QUITO - "Quando recebi o resultado positivo para o novo coronavírus, senti medo. Imaginei tudo que podia acontecer comigo como paciente com a covid-19. As possibilidades não eram boas: podia morrer ou ter uma doença longa, o que, como médico, implicava em uma ausência inadmissível no hospital em que trabalho, na capital do Equador". Foi assim que o médico equatoriano Manuel Jibaja Vega descreveu o que sentiu ao saber que estava doente.
Em artigo para o New York Times, Jibaja Vega explicou que está isolado em casa e não apresentou sintomas graves da doença e, portanto, conseguiu continuar realizando funções administrativas da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da qual é diretor no hospital onde trabalha, o Eugenio Espejo, um dos principais do Equador.
"Em toda minha carreira como médico da UTI nunca experimentei o que vivi nas últimas semanas. Estou em contato com redes de médicos intensivistas da Itália e da Espanha e compartilhamos experiências que nunca havíamos imaginado. Nos dois países, aumentou muito a quantidade de leitos nas UTIs. E mesmo assim, não deram conta. Como faremos no Equador, onde não temos essa mesma opção de aumentar a capacidade?"
O médico contou que em Quito a situação ainda está controlada porque o sistema de saúde não entrou em colapso. Mas lembrou de Guayaquil, a capital econômica do país, que vive dias trágicos, com corpos sendo recolhidos nas casas e ruas da cidade após o colapso dos sistemas de saúde e funerário. "Os hospitais estão lotados, os serviços funerários estão quebrados e as mortes aumentaram em um ritmo desalentador."
"Agora, doente e fazendo a quarentena forçada, penso muito em meus colegas de Guayaquil, me comove o esforço monumental deles, a sua valentia", diz Jibaja Vega em seu relato. O médico também falou da difícil tarefa de lidar com a vida e com a morte a todo tempo. "Trabalhamos com pacientes que lutam entre a vida e a morte. Mas ainda assim, nem nós estávamos preparados emocionalmente para lidar com essa crise, para as decisões difíceis que temos que tomar de forma rápida, para o cansaço físico e mental e para a possibilidade iminente de nos contagiarmos e contaminarmos nossas famílias."
Para o equatoriano o mais difícil do isolamento no ambiente hospitalar é lidar com as famílias dos doentes de forma remota. "Comunicar notícias ruins ou terríveis por meio de um aparelho eletrônico tem uma característica impessoal que eu não antecipei. Perdemos a possibilidade de nos abraçarmos e chorar juntos. O que não podemos perder é a vontade de seguir adiante." / NYT