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Sobreviventes de atentados em Mumbai pregam perdão a extremistas

No terceiro aniversário dos ataques, grupo que praticava meditação na cidade indiana buscam refúgio na compaixão

Por Rajini Vaidyanathan e da BBC News
Atualização:

No terceiro aniversário dos atentados extremistas contra a cidade indiana de Mumbai, que deixaram 165 mortos, alguns dos sobreviventes da tragédia estão pregando o perdão aos extremistas, em um livro que será lançado em fevereiro nos EUA.

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O "Mumbai 25", como o grupo ficou conhecido, estava na cidade indiana em 26 de novembro de 2008, participando de um retiro de meditação formado por australianos, canadenses e norte-americanos. Dois participantes do retiro foram mortos nos atentados - atribuídos a militantes islâmicos paquistaneses -, mas os sobreviventes esperam agora que, ao exercitar a compaixão, consigam tirar algo de positivo da tragédia.

Uma das integrantes do grupo, Linda Ragsdale, diz que vai se lembrar do dia 26 de novembro para o resto de sua vida. Ela estava no hotel Oberoi, um dos locais alvejados pelos grupos de extremistas armados, e foi uma das 300 pessoas feridas nas ofensivas.

"Levei um tiro nas costas. A bala passou por cima do meu coração e atravessou minha cavidade estomacal", recorda. "Meu médico nos EUA me disse que (minha sobrevivência) era um milagre. Um pouco mais acima, (a bala) teria atingido meu coração. Mais à esquerda, teria atingido a minha espinha."

Apesar das cicatrizes permanentes deixadas pelo episódio, ela diz que não guarda raiva dos militantes (todos foram mortos, a exceção de um acusado que está preso). "A consequência das ações deles foi a morte. Como um homem de 20 anos pode pensar que morrer é (um meio de) vida? Não posso fazer nada senão perdoar a perspectiva desse jovem. O perdão é um presente que você dá a si mesmo."

'Perdão verdadeiro'

É disso que trata o livro a ser lançado, Forgiving the Unforgivable (Perdoar o imperdoável, em tradução livre), que contém relatos de Ragsdale e de outros sobreviventes. Foi escrito por Charles Cannon, líder da fundação que organizava o retiro em Mumbai à época dos ataques.

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Cannon diz que o livro foi concebido em resposta às "milhares e milhares" de pessoas que entraram em contato com ele depois que seu grupo falou à imprensa advogando pelo perdão aos militantes. "(Essas pessoas) se disseram inspiradas por nossa atitude. O livro é uma resposta a essas pessoas."

Cannon estava jantando em seu quarto de hotel com dois colegas, no 12º andar, quando ouviu os tiros, por volta de 21h30 (horário local). "Pensamos (inicialmente) que eram fogos de artifício, comuns em casamentos indianos", diz ele. "Um dos meus amigos foi ao corredor do hotel para olhar o lobby e voltou correndo, dizendo ter visto dois homens com AK-47, atirando e matando pessoas."

Nessa hora, os três amigos decidiram recorrer ao aprendizado de anos de meditação. "Permanecemos o mais focados e calmos que podíamos, sem saber se o hotel explodiria ao redor de nós e se morreríamos. Vivemos momento a momento."

Eles ficaram escondidos até serem resgatados, mas enfrentaram a difícil tarefa de ter de reconhecer dois outros amigos meditadores que haviam sido assassinados.

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'Zona de guerra'

"O hotel era uma zona de guerra, irreconhecível de tão ensanguentado. Caminhávamos sobre corpos e destroços. Dois membros de nosso grupo, Naomi e Alan Scherr, estavam em uma mesa do restaurante", diz Cannon.

Naomi, de 13 anos, era a mais jovem integrante do grupo, e estava acompanhada de seu pai, Alan. Jantava com eles a amiga Helen Connolly. "Quando o tiroteio começou, Alan gritou para que nos escondêssemos sob a mesa, onde fiquei enquanto os atiradores passavam pelo restaurante disparando", recorda ela. "Alan, Naomi e um casal indiano ao nosso lado foram mortos, e eu fui ferida de maneira superficial."

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Em meio ao trauma, Connolly diz que compartilha da teoria do grupo, de buscar um desfecho positivo de um evento tão negativo. "Nossa experiência pode ser positiva para mostrar que há uma alternativa, que há uma resposta consciente, em vez de uma reação impulsiva inconsciente", argumenta. Cannon, por sua vez, diz que ele e os demais participantes do livro tentam passar "uma perspectiva diferente sobre a experiência do terrorismo".

"Não estamos defendendo a atividade terrorista. A questão é a compaixão pelos seres humanos com quem você cruza, e que são tão cheios de ódio que todas as suas ações ocorrem a partir desse ódio."

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