19 de novembro de 2013 | 02h10
Embaixadores e representantes de organizações internacionais que se reuniram ontem na Organização dos Estados Americanos (OEA) para ouvir discurso no qual o secretário de Estado John Kerry apresentaria a política dos EUA para a região saíram frustrados com a falta de substância do pronunciamento e a ausência de uma visão estratégica para o relacionamento com a América Latina.
Kerry ignorou a questão da imigração, crucial para países como México e El Salvador, falou de passagem do mal-estar provocado pela Agência de Segurança Nacional (NSA) e dedicou boa parte do discurso a criticar Cuba, país que não é membro da OEA, mas com o qual todos os demais integrantes têm relações diplomáticas. Com o fracasso de iniciativas anteriores de integração comercial e a rejeição cada vez maior da política de combate às drogas, Kerry defendeu a integração energética e ações para mitigar mudanças climáticas como temas de cooperação na região.
Nenhum das duas questões é tratada pela OEA. "Parecia um discurso feito para outra plateia", observou um diplomata ouvido pelo Estado. O secretário silenciou em um ponto que interessa diretamente à entidade: a decisão do Congresso americano de limitar sua contribuição financeira a 50% dos gastos totais da OEA. Atualmente, os EUA bancam quase 60% das despesas.
Peter Hakim, presidente emérito do Diálogo Interamericano, acredita que a falta de substância do discurso reflete a ausência de uma política para a América Latina do presidente Barack Obama. "Não me lembro de uma administração menos envolvida com a região do que essa", afirmou Hakim, que vê com ceticismo a proposta de usar integração energética e a mudança climática como canais para fortalecer o relacionamento. "Não há acordo nem dentro dos EUA sobre isso e até hoje não conseguimos integração energética com o Canadá."
A iniciativa da realização do discurso partiu de Kerry, que em novembro do ano passado, ainda na condição de senador, enviou uma carta ao conselho permanente da OEA com críticas devastadoras à administração da entidade. Assinado por ele e outros três senadores da Comissão de Relações Exteriores, o documento atacava a "paralisação administrativa", a "falta de foco estratégico" e a resistência na adoção de "decisões financeiras difíceis".
Apesar de seu nome não estar na carta, o alvo das críticas era o secretário-geral da OEA, o chileno José Miguel Insulza, que ontem recebeu Kerry na sede da entidade. Além de criticar Cuba, Kerry também censurou o enfraquecimento de instituições democráticas na Venezuela.
O único momento em que houve aplausos antes do fim do discurso foi quando ele afirmou algo repetido inúmeras vezes por autoridades americanas nas últimas décadas: "A era da doutrina Monroe acabou", disse. Kerry citou ainda o escritor brasileiro Paulo Coelho: "Quando menos esperamos, a vida coloca diante de nós um desafio para testar nossa coragem e nossa vontade de mudança".
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