ENVIADO ESPECIAL A LONDRES - A descoberta de documentos sigilosos da diplomacia líbia revelando a estreita relação entre os serviços secretos de EUA, Reino Unido e do coronel Muamar Kadafi colocou Washington e Londres em uma saia justa. Diante do mal-estar, o governo britânico anunciou a abertura de uma investigação sobre as alegações.
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Americanos e britânicos teriam entregue suspeitos de terrorismo aos líbios, mesmo sabendo que seriam torturados. O serviço secreto do Reino Unido foi além e chegou a passar para Kadafi informações sobre os dissidentes, os mesmos que hoje lutam pela queda do ditador.
Para conter as críticas, o premiê britânico, David Cameron, anunciou ontem o início de investigações e garantiu que qualquer ilegalidade será punida. "Minha preocupação é a de tirar qualquer dúvida sobre a reputação britânica", disse Cameron.
Segundo o premiê, se houve envolvimento do serviço secreto com Kadafi, foi no governo trabalhista de Tony Blair. A oposição tentou se antecipar e disse que a aproximação com o regime líbio tinha como objetivo de evitar que a Líbia caísse nas mãos de terroristas e impedir o desenvolvimento de um programa nuclear no país.
Os arquivos foram encontrados pela ONG Human Rights Watch. Entre os prisioneiros entregues ao regime de Kadafi estava Andul Harim Belhadj, comandante das forças rebeldes, que agora exige um pedido de desculpas oficial por parte de britânicos e americanos por ter sido torturado em 2004. Ele é suspeito de envolvimento com Al-Qaeda. Em um dos documentos encontrados, o serviço secreto da Grã-Bretanha alerta que obter informações de Belhadj seria "urgente".
Os documentos mostram também que a cooperação foi muito além da entrega de prisioneiros. No caso dos EUA, os arquivos provam que a CIA passou a atuar na Líbia com o sinal verde de Kadafi. Em uma carta enviada pela agência de inteligência ao ex-chefe do serviço secreto líbio, Moussa Koussa, os americanos se dizem "preparados para enviar dois agentes" a Trípoli que falariam árabe.
A CIA ainda pedia autorização para que os agentes participassem de interrogatórios de terroristas mantidos nas prisões líbias. "A cooperação não era apenas na entrega de militantes islâmicos à inteligência líbia. A CIA também mandava as perguntas que os líbios deveriam fazer aos suspeitos e está claro que tinha agentes presentes nos interrogatórios", afirmou Peter Bouckaert, da Human Rights Watch.
A CIA, em comunicado assinado pela assessora Jennifer Youngblood, evitou confirmar a notícia, mas alertou que a informação "não é uma surpresa", já que a agência trabalha com governos estrangeiros para ajudar a proteger os EUA do terrorismo.