população do bairro não têm trabalho e, entre os jovens, a taxa é de quase metade"."A conclusão é que muitos filhos de imigrantes sentem-se menos franceses que seus pais, que são os imigrantes originais", disse Chambon. A constatação é de que a crise não se limita à periferia da cidade francesa. Em toda a Europa, parte dos novos imigrantes tem optado ou são forçados a tomar caminho de volta para seus países. Governos como o de França, Espanha, Itália, Grã-Bretanha e República Checa criaram programas de ajuda financeira para aqueles que prometerem voltar a seus países de origem e garantirem que não pisarão na Europa pelos cinco anos seguintes. Os critérios para ganhar a cidadania ou o visto de trabalho também foram endurecidos em vários países. Na Grã-Bretanha, um projeto de lei estipula que alguém que receba seu visto de trabalho não pode levar consigo sua família. Para algumas profissões, os britânicos chegam a exigir títulos de mestrado dos postulantes ao visto. Na Alemanha, o governo criou um sistema de pontos, exigindo que os estrangeiros passem em exames sobre língua alemã para que ganhem o passaporte. O Ministério da Justiça da Espanha ainda estabeleceu um teste escrito para estrangeiros que se casem com espanhóis, tentando assim evitar casamentos de conveniência para garantir o passaporte europeu. O Estado obteve uma cópia do teste que busca saber do estrangeiro se ele de fato conhece a pessoa com quem vai se casar. Entre as perguntas, o Ministério da Justiça quer saber qual a cor preferida da parceira, a comida preferida, em que lado da cama costuma dormir e até quantos namorados ela ou ele teve antes de se casar.Fluxo. Diante da crise econômica e dos verdadeiros muros físicos e legais criados pelos países, o número de novos imigrantes despencou em 2009 e 2010. Segundo a Frontex, agência de coordenação das fronteiras europeias, o número de imigrantes ilegais pegos nas fronteiras da UE caiu de 175 mil em 2008 para 105 mil em 2009. No primeiro trimestre deste ano, 14,2 mil estrangeiros foram detectados tentando entrar na UE, 39% abaixo dos níveis de 2009. Na fronteira entre a Grécia e Turquia, a queda foi de 60%. "Essa queda é atribuída à redução de oportunidades de trabalho para imigrantes irregulares na Europa", disse a Frontex, em um comunicado. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, a crise econômica foi duramente sentida pelos imigrantes na Europa.Um estudo realizado pela Adecco e pela IESE Business School também comprovou a mudança no padrão de migrações na Europa diante da crise. A Espanha, país com 20% de taxa de desemprego, foi também o país da UE com o maior número de saída de trabalhadores estrangeiros em 2009, cerca de 90 mil. Um fenômeno similar foi visto na Irlanda e Hungria. No geral, a expansão de estrangeiros no mercado de trabalho europeu foi amplamente freada. Em 2008, o crescimento havia sido de 10,2%. No ano passado, a alta foi de apenas 2%. A queda, porém, não significa que os estrangeiros desapareceram. "A Espanha continua a ser o país com a maior proporção de imigrantes na população economicamente ativa. São 3,6 milhões de pessoas, ou 15,8% da força de trabalho", afirma o estudo.Além da crise, outro motivo da queda no fluxo de novos imigrantes é o fato de que os estrangeiros sabem que a Europa tem fechado suas portas. A Frontex usa satélites e um verdadeiro exército para impedir a chegada de estrangeiros irregulares.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.