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Serviço de inteligência paquistanês faz jogo duplo com grupos radicais

Por Luciana Alvarez
Atualização:

Dentro das fronteiras nacionais, as forças paquistaneses travam um duro combate contra o Taleban, mas no vizinho Afeganistão, a agência de inteligência paquistanesa ISI continua colaborando com o grupo extremista que ajudou a criar. A estratégia aparentemente contraditória da ISI, que atua como braço executivo de táticas extraoficiais do Exército paquistanês, tem raízes históricas e segue uma lógica diferente da orientação do governo civil de Asif Ali Zardari. "Os interesses da ISI ainda são centrados na histórica ameaça indiana. Eles veem o apoio a terroristas taleban no Afeganistão como uma forma de se opor à Índia", afirmou ao Estado o professor Shaun Gregory, diretor da unidade de pesquisa para o Paquistão da Universidade de Bradford. Sob o ponto de vista dos militares, interessa enfraquecer o atual governo afegão porque ele mantém laços com a Índia. Os comandantes da ISI também apoiam o Taleban no Afeganistão porque desejam um governo forte e estável no país vizinho, algo que a democracia não conseguiu e coisa que, antes dela, o regime do Taleban proporcionava. Nos anos 80 e 90, os campos da ISI treinaram milhares de militantes do Taleban afegãos, que expulsaram os soviéticos antes de chegarem ao poder. O regime só caiu após a invasão americana de 2001, uma represália ao 11 de Setembro. Hoje, o Exército paquistanês, dominado por forças seculares, começa a se preocupar com a insurgência taleban em seu território. Desde abril, tenta expulsar o grupo do Vale do Swat. Na quarta-feira, a sede da ISI em Lahore foi alvo de um ataque, mas nem assim a agência deixou de patrocinar o grupo do outro lado da fronteira. "O Taleban afegão não ataca o Paquistão. Por isso, faz sentido que a inteligência paquistanesa continue oferecendo apoio", disse Arif Rafiq, consultor político paquistanês. "Há até boatos de que Meshud (líder taleban no Paquistão) foi repreendido pelo mulá Mohamed Omar (chefe taleban afegão)." Ainda que sejam grupos separados, a forte ofensiva do Taleban dentro do país está fazendo com que os líderes da ISI e do Exército questionem a estratégia dupla. "A ISI se preocupa com as relações entre os grupos dos dois países, mas ainda acredita ser possível apoiar um ao mesmo tempo em que luta contra o outro", afirma Gregory. A insubordinação da ISI ao governo civil desagrada aos EUA, que lutam para derrotar o Taleban em ambos os países. Em março, o secretário de Defesa, Robert Gates, exigiu que a ISI cortasse seus laços com os militantes do Afeganistão, mas nada foi feito até agora. Enquanto os líderes militares não acreditarem que o Taleban seja um inimigo também no Afeganistão, o presidente Zardari pode fazer muito pouco. Ano passado, quando ele tentou subordinar a ISI ao Ministério do Interior, foi obrigado a fazer uma retratação pública logo em seguida.

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