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Suicídio de vítima amplia debate sobre estupros na Índia

Por MANOJ KUMAR E NITA BHALLA E ROSS COLVIN
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Na noite de 26 de dezembro, enquanto um voo fretado pelo governo indiano seguia para Cingapura levando a bordo uma mulher gravemente ferida depois de ser estuprada dentro de um ônibus, uma adolescente que havia sofrido o mesmo crime tirava a própria vida. Depois de escrever um bilhete de despedida no qual identificava os supostos estupradores, a estudante de 17 anos bebeu pesticida, sendo encontrada já agonizante por parentes. Imagens de TV pouco vistas a mostram chegando a um hospital do Estado do Punjab (norte), enrolada em um cobertor, inconsciente ou já morta, e acompanhada por sua mãe, aos prantos. A brutalidade do estupro coletivo do mês passado em Nova Délhi, que levou à morte da vítima, causou comoção no país inteiro. Mas a forma como a polícia tratou do caso de Punjab também gerou indignação e polêmica a respeito de como a polícia e o Judiciário costumam deixar as vítimas desassistidas. "Já chega", declarou o chefe do Judiciário daquele Estado, Arjan Kumar Sikri, ao exigir no tribunal uma explicação completa da polícia sobre seu comportamento diante de "um estado de coisas muito sórdido". Os sobrecarregados tribunais indianos podem levar até dez anos para julgar casos de estupro, segundo advogados e policiais. Apenas 26 por cento dos processos por estupro concluídos em 2011 resultaram em condenações, segundo o Departamento Nacional de Registros Criminais. A menina do Punjab relatou que no Diwali, principal data do calendário religioso hindu, ela foi sequestrada, drogada e estuprada por dois homens na casa onde está instalada a bomba de irrigação de uma lavoura local, onde ninguém escutou seus gritos. Quatro acusados, os dois supostos estupradores e dois cúmplices, estão detidos à espera do julgamento. A vítima não pode ser identificada por razões legais. Dois policiais foram afastados por prevaricação. Um deles, o subinspetor Nasib Singh, está detido e pode ser indiciado por "facilitar" o suicídio da menina. Singh, que comandava o posto policial na aldeia de Badshahpur, onde a menina vivia, é acusado de demorar para fazer o boletim de ocorrência, interrogar os suspeitos e detê-los, segundo Shashi Prabha Dwivedi, inspetora-geral de polícia do Punjab e integrante de uma comissão especial criada para investigar o caso. Dwivedi disse que a apuração inicial mostrou que Singh "não conduziu adequadamente o caso" e ainda tentou mediar um acordo extrajudicial ilegal entre a família da vítima e as famílias dos supostos agressores. Dwivedi não quis citar indícios específicos contra Singh, alegando a necessidade de sigilo na investigação. Gurinder Singh, filho do policial acusado, disse à Reuters que seu pai é inocente e foi tomado como bode expiatório por políticos e autoridades. Ele disse também que seu pai está sem advogado. Alguns advogados da Suprema Corte dizem que não é incomum que a polícia pressione vítimas e suas famílias a aceitarem acordos extrajudiciais. A maioria dos policiais ganha mal, trabalha demais e tem pouco interesse em investigar um caso que pode levar anos para ser julgado. A menina inicialmente denunciou o estupro à polícia em 19 de novembro, segundo parentes e o "panchayat" (chefe da aldeia), que a acompanhou à delegacia. Mas a polícia esperou uma semana para fazer o boletim de ocorrência, que só saiu em 27 de novembro, junto com uma solicitação de exame de corpo de delito, segundo a família. Os quatro suspeitos só foram detidos depois que a menina se matou, em 26 de dezembro, e o caso ganhou repercussão nacional.

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