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Rebeldes sírios abrem rota que acelera envio de armas da Turquia para Alepo

Deserções teriam abalado poder do Exército do presidente Bashar Assad

Por Andrei Netto e Síria
Atualização:

PROVÍNCIA DE ALEPO, SÍRIA - Durante quase uma semana, as Forças Armadas de Bashar Assad prepararam o que prometia ser um ataque fulminante sobre os rebeldes de Alepo, no norte da Síria. Três dias depois do início da ofensiva, os insurgentes resistem e abrem no noroeste do país um território livre da ditadura de 41 anos. Na Província de Alepo, o domínio dos ativistas tornou-se ainda mais amplo com a conquista de uma rota ligando a capital econômica do país à Turquia, de onde recebem armas.

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O Estado circulou nos últimos dias por vilarejos situados ao norte da Província de Alepo, e a constatação em todos é a mesma: as Forças Armadas não estão mais no poder. Do norte da capital regional até a fronteira com a Turquia, incluindo os postos de imigração, a Síria é um campo abandonado, em que os rebeldes exercem a autoridade perdida pelo regime. Por caminhos de terra e rotas vicinais, os insurgentes também vêm transportando víveres, combustível e armamento, o que por ora lhes está garantindo a resistência na cidade de Alepo.

O sinal mais claro dessa hegemonia foi a tomada nesta segunda-feira, 30, de um posto de controle do Exército em Anadan, cinco quilômetros ao noroeste da cidade. Os combates pelo ponto teriam durado cinco horas, de acordo com o general Ferzat Abdelnasser, um dos coordenadores da rebelião na região.

O posto de controle é considerado estratégico por estar em uma rodovia que liga Alepo à fronteira com a Turquia, em um trajeto de 45 quilômetros. Com isso, os insurgentes podem passar a receber mais armas de seus atuais fornecedores, a Arábia Saudita e o Catar, além de equipamentos de comunicação da França, da Grã-Bretanha e dos EUA.

Além de Anadan, os vilarejos de Gayan e Kandab al-Jabal vêm sendo bombardeados e assediados com rajadas de metralhadoras a partir de helicópteros nas últimas horas, conforme a ONG oposicionista Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH). Também houve combates na cidade de Saraquin e nos vilarejos de Al-Mastouma e Feilun, na província vizinha de Idlib, a oeste de Alepo, onde o controle também é disputado entre rebeldes e forças do regime.

Na maior parte dessa região, o controle insurgente é irrestrito. Há vilarejos em que o poder ainda está dividido, e onde shabihas – ou "fantasmas", as milícias de mercenários pró-Assad – e agentes de inteligência leais ao regime ainda não foram capturados. Mas esses casos se tornam cada vez mais as exceções.

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No percurso de 37 quilômetros entre a cidade de Alepo e Marea, militares chegam a estar enclausurados na chamada Escola de Rangers, impotentes. "Esperávamos encontrar uma grande resistência, mas a adesão das pessoas foi muito grande", disse ao Estado Abdulnasser Khatib, 40 anos, líder de uma "katiba" – um grupo rebelde da região. "Nosso plano era ter assumido o controle de algumas áreas nos últimos seis ou sete dias. O que fizemos foi tomar quase toda a província e assumir o controle de 60% da cidade, além de resistir ao Exército", surpreende-se.

Segundo chefes militares rebeldes com os quais a reportagem teve contato enquanto esteve na Síria, as chances de que a destruição ocorrida em Deraa e Homs ocorra agora em Alepo são menores, pois o Exército teria perdido grande parte de seu poder – o que explicaria as dificuldades das forças de Assad no início da atual ofensiva sobre a cidade.

Deserções

Uma das possíveis razões para a consolidação – ao menos temporária – dos rebeldes no norte da Síria são as centenas de deserções no Exército. Além de generais, como Manaf Tlass, ex-amigo íntimo de Assad, os rebeldes têm assediado soldados comuns a trocar de lado. Há vários meses, eles se valem de militares insatisfeitos, mas ainda em suas posições, para convencer dezenas de outros a renunciar à violência contra a população civil.

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Taha Ahmad, 31 anos, médico veterinário e militar, é um exemplo. Durante mais de um ano, ele atuou em favor dos rebeldes no interior do Exército. "Comecei a me conscientizar sobre os massacres cometidos pelo regime e pelos shabiha, até o momento em que não aguentei", diz ele. No intervalo de alguns meses, convenceu 23 soldados a aderir à rebelião e agora todos pegam em armas contra o regime. "Os soldados não sabem ao certo o que se passa no país, e só os comandantes têm a noção clara de tudo", diz o ativista. "Muitos tinham medo da reação do Exército, mas agora perceberam que a revolução é possível."

Nesta segunda, Khaled al-Ayoubi, o principal diplomata sírio em Londres abandonou o posto, afirmando que não pode mais representar o regime Assad por causa dos atos violentos, informou o Ministério de Relações Exteriores britânico. 

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