Putin joga pesado para manter maioria

Partido governista põe máquina estatal na rua para evitar sangria de votos na Duma

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Por TALITA EREDIA
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A poucos dias das eleições legislativas, o partido governista Rússia Unida luta contra o tempo para reverter as pesquisas de intenção de voto, que apontam que a legenda não obterá maioria na Duma, a câmara baixa do Parlamento. Além da tradicional mobilização da máquina estatal, a tática agora é usar o funcionalismo público para a campanha corpo a corpo.Um relatório da organização russa independente Golos, que fiscaliza o processo eleitoral, mostra que o Rússia Unida passou a mobilizar empregados de estatais para fazer campanha. "São professores e médicos obrigados a convencer a população a 'votar certo'. Autoridades condicionam a continuidade de programas sociais ao partido", disse ao Estado o diretor de comunicação da ONG, Dmitri Merezhko. Além do uso de obras públicas para campanha e da extensa presença em transmissões de TV, o relatório cita ainda o impedimento da circulação de jornais que não apoiam o governo e um projeto conhecido como "Amigos", em que todos os funcionários da cidade de Kolyvanskiy Rayon, no centro do país, são obrigados a aderir a uma espécie de contrato que garante o voto de seus parentes e vizinhos para o Rússia Unida.Apesar de dominar a campanha eleitoral, o Rússia Unida é o segundo colocado em arrecadação (US$ 13,8 milhões). A ONG Golos afirma que é impossível determinar quanto o partido já gastou, já que a maior parte das ações é bancada pelo governo - o partido que mais arrecadou foi o Partido Liberal-Democrata (US$ 15,2 milhões).O premiê Vladimir Putin também autorizou o uso de sua imagem durante a campanha do Rússia Unida, apesar de o presidente Dimitri Medvedev liderar a candidatura do partido ao Parlamento. Sondagens recentes mostram que a popularidade e a aprovação de Medvedev são bem inferiores às de Putin.Sem maioria. Pesquisa divulgada pelo Centro Levada mostra que o Rússia Unida deve eleger 252 dos 450 deputados da Duma, bem menos do que a bancada atual, de 315 representantes. Sem a maioria, o provável futuro presidente, Putin, não conseguirá aprovar mudanças na Constituição apenas com o apoio de sua bancada - como fez Medvedev, ao aumentar o período do mandato presidencial para seis anos e criar o cargo de primeiro-ministro para Putin permanecer no cenário político."Na prática, sem a maioria, Putin será obrigado a negociar com outros partidos da Duma, como já ocorreu antes. Vale lembrar que a oposição russa hoje é formada por partidos que não são contra Putin", afirmou Alex Nice, coordenador do programa de Rússia e Eurásia do Chatham House. Durante a semana, o próprio premiê, em discurso na última sessão da legislatura, advertiu a oposição para que futuros desacordos não afetem a estabilidade do país. "Se comportem com calma, sem agitar o barco, para que ele não vire", afirmou.O especialista acredita que a redução de votos do Rússia Unida venha do descontentamento com o modo como foi conduzido o retorno de Putin à presidência. "Não é só por perceber que não haverá mudança, mas também por desrespeitar a inteligência do eleitor."A especialista Alena Ledeneva, autora do livro How Russia Really Work ("Como a Rússia realmente funciona", em tradução livre) também aposta que essa "oposição controlada" obterá resultados melhores do que em 2007. Das sete legendas concorrentes, apenas as quatro que obtiverem melhor resultado terão o direito de ocupar a Duma. Para a analista, os demais partidos correm o risco de desaparecer até as eleições de 2016. O diretor do centro de estudos União Europeia-Rússia, Fraser Cameron, não descarta uma vitória do Rússia Unida nas urnas com a conquista de mais de 65% das cadeiras da Duma. "É preciso sempre ter em mente que não são os votos que contam, mas sim quem conta os votos", disse.Rivais enfraquecidos. Fundado em 2001, o centrista Rússia Unida foi criado para formar a base política do então presidente Putin. Entre seus opositores, a principal característica é a confusão ideológica. O Rússia Justa, segundo em número de afiliados, promete a criação do socialismo do século 21. O Partido Comunista é basicamente formado por empresários que são ligados à Igreja Ortodoxa. Os social-democratas são pró-estatizações e apoiados por nacionalistas.

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