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Região somali de Puntlandia adota lei islâmica

Independência da Puntlandia não foi reconhecida internacionalmente, mas região goza de normalidade institucional, diferente do caos no restante do país

Por Agencia Estado
Atualização:

A região somali de Puntlandia, que se considera um Estado independente desde 1998, decidiu pôr em vigor a sharia (a lei islâmica), em uma decisão que alguns vêem como uma tentativa de aplacar a ira de seus belicosos vizinhos do sul. A sharia é o principal instrumento dos tribunais islâmicos, que a cada dia têm mais poder na Somália, onde controlam vastos territórios do centro e do sul do país, e cuja capital ocupam desde junho. A independência das regiões somalis da Somalilândia e Puntlandia não foi reconhecida internacionalmente, mas as duas gozam de uma normalidade institucional que contrasta com o caos que reina no restante do país. Agora, a Puntlandia decidiu adotar a lei islâmica, embora com algumas variações que, segundo altos funcionários, atendem às especiais características da profunda crise que o país sofre. "Não podemos adotar o código islâmico que há em Mogadíscio, que leva a amputar as mãos de pessoas famintas que roubam para sobreviver", disse à Efe o ministro da Informação de Puntlandia, Abdurahman Mohammed Bankah. A sharia não é tanto um corpo legal específico, como geralmente se crê, mas um código de conduta que leva em conta muitos aspectos ligados à vida diária, que vão da política aos comportamentos sexuais de cada pessoa. Este código é seguido pela União de Tribunais Islâmicos nos territórios da Somália que controla, e também é a principal ferramenta de propaganda desta instituição, que a cada dia tem mais poder no país. Na última segunda-feira, as autoridades de Puntlandia, um território que fica na ponta do Chifre da África, aceitaram a recomendação de seus líderes religiosos e decidiram aplicar este Código. "Isto não significa que iremos reformular nossa Constituição, apenas que ajustaremos alguns pontos", declarou o presidente de Puntlandia, Adde Muse Hersi, ao anunciar a decisão. "Os tribunais islâmicos do sul argumentam que fomos pressionados a adotar a lei islâmica, mas não foi isto o que aconteceu. Nos atacaram em duas oportunidades e resistimos, de onde se conclui que a decisão de adotar a lei é nossa", afirmou. De acordo com o ministro da Informação, a implementação do código islâmico em Puntlandia levará em conta "os direitos das necessidades básicas da população", pois a Somália não se parece com nenhum país escandinavo, afirmou. "Caso uma pessoa roube algo em um país da Escandinávia a amputação seria correta - acrescentou -, mas na África os direitos do povo com relação às suas necessidades básicas vêm primeiro, e se não podemos cobri-los, também não podemos abusar de seus direitos". A legislação de Puntlandia, acrescentou Bankah, aceita "compensações", como execuções e o perdão de penas, assim como a lei islâmica, "mas a sharia não trata apenas de amputações, flagelos e apedrejamentos". Os tribunais islâmicos que controlam Mogadíscio, uma cidade na qual já houve várias execuções públicas, tentam, há algum tempo, convencer Puntlandia a adotar este código, mas até agora não tiveram êxito. As autoridades desta região do país anunciaram que nomearão um comitê integrado por líderes religiosos, anciões e representantes do governo e de organizações sociais, para buscar o melhor método para adotar a Sharia. Para alguns analistas, a decisão está ligada somente às tentativas de Puntlandia de sobreviver e não ser absorvida pela ofensiva armada dos rebeldes dos tribunais islâmicos, que já estão a poucos quilômetros de Baidoa, sede do governo provisório. "Este passo é uma tática para evitar a intervenção dos tribunais islâmicos", afirmou o analista político local Aweys Ahmed. "As autoridades de Puntlandia poderão controlar a opinião pública de seu povo, pois a sharia é a única ferramenta de propaganda que a União de Tribunais Islâmicos tem", acrescentou Ahmed.

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