Sim, Obama conseguiu

Apesar das críticas, presidente americano obteve progresso em temas importantes

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Por PAUL e KRUGMAN
Atualização:

Nas últimas semanas, foram muitas as ocasiões em que estive envolvido em conversas com liberais que balançam a cabeça, tristes, e expressam seu desapontamento com o presidente Barack Obama. Por quê? Suspeito que estejam sob a influência da narrativa que permeia a maior parte da mídia, muitas vezes sem percebê-lo. A verdade é que, hoje em dia, boa parte dos comentários que lemos a respeito do governo Obama - e um grande número das reportagens também - dá ênfase nos aspectos negativos: o contraste entre as extravagantes esperanças de 2008 e as prosaicas realidades da guerra de trincheiras na política, dos problemas no Departamento de Assuntos de Veteranos, a bagunça no Iraque e assim por diante. Aparentemente, o combinado é retratar Obama como um presidente desajeitado, líder de um governo problemático ou até fracassado. Mas tudo isso é errado. Os líderes devem ser julgados por seus feitos, não pelas reportagens a seu respeito - e em termos de substância política, Obama está passando por um ano bom. Na verdade, há uma chance considerável de 2014 entrar para a história como um daqueles anos no qual os EUA deram uma guinada importante na direção certa. Em primeiro lugar, a reforma do sistema de saúde é agora uma realidade - e, apesar do início confuso, tudo indica que haverá uma grande história de sucesso. Lembram que ninguém se inscreveria no sistema? As inscrições superaram as projeções no primeiro ano. Lembram que os inscritos jamais pagariam sua parte da conta? A grande maioria pagou. Ainda não podemos contemplar a real dimensão do impacto da reforma para aqueles que anteriormente não tinham seguro saúde, mas todas as informações de que dispomos indicam grande progresso. Pesquisas mostram uma queda acentuada no porcentual de americanos que dizem não ter seguro de saúde. Nos Estados em que o Medicaid foi ampliado o novo sistema funcionou especialmente bem. Temos também a política voltada para o meio ambiente. As novas regras do governo Obama para as usinas de energia não serão suficientes para salvar o planeta sozinhas, mas representam um ponto de partida real. Embora seja muito mais fraca que o necessário, a reforma financeira também é uma realidade - basta perguntar a todos os tipos de Wall Street que, furiosos com os novos limites impostos às suas negociatas, decidiram agora dar as costas aos democratas. Se somarmos tudo isso, temos um presidente Obama que parece bastante consequente. Houve grandes oportunidades desperdiçadas no início do seu governo - estímulo inadequado, o fracasso em oferecer alívio significativo para os donos de imóveis em má situação financeira. Mas, no seu segundo mandato, ele está cumprindo a promessa de mudanças reais para melhor. Assim sendo, por que tantas críticas na imprensa? Parte da resposta pode estar na taxa de aprovação relativamente baixa de Obama. Mas isso reflete principalmente a polarização na política - uma forte aprovação entre os democratas e a oposição universal dos republicanos -, algo que é mais um sinal dos tempos do que um problema do presidente. Em todo caso, devemos avaliar os presidentes por aquilo que fazem, e não pelo que diz uma questionável opinião pública. Uma resposta mais abrangente, imagino, seja a síndrome de Simpson-Bowles - a crença segundo a qual aquilo que é bom só pode vir num pacote bipartidário, afirmando também que a probidade fiscal é o grande desafio de nossa época. O resultado da influência dessa síndrome é que os grandes feitos de Obama passam despercebidos por boa parte do establishment de Washington: ele deveria salvar o orçamento - e não o planeta - e além disso era preciso fazer os republicanos embarcarem nessa. Mas quem se importa com o que pensam os centristas? A reforma do sistema de saúde é importantíssima e agir para salvar o clima é muito mais importante do que aumentar a idade mínima de aposentadoria. Suponho que alguns ficaram desapontados por Obama não ter tornado a política americana menos polarizada e amarga. Mas isso nunca foi muito provável. A verdadeira questão era se ele conseguiria progredir de verdade em temas importantes. E fico feliz em dizer que a resposta é sim. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALILÉ COLUNISTA E NOBEL DE ECONOMIA

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