REGIME APOSENTA A BALA HERÓI OLÍMPICO

Boxeador medalhista de bronze em Atenas leva tiros nas mãos e nas pernas depois de participar de protestos e vai para o exílio

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Por AMÃ
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Nasser al-Shami era uma espécie de lenda nacional na Síria. Num país com apenas três medalhas olímpicas nos mais de cem anos do evento, o boxeador tornou-se herói ao conquistar bronze nos Jogos de 2004, em Atenas. Nasser lembra como foi recebido com honras de Estado por Bashar Assad e como seu rosto foi usado pelo regime para mostrar aos sírios os êxitos do país.Bastou o ex-atleta decidir se unir às manifestações pacíficas por democracia para ser qualificado como "terrorista". Em julho, Nasser foi baleado por atiradores de elite em Hama. "Fui atingido três vezes na perna e uma nas mãos", disse ao Estado. Hoje, o ex-esportista vive escondido em um quarto num edifício de Amã. Divide os 25 metros quadrados com sua mulher, uma cubana convertida ao Islã, e suas duas filhas. "Sou um refugiado. Mas, acima de tudo, alguém que já sabe que viveu o fim de sua carreira. Posso um dia voltar para Hama. Mas nunca mais ao ringue para lutar", lamentou. Nasser ficou com uma de suas pernas paralisadas e precisa da ajuda de muletas para caminhar. "É frustrante. Sinto-me um inválido", disse. O ex-lutador não esconde sua decepção. "Não entendo: Assad apertou minha mão quando ganhei as medalhas e disse que eu era o orgulho do país. Mas porque eu pedi democracia, agora sou inimigo", afirmou. Em 2004, o regime anunciou na imprensa local que tinha dado a ele como prêmio um carro e uma casa. "Nunca recebi nada", disse.Sua mulher, cujo sotaque cubano contrasta com o corpo coberto pelo véu islâmico, também se diz frustrada. "Ele é um herói nacional. Agora, precisamos viver nessas condições", disse. A latino-americana afirmou que também quase foi morta por atiradores de elite. "Fui levar comida para Nasser no hospital e, ao chegar perto da porta, eles dispararam. Por milagre, escapei", disse. O casal se conheceu durante um estágio de seis meses que Nasser vez em Havana. Na ação que feriu gravemente o boxeador, em julho, outras 20 pessoas foram detidas em Hama, cidade com 800 mil habitantes, de maioria sunita. / J.C.

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