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Povo iraquiano vive etapa humilhante, diz Vieira de Mello

Por Agencia Estado
Atualização:

O povo iraquiano está vivendo uma das etapas mais "humilhantes" de sua história com a ocupação das forças da coalizão, lideradas pelos Estados Unidos. A avaliação é do brasileiro Sérgio Vieira de Mello, representante da ONU em Bagdá, em entrevista, por telefone, à Agência Estado. Ele sugere que a Casa Branca deixe claro que a ocupação do país é apenas "provisória" para que a tensão que vive a população seja reduzida. Eis os principais trechos da entrevista: Agência Estado - O Conselho de Segurança da ONU acaba de aprovar uma nova resolução sobre o Iraque que aponta algumas mudanças na organização em Bagdá. Como isso pode influenciar no trabalho de seu escritório? Vieira de Mello - Teremos agora uma missão única da ONU no Iraque. Com a nova resolução do Conselho de Segurança, vou aumentar minha capacidade de integrar as diferentes iniciativas das Nações Unidas para que os trabalhos sejam mais coerentes e mais eficazes. AE - A resolução ainda saúda o Conselho de Governo do Iraque, entidade criada em julho. Como isso pode ajudar no processo de reconstrução do país? Vieira de Mello - Acho isso um elemento positivo. O Conselho de Governo preenche um vácuo de poder que existia até muito pouco tempo, já que os 25 indivíduos que fazem parte do órgão representam o tecido étnico e social do país. Esse Conselho é o primeiro passo em direção ao retorno de um governo com plena soberania no Iraque, que teria a capacidade e o poder de garantir serviços básicos, como água e saúde e que, pouco a pouco, ficaria responsável pela segurança do país. AE - Quais serão as próximas etapas até que o Iraque volte a ter um governo soberano? Vieira de Mello - O Conselho de Governo já criou uma comissão que irá avaliar opções de constituição para o país. Em algumas semanas, esse estudo será apresentado aos membros do Conselho, que irão optar pelo caminho que desejam tomar. Dependendo da opção, eleições legislativas já poderiam ocorrer em 2004. A partir daí, com o estabelecimento de um poder legislativo, um novo governo poderia ser formado, o que colocaria fim ao mandato da coalizão no Iraque. AE - Apesar de o processo de criação do novo governo estar em andamento, vemos que praticamente todos os dias existem ataques contra militares americanos. Qual tem sido a reação da população quanto à ocupação do Iraque pela Coalizão? Vieira de Mello - Está sendo traumática. Esse deve ser um dos períodos mais humilhantes da história desse povo. Quem gostaria de ver seu país ocupado? Eu não gostaria de ver tanques estrangeiros em Copacabana. AE - O que os Estados Unidos podem fazer para acalmar o sentimento antiamericano entre a população? Vieira de Mello - Essa é uma pergunta difícil, principalmente porque não sabemos quem está exatamente na origem dos ataques. O que sabemos é que a solução não será simples e acredito que uma série de medidas seriam necessárias. AE - Quais seriam essas medidas? Vieira de Mello - Em primeiro lugar, as forças da coalizão devem dar confiança ao povo iraquiano e resolver os problemas cotidianos, como falta de água e a questão de saúde. Algumas medidas também devem ser tomadas no que se refere à segurança. Uma nova polícia iraquiana deve ser criada, já que nenhum estrangeiro pode impor a segurança. Outro elemento que deveria ser considerado pelas forças estrangeiras seria o de levar em conta as tradições locais e ter mais sensibilidade e respeito pelos costumes da população ao conduzirem operações de segurança e de captura de ex-membros do regime de Saddam Hussein. Para completar, uma iniciativa pudesse garantir ao povo que o processo de ocupação não é indefinido no tempo.

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