Relatório confirma ajuda européia em operações ilegais da CIA

Mas porta-voz do Departamento do Estados americano, Sean McCormack, minimizou a importância do relatório

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Por Agencia Estado
Atualização:

O relatório encomendado pela Assembléia Parlamentar do Conselho da Europa (Pace) indicou nesta quarta-feira que 14 países-membros participaram de forma ativa ou passiva da "teia" elaborada para transferir ilegalmente supostos terroristas a prisões secretas em vôos organizados pela CIA. O porta-voz do Departamento do Estados americano, Sean McCormack, minimizou a importância do relatório. "Nós não vemos nenhum fato palpável nele (relatório)". O documento foi apresentado nesta quarta em entrevista coletiva pelo parlamentar suíço Dick Marty, que em dezembro recebeu da Pace a tarefa de investigar os vôos secretos da CIA e supostos centros de detenção ilegais na Europa. Segundo Marty, o relatório, que será debatido e votado no próximo dia 27 pela Pace em sua sede, em Estrasburgo, na França, é "um passo significativo adiante", mas é só "uma etapa intermediária" na busca da verdade que, segundo Marty, começou a aparecer. Depois de um minucioso trabalho "de quebra-cabeça" que levou sete meses, a equipe de Marty pôde desenhar o mapa da "teia" das prisões secretas e dos "circuitos" dos vôos da CIA, com suas "plataformas" e "escalas". O parlamentar disse que seu relatório não constitui uma acusação, e que por isso utilizou termos como "neutro" e "participação" ativa ou passiva, e não "envolvimento", que tem um caráter penal. Marty disse que há indícios de que a Polônia e a Romênia abriguem prisões da CIA, além das já conhecidas, como as de Guantánamo, Cabul e Bagdá. Espanha, Alemanha, Chipre e Turquia aparecem no mapa elaborado pela equipe de Marty sobre a "teia" da CIA como "plataformas" para os vôos na Europa. O relatório aponta Irlanda, Reino Unido, Portugal, Grécia e Itália como "escalas" européias dos vôos de "transferências ilegais" de prisioneiros, e acrescenta Suécia, Macedônia e Bósnia como "pontos de embarque pontual". Marty reprovou outros Estados que não manifestaram "vontade" ou "zelo" suficiente para averiguar o que acontecia em seu território ou espaço aéreo. Além da "teia", Marty disse que o relatório destaca um "véu de silêncio" dos países participantes e considera que é "impossível" que os Estados Unidos tenham construído esta rede sem, no mínimo, conhecimento europeu. O parlamentar suíço está convencido de que as autoridades americanas disseram a verdade quando afirmaram que em nenhum momento tinham violado a soberania dos Estados europeus. Esta interpretação tem "certa lógica e coerência" sobre a hipótese de que contaram com sua participação, afirmou. Marty se disse preocupado com a existência de um "apartheid" contra os detentos que foram vítimas de transferências ilegais. "Estes comportamentos ilegais, este apartheid contra pessoas de origem árabe ou muçulmana, são extremamente perigosos e podem enfurecer a população e criar novos terroristas", disse Marty, que destacou que os países citados têm "o dever e a obrigação" de iniciar investigações "sérias" para averiguar a verdade. Marty reprovou os 14 dos 46 países-membros do Conselho da Europa mencionados no relatório, por terem "aceito ou não terem querido ver" a esquema construído pelos EUA para lutar contra o terrorismo com métodos que estão fora da lei e das regras da guerra, cuja eficácia colocou em dúvida. "Isto não pode continuar", afirmou, por isso pediu aos EUA e aos países europeus que estabeleçam de forma "urgente" uma "estratégia global" de luta contra o terrorismo que respeite os direitos humanos e os valores democráticos. No entanto, Marty reconheceu que o sistema penal "precisa de algumas adaptações" na luta contra o terrorismo, mas essas reformas devem ser "transparentes". A palavra dos EUA Embora tenha afirmado que as autoridades dos EUA ainda não tiveram a oportunidade de ler todo o conteúdo do relatório apresentado por Marty, McComark declarou que está "certamente desapontado com tom" das acusações. O porta-vos disse ainda que as translações e transferências de terroristas suspeitos para países terceiros são legais, e acrescentou que o relatório sugere que atividades de inteligência vão contra os direitos constitucionais. "A cooperação da inteligência internacional salva vidas", afirmou McCormack. Na Casa Branca, o secretário de imprensa, Tony Snow, não quis comentar o relatório, mas afirmou que este tipo de ação vêm sendo praticado há muito tempo por vários países. "Carlos, o Chacal, vocês devem lembrar. Devido a cooperação internacional, conseguimos prendê-lo em uma prisão francesa. As nações devem trabalhar em conjunto nas questões de inteligência", afirmou Snow. O venezuelano Carlos, que tem como nome real Illich Ramirez Sanchez, foi condenado por terrorismo e está servindo prisão perpétua na França. Ele foi capturado na capital sudanesa de Cartum, em 1994, e foi transferido para Paris por agentes do serviços secreto francês. A Venezuela questiona se os direitos de Ramirez não foram violados quando ele foi abduzido e transladado para França. Snow também nega as acusações de que os EUA tenham praticado métodos de tortura com os presos. "A tortura é ilegal e nós sabemos e seguimos todas as leis internacionais", afirmou.

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