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Revoltas do Partido Republicano

Tanto eleitores de Cruz quanto de Trump são conservadores, mas divergem sobre o que desejam ver mudado

Por Fareed Zakaria
Atualização:

Para compreender o motivo pelo qual o atual racha conservador confunde o establishment republicano, é preciso reconhecer que o partido enfrenta revoltas distintas: uma liderada por Ted Cruz, a outra por Donald Trump.

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A primeira foi descrita com clareza por E.J. Dionne em seu livro Why the Right Went Wrong. Há 60 anos, ele explica, os conservadores prometem a seus eleitores que acabarão com a ingerência do governo. Nos anos 50 e início dos 60, eles concorreram contra o New Deal (que instituiu a seguridade social). Depois criticaram a Great Society (que criou, entre outros programas, o Medicare). Hoje o seu alvo é o Obamacare.

Mas, na realidade, eles nunca fizeram nada. Apesar de indicarem Goldwater, elegerem Nixon, Reagan e os dois Bushes, apesar da revolução no Congresso encabeçada por Newt Gingrich, estes programas foram mantidos e outros tantos foram criados.

O motivo disso é que, embora os americanos se oponham ao Estado previdenciário em teoria, na prática são favoráveis a ele. Além disso, a maior parte dos gastos do governo destina-se à classe média, e não aos pobres. A seguridade social e o Medicare recebem mais do dobro das verbas que o orçamento federal destina aos gastos discricionários juntos, com exceção da Defesa. A isenção de impostos da classe média – para o sistema de saúde baseado no empregador – custa ao governo federal mais de três vezes o total destinado ao programa dos cupons para a alimentação.

Qualquer que seja a realidade, os republicanos continuaram fazendo promessas à sua base e jamais as cumpriram. Isso levou ao que Dionne chama de a “grande traição”. Os ativistas do partido estão furiosos por terem sido enganados e consideram o governo uma corja de políticos corruptos. Agora, querem alguém que finalmente cumpra a promessa da revogação e do retrocesso.

Quanto a Cruz, como foi que um senador em seu primeiro mandato, menosprezado em seu partido, chegou tão longe em tão pouco tempo? Prometendo enfrentar as elites do partido, e finalmente asfixiar o governo. Cruz declara que rejeitará o Obamacare, abolirá a Receita Federal, substituirá o imposto de renda por um imposto único de 10%, e empreenderá uma emenda da Constituição que permita equilibrar o orçamento – o que implicaria centenas de bilhões de dólares em cortes de gastos.

Os simpatizantes de Trump, por outro lado, são liberais no velho sentido, no âmbito da economia. Numa profunda análise em que utiliza pesquisas abrangentes da Rand Corp., Michael Tesler mostra que o eleitor de Trump é muito diferente do de Cruz. “Cruz supera Trump em 15 pontos porcentuais em seu desempenho entre os republicanos mais conservadores em matéria de economia”, escreve. “Mas Cruz perde para Trump por mais de 30 pontos entre os 25% dos republicanos que têm posições mais progressistas na questão da saúde, impostos, salário mínimo e sindicatos”. Trump está consciente do fato, o que explica o motivo pelo qual ele tem reiteradamente prometido não tocar na seguridade social e no Medicare, diz que vai construir obras de infraestrutura e é contrário aos acordos de livre comércio.

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Os eleitores de Trump expressam uma revolta totalmente diferente. Nos últimos anos, uma parte da classe média e trabalhadora americana vem expressando sua hostilidade em relação aos muçulmanos. É este grupo de cidadãos americanos – muitos membros do Partido Democratas e independentes – que constitui o grosso do apoio a Trump.

Em sua análise, Tesler mostra que, em termos estatísticos, “Trump tem um desempenho melhor entre os americanos que expressam maior ressentimento em relação aos afro-americanos e imigrantes e tendem a avaliar os brancos de maneira mais favorável do que os grupos minoritários”. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA ] É COLUNISTA

Para compreender o motivo pelo qual o atual racha conservador confunde o establishment republicano, é preciso reconhecer que o partido enfrenta revoltas distintas: uma liderada por Ted Cruz, a outra por Donald Trump.

A primeira foi descrita com clareza por E.J. Dionne em seu livro Why the Right Went Wrong. Há 60 anos, ele explica, os conservadores prometem a seus eleitores que acabarão com a ingerência do governo. Nos anos 50 e início dos 60, eles concorreram contra o New Deal (que instituiu a seguridade social). Depois criticaram a Great Society (que criou, entre outros programas, o Medicare). Hoje o seu alvo é o Obamacare.

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Mas, na realidade, eles nunca fizeram nada. Apesar de indicarem Goldwater, elegerem Nixon, Reagan e os dois Bushes, apesar da revolução no Congresso encabeçada por Newt Gingrich, estes programas foram mantidos e outros tantos foram criados.

O motivo disso é que, embora os americanos se oponham ao Estado previdenciário em teoria, na prática são favoráveis a ele. Além disso, a maior parte dos gastos do governo destina-se à classe média, e não aos pobres. A seguridade social e o Medicare recebem mais do dobro das verbas que o orçamento federal destina aos gastos discricionários juntos, com exceção da Defesa. A isenção de impostos da classe média – para o sistema de saúde baseado no empregador – custa ao governo federal mais de três vezes o total destinado ao programa dos cupons para a alimentação.

Qualquer que seja a realidade, os republicanos continuaram fazendo promessas à sua base e jamais as cumpriram. Isso levou ao que Dionne chama de a “grande traição”. Os ativistas do partido estão furiosos por terem sido enganados e consideram o governo uma corja de políticos corruptos. Agora, querem alguém que finalmente cumpra a promessa da revogação e do retrocesso.

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Quanto a Cruz, como foi que um senador em seu primeiro mandato, menosprezado em seu partido, chegou tão longe em tão pouco tempo? Prometendo enfrentar as elites do partido, e finalmente asfixiar o governo. Cruz declara que rejeitará o Obamacare, abolirá a Receita Federal, substituirá o imposto de renda por um imposto único de 10%, e empreenderá uma emenda da Constituição que permita equilibrar o orçamento – o que implicaria centenas de bilhões de dólares em cortes de gastos.

Os simpatizantes de Trump, por outro lado, são liberais no velho sentido, no âmbito da economia. Numa profunda análise em que utiliza pesquisas abrangentes da Rand Corp., Michael Tesler mostra que o eleitor de Trump é muito diferente do de Cruz. “Cruz supera Trump em 15 pontos porcentuais em seu desempenho entre os republicanos mais conservadores em matéria de economia”, escreve. “Mas Cruz perde para Trump por mais de 30 pontos entre os 25% dos republicanos que têm posições mais progressistas na questão da saúde, impostos, salário mínimo e sindicatos”. Trump está consciente do fato, o que explica o motivo pelo qual ele tem reiteradamente prometido não tocar na seguridade social e no Medicare, diz que vai construir obras de infraestrutura e é contrário aos acordos de livre comércio.

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Os eleitores de Trump expressam uma revolta totalmente diferente. Nos últimos anos, uma parte da classe média e trabalhadora americana vem expressando sua hostilidade em relação aos muçulmanos. É este grupo de cidadãos americanos – muitos membros do Partido Democratas e independentes – que constitui o grosso do apoio a Trump.

Em sua análise, Tesler mostra que, em termos estatísticos, “Trump tem um desempenho melhor entre os americanos que expressam maior ressentimento em relação aos afro-americanos e imigrantes e tendem a avaliar os brancos de maneira mais favorável do que os grupos minoritários”. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA*É colunista

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