Sistema político arcaico imobiliza a Grécia

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Por Gilles Lapouge
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Duas mil pessoas acompanharam ontem o enterro do menino assassinado em Atenas em meio a uma relativa calma. Mas houve incidentes em volta do cemitério. Pela manhã, havia passeatas estudantis nas ruas. À noite, temiam-se tumultos tão exagerados quanto os das três noites anteriores. Hoje, uma greve geral de 24 horas, paralisará o país. Há perigo de fato. De um lado, policiais preparados para "quebrar os estudantes". Do outro, estudantes ultrapolitizados, acostumados à guerrilha urbana e com um considerável estoque de coquetéis molotov. Essas revoltas são tradicionais. Elas dão aos policiais e aos anarquistas a oportunidade de manter a forma e apurar a técnica, pois a Grécia costuma explodir a cada cinco ou dez anos. Portanto, entre os policiais assim como entre os revoltosos há sempre algum "combatente veterano", carregado de souvenirs e bastante experimentado. Em 1973, a brutal ditadura dos coronéis acabou desse modo. A repressão policial havia sido tão cega que toda a Grécia se levantou e os coronéis "se abaixaram". Anos mais tarde, em 1985, os anarquistas tomaram conta do bairro boêmio de Exarchia. Naquela época também, um estudante foi morto a tiros por um policial. O primeiro desses dois levantes, o de 1973, é comemorado todos os anos nas ruas, o que dá origem a novas desordens. O mesmo ocorreu em 1995 e 1999. Os líderes dos enfrentamentos, do lado dos estudantes, pertencem ao movimento anarquista. A juventude nutre pela polícia uma falta de confiança herdada da história, que viu suceder-se, desde 1945, regimes autoritários até a ditadura dos coronéis. Garotos berram aos policiais: "Vamos matar vocês!" Essas revoltas mostram a perícia dos jovens gregos. Os estudantes são muito numerosos. Como não encontram perspectivas profissionais, prolongam o período dos estudos, sobrevivendo à base de míseros bicos. Muitos deles têm 30 anos. Quando finalmente começam uma vida economicamente ativa, ganham 600 (US$ 770). É a "geração dos 600". Portanto, eles dispõem de todos os ingredientes para se tornarem "excelentes revoltosos": uma profunda cultura, um saber considerável e a condição de pobres. Então, pôr fogo no estopim chega a ser brincadeira de crianças para um agitador mais ou menos dotado. Na primeira farra nas ruas, esses velhos estudantes pobres aderem à "revolução em marcha". O governo atual, de Costas Karamanlis, é de uma direita grosseira, muito corrupta. Mas a esquerda, quando esteve no poder, não se conduziu melhor. Quando governou o país entre 1980 e 1990, o Pasok (socialista) foi igualmente medíocre e corrupta. Na realidade, sob o disfarce da democracia moderna e digna da UE, são estes sistemas arcaicos que continuam dirigindo a Grécia - poderes de clãs, tribais, às vezes de esquerda, outras de direita, imobilizando o país há décadas. *Gilles Lapouge é correspondente em Paris

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