Queda de Alepo representa vitória da aliança de regimes autoritários sobre países ocidentais
A médio prazo, resultado garante a permanência do líder Bashar Assad no poder e consagra o grupo de vencedores formado por Rússia, Irã e Turquia
Por Redação
Atualização:
PARIS - A queda da cidade síria de Alepo, anunciada na quinta-feira, marca a vitória da "força bruta" da aliança entre regimes autoritários sobre os países ocidentais que optaram por ficar à margem, dando as costas às reivindicações democráticas de milhões de pessoas.
Combatentes "liquidados" e zonas "limpas" são as palavras empregadas pelo regime em Damasco e seu aliado russo, e resumem a estratégia utilizada para reconquistar a ex-capital econômica da Síria, que caiu levando milhões de vítimas, provocando deslocamentos em massa e destruição sem precedentes.
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A queda de Alepo não marca somente o fim da guerra no país, mas é um ponto de inflexão maior após quase seis anos de conflito. A vitória garante, ao menos a médio prazo, a permanência no poder do presidente sírio, Bashar Assad, e consagra uma nova aliança de vencedores - Rússia, Irã e Turquia - diante dos países ocidentais e da potências regionais relegadas ao papel de simples espectadores.
"A primeira lição é que a força e a abstenção têm um custo", destaca Bruno Tertrais, diretor da Fundação de Pesquisa Estratégica. "O envolvimento em massa de Rússia e Irã, que significou um giro maior nesta guerra em 2015", foi a força. “A não intervenção americana, em 2013", é a abstenção, afirma ele.
Em 2013, o presidente americano, Barack Obama, renunciou a bombardear a Síria após acusações de que o regime de Assad havia utilizado armas químicas em um subúrbio de Damasco. "A partir de então, tudo estava dito", avaliou um especialista francês.
Devastação em Alepo obriga moradores a saírem da região
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Devastação em Alepo obriga moradores a saírem da região
Forças do governo sírio recapturaram dos rebeldes cerca de 85% do lado leste da cidade síria de Alepo. Grupos de oposição também perderam territórios ... Foto: REUTERS/Omar SanadikiMais
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Muitas das pessoas que conseguiram escapar do conflito estão agora em um território controlado pelo governo no oeste de onde antes estava localizada a... Foto: REUTERS/Omar SanadikiMais
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Inúmeros civis continuam em meio ao fogo cruzado, e ao menos 46 pessoas foram mortas e outras 230 ficaram feridas em apenas um dia. As pessoas que con... Foto: REUTERS/Omar SanadikiMais
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Mulheres e crianças estão entre os muitos habitantes que tiveram de ser deslocados. Mas ainda existe o temor em deixar a região, já que centenas de ho... Foto: REUTERS/Omar SanadikiMais
Devastação em Alepo obriga moradores a saírem da região
Alepo já foi o grande centro comercial e industrial do país antes de as forças que se opõem ao presidente sírio Bashar Assad começarem a agir, há mais... Foto: REUTERS/Omar SanadikiMais
Devastação em Alepo obriga moradores a saírem da região
As disposições relativas ao auxílio internacional esgotaram e o estoque de alimentos começou a diminuir cada vez mais mesmo antes de as novas pressões... Foto: REUTERS/Omar SanadikiMais
Devastação em Alepo obriga moradores a saírem da região
Alepo foi tomada pela primeira vez na guerra civil síria em julho de 2012, quando rebeldes iniciaram uma ofensiva para expulsar as forças do governo e... Foto: REUTERS/Omar SanadikiMais
Devastação em Alepo obriga moradores a saírem da região
Nos últimosquatro anos, a batalha de Alepo se tornou apenas uma parte do conflito na Síria Foto: REUTERS/Omar Sanadiki
Devastação em Alepo obriga moradores a saírem da região
Assad acredita que reivindicar o controle de Alepo poderia ajudar a mudar o curso da guerra civil a seu favor Foto: REUTERS/Omar Sanadiki
No mesmo ano, os combatentes do movimento xiita libanês Hezbollah, apoiados por Teerã, entraram na guerra síria para apoiar o ditador sírio. O envolvimento militar do Irã e das milícias xiitas estrangeiras aumentaram progressivamente nos anos seguintes. Na ocasião, os países ocidentais - liderados pelos EUA -, as monarquias do Golfo e a Turquia exigiam que Assad entregasse o poder e apoiavam os rebeldes sírios.
Intervenção. Dois anos mais tarde, diante de um regime sírio debilitado, Moscou agiu de forma pesada para salvar seu aliado e esmagar a oposição, qualificada de "terrorista". "Com a intervenção russa, tudo terminou. Soubemos que não poderíamos fazer mais nada", assinala o especialista francês.
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"O fracasso da revolução síria não era inevitável", afirmou Tertrais, que destacou a "falta de disposição" dos países que apoiavam a rebelião.
O conflito sírio começou em março de 2011 com uma revolta pacífica e popular na qual se exigia "uma Síria sem tirania", mas o movimento desapareceu em poucos meses, diante da repressão feroz do regime, da militarização dos rebeldes e da intervenção de potências estrangeiras.
Com a ascensão do grupo jihadista Estado Islâmico (EI), as aspirações democráticas dos sírios passaram ao segundo plano para os países ocidentais. "A Síria se resume à confrontação entre duas barbáries", o regime de Assad e o EI, disse Faruk Mardam-Bey, editor e presidente da associação Suria Huria. "O povo pensa que é melhor escolher a barbárie de gravata, que fala inglês e cuja mulher não usa véu".
Retrospectiva: 10 imagens que marcaram a guerra na Síria em 2016
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Retrospectiva: 10 imagens que marcaram a guerra na Síria em 2016
A guerra na Síria em 2016 agravou ainda mais a crise migratória no mundo. Inúmeras famílias tiveram de deixar seus lares e sua vidas para tentar sobre... Foto: AFP PHOTO / BULENT KILIC Mais
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Soldado do grupo Jaish al-Islam (Exército do Islã) corre para tentar fugir de tiros na região de Tal al-Siwan, controlada pelos rebeldes, nos arredore... Foto: AFP PHOTO / Sameer Al-DoumyMais
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Pessoas caminham em meio aos destroços de prédios destruídos por ataques aéreos na área de Al-Kalasa, na cidade de Alepo, controlada por rebeldes Foto: AFP PHOTO / AMEER ALHALBI
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Garoto sírio lamenta morte de parente morto em um ataque aéreo em Alepo Foto: AFP PHOTO / KARAM AL-MASRI
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Em setembro, bombardeios mataram centenas de sírios nas áreas do país controladas por rebeldes, enquanto a oposição considerava se unir ao acordo de c... Foto: AFP PHOTO / AMEER ALHALBIMais
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Voluntários da Defesa Civil da Síria, conhecidos como Capacetes Brancos, resgatam garoto dos escombros de um prédio destruído no bairro de Bab al-Nair... Foto: AFP PHOTO / AMEER ALHALBIMais
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Um vídeo divulgado em agosto pelo grupo ativista Centro de Mídia de Alepo (AMC, na sigla em inglês) chocou o mundo com a imagem do menino Omran, de qu... Foto: AFP PHOTO / AMC Mais
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Membros do Crescente Vermelho sírio e outros voluntários procuram por vítimas após bombardeio das forças do governo em cidade próxima a Damasco Foto: AFP PHOTO / Abd Doumany
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Visão geral do Templo de Bel em março mostra é comparada auma fotografia tirada no mesmo local, dois anos antes, em frente ao que sobrou do lugar hist... Foto: AFP PHOTO / JOSEPH EIDMais
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Exército sírio participa de batalha contra membros do Estado Islâmico em Yamoul,no norte da Síria Foto: AFP PHOTO / Nazeer al-Khatib
Moscou, Teerã, Damasco e Ancara são os grandes vencedores deste conflito, apontou um diplomata europeu. Mas os interesses destes países não são os mesmos, destacam vários especialistas.
Entre Assad, que pretende reconquistar todo o país; Rússia, que se conformaria com uma "Síria útil"; Turquia, preocupada especialmente em proteger sua fronteira norte; e Irã, que busca reforçar sua posição no cenário internacional, os interesses podem se chocar em breve. / AFP