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Sul de Beirute reflete divisão sectária da Síria

Em bairro palestino na capital libanesa, há polarização cada vez mais intensa entre simpatizantes de ambos os lados do conflito no país vizinho

Foto do author Lourival Sant'Anna
Por Lourival Sant'Anna
Atualização:

BEIRUTE - Para se chegar ao bairro palestino de Sabra, é preciso, primeiro, passar pelas barreiras erguidas na avenida pelo grupo xiita Hezbollah, cujos milicianos armados revistam porta-malas e examinam documentos. Quando o repórter começa a caminhar para dentro do bairro - aqui chamado de "campo de refugiados" -, é abordado por dois seguranças da Amal, outra milícia xiita, que explicam: "Daquele guarda-sol para a frente, a segurança está a cargo dos grupos palestinos". No sul de Beirute, cada metro quadrado está sob um domínio sectário.

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No domingo, seis jovens palestinos perderam a paciência em uma barreira do Hezbollah - cujo rigor aumentou depois de seu reduto, Dahieh, ter sido alvo de dois atentados a bomba nos últimos dois meses; o segundo deles, no dia 15, deixou 27 mortos e 300 feridos. No confronto, os palestinos, que estavam desarmados, levaram a pior: um foi morto e os outros cinco, feridos. Moradores do bairro atearam fogo em pneus e gritaram palavras de ordem contra o Hezbollah.

A explosão de revolta tem como pano de fundo as transformações causadas pela guerra civil na Síria. Os palestinos são sunitas, e apoiam maciçamente os rebeldes sírios, que são, em sua grande maioria, dessa mesma corrente do Islã. O Hezbollah é xiita, patrocinado pelo Irã, onde a imensa maioria da população pertence a essa seita, da qual deriva a corrente alauita, do presidente Bashar Assad, da Síria. A milícia xiita libanesa tem lutado ao lado das tropas leais ao regime sírio.

Até mesmo o grupo Hamas, que governa a Faixa de Gaza, antes financiado pelo Irã, afastou-se da Síria. Seu líder, Khaled Mashaal, trocou Damasco pelo Cairo. A Fatah, corrente moderada do presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, já era distante da Síria, e próxima da Arábia Saudita e das outras monarquias do Golfo Pérsico.

Entretanto, em Sabra, são os grupos pró-Síria - e pró-Hezbollah - que estão mais visíveis. À procura de dirigentes no bairro, o repórter do Estado encontrou dois, um do Fatah Intifada, e outro da Frente Popular de Libertação da Palestina-Comando Geral (FPLP-CG) - ambos aliados da Síria e do Hezbollah. O dirigente da FPLP-CG, que deu o nome de guerra Abu Ahmed, participou de uma reunião dos líderes do Hezbollah e dos grupos palestinos, depois do confronto. "Foi um incidente isolado, que poderia ter acontecido entre libaneses", disse ele. "O tiroteio não partiu de uma ordem de ninguém". Abu Assim, líder da Fatah Intifada, disse que o Hezbollah "vai apurar e punir os responsáveis".

Os dois afirmam que as tensões entre palestinos e o Hezbollah interessam a Israel e a seus aliados: Estados Unidos, França, Inglaterra e as monarquias do Golfo Pérsico. Abu Ahmed, que na sala de sua casa tem um pôster de Bashar Assad atrás da bandeira negra da FPLP-CG, afirma que "a Síria é a ponta de lança da resistência". "Vamos defender o regime sírio com todos os meios de que dispomos", diz ele, ecoando a advertência do presidente sírio, de que seus aliados vão retaliar se os Estados Unidos atacarem.

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