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Rivalidade entre China e EUA define futuro da Ásia

À medida que os chineses crescem e se tornam mais poderosos, diminui a hegemonia dos americanos em partes do continente

Por Max Fisher e Audrey Carlsen
Atualização:

Na semana passada, um grupo de 11 países assinou o TPP 11 - uma versão da Parceria Transpacífico sem os EUA. Quando assumiu, em 2016, o presidente Donald Trump retirou os americanos do tratado, que havia sido concebido para conter o avanço da China. A reviravolta foi a mais recente mudança na transição gradual da Ásia de um domínio americano para algo muito mais fluido.

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Há muita coisa em jogo: China e EUA buscam remodelar à própria imagem a economia e os sistemas políticos da região mais populosa do mundo. O poder bélico dos EUA ainda é dominante, mas a China começa a exercer uma crescente pressão militar e a usar a força de sua economia para reordenar a região, seduzindo velhos aliados americanos, como Filipinas e Indonésia. A mudança deve se acelerar sob Trump, que rejeita acordos comerciais e adota uma política externa errática, forçando os países asiáticos a repensar estratégias. 

O acordo comercial alcançado na semana passada é um forte sinal de como países como Austrália e Japão estão se virando sem a liderança americana. O pacto substitui a Parceria Transpacífico (TPP), que Trump dizia ser “o pior acordo comercial da história dos EUA”. 

Hoje, os países da Ásia já negociam mais com a China do que com os EUA, muitas vezes por um fator de 2 para 1. O desequilíbrio cresce à medida que a economia chinesa se aproxima da americana. Os líderes asiáticos sabem que, atualmente, política e economias dependem muito mais de Pequim, que já mostrou que é capaz de oferecer investimentos para os amigos e endurecer com os rivais. 

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No entanto, os EUA não estão totalmente fora do jogo. Uma outra evidência de grande influência e poder ainda é a venda de armas, setor no qual Washington mantém sua supremacia. Países que compram armas americanas ligam suas Forças Armadas e sua política externa aos EUA. O domínio militar americano na Ásia reflete a extensão do envolvimento do país na região, que data da 2.ª Guerra. 

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Muitos dos 20 países que estão no meio do fogo cruzado entre China e EUA enfrentam, portanto, uma escolha impossível: o dinheiro chinês ou a segurança americana. “Esses países não querem ter de escolher um lado”, disse Tanvi Madan, especialista em Ásia do Brookings Institution. Por isso, quando dá, eles fogem da escolha e buscam estratégias para tirar o máximo de benefícios de ambas as potências, reduzindo os riscos de irritá-las e não perder sua independência.

Países da Ásia já negociam mais com a China, que acabou de estender por tempo indeterminado o mandato de Xi Jinping, do que com os EUA Foto: AP Photo/Andy Wong

O resultado, provavelmente, será algo muito diferente do que vimos na Europa nos tempos da Guerra Fria, que foi claramente dividida em dois lados distintos. Em vez disso, a Ásia deve rachar ao longo de muitas linhas ao mesmo tempo, à medida que os países da região aceitem, rejeitem ou administrem a crescente influência da China. Cada estratégia envolve compromissos difíceis, mas cria um modelo de como outros países asiáticos - e quem sabe no mundo - terão de lidar com um mundo sino-americano.

Japão: apoio americano

O Japão mostra que a China está longe de ser uma potência ao estilo americano. Para conter o avanço chinês, os japoneses usam a força de sua economia para formar um poderio militar e um conjunto de relações diplomáticas. 

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Tóquio tenta reconstituir uma aliança informal anti-China que inclui Índia, Austrália e EUA. Assim, o Japão é o maior obstáculo de Pequim. Em vez de aceitar passivamente o isolamento dos EUA, os japoneses mostram como outros países podem compensar a ausência americana. Na região, porém, há outras notícias ruins para a China. Seu único aliado, a Coreia do Norte, está cada vez mais independente. 

Os testes nucleares parecem feitos para irritar Pequim e dar aos rivais uma desculpa para aumentar gastos militares. Pyongyang também busca um acordo com os EUA que permita ao país se libertar do domínio chinês. Se Pequim não consegue manter a Coreia do Norte como Estado-cliente, terá problemas para cultivar outros.

Sri Lanka: ao lado dos chineses

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O Sri Lanka não parece servir de indicador geopolítico, mas analistas não tiram o olho da ilha desde 2014, quando um submarino chinês atracou em um porto construído com dinheiro da China. O caso marcou o início de uma nova era, na qual Pequim está transformando seu poder econômico em militar. 

A China desenvolveu outros projetos de infraestrutura na Ásia. Eles começam de maneira conjunta, mas podem acabar em mãos chinesas. Em dezembro, o Sri Lanka, incapaz de pagar as dívidas da construção do porto, concedeu à China um arrendamento de 99 anos. “Os chineses usam o excesso de mão de obra e capital para projetar sua influência”, disse Mira Rapp-Hooper, da Yale Law School. Este é um modelo promissor para a China, cuja força econômica se encaixa nas necessidades de países pobres. 

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Ultimamente, a influência cresce até em países onde os EUA investiram muito, como o Paquistão. Pequim também amplia seu modelo para além da Ásia, criando o que um dia pode ser uma rede global.

Filipinas: em busca do meio

Muitos se esquivam das grandes potências se protegendo entre elas. Poucos fazem isso de forma tão criativa e descarada como o presidente Rodrigo Duterte, das Filipinas. Ao assumir, em 2016, ele sugeriu que poderia acabar com a aliança de 65 anos com os EUA e correu para Pequim, prometendo cooperação. Assim, Duterte recebeu concessões de todos os lados. Os americanos reduziram suas exigências e continuaram a garantir a defesa do país. Os chineses ofereceram termos mais favoráveis em disputas marítimas e investimento. 

Histórias assim são exemplo para outros países, como o Vietnã, que resiste à influência de China e EUA. Dois anos após Barack Obama levantar o embargo de armas ao país, na esperança de trazê-lo para sua esfera de influência, os vietnamitas ainda compram suas armas da Rússia. Portanto, este é um outro futuro possível: países que se colocam entre China e EUA. Não são independentes, mas também não são alinhados com nenhum dos dois.

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