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Tensão em Santa Cruz lembra sítio

Revoltada e em armas contra governo de Evo, população da cidade admite que violência ainda está longe do fim

Por Renata Miranda
Atualização:

Um dia depois de intensos conflitos entre grupos opositores e policiais bolivianos, a cidade de Santa Cruz tinha ontem um ar de cidade sitiada. As ruas do principal centro econômico do país ainda estavam tomadas pela fumaça preta, que vinha dos muitos pneus usados para bloquear o caminho. Pedaços de madeira e cacos de vidro também faziam parte do cenário. E era quase consenso entre os moradores que a violência ainda não tem data para acabar. Manifestantes prometem continuar os protestos até terem suas reivindicações atendidas pelo governo do presidente Evo Morales. "Não nos renderemos, por nossa terra", afirmou José Luis Camacho Barberi, um dos manifestantes reunidos na Praça 24 de Setembro, perto do centro da cidade. Apesar da revolta, quando questionado sobre o que reivindicava, Camacho Barberi perguntou ao amigo: "Por que protestamos mesmo?" Armados com paus, estilingues e fogos de artifício, os opositores exigem a restituição de uma parcela do imposto sobre hidrocarbonetos (gás e petróleo) que era repassada para o governo local, mas foi confiscada por La Paz para financiar uma pensão nacional para idosos. Eles também pedem o reconhecimento da autonomia do Departamento (Estado) de Santa Cruz - aprovada em maio num referendo popular. Além disso, os manifestantes também são contra o projeto da nova Carta boliviana, aprovado por parlamentares do governista Movimento ao Socialismo (MAS) em novembro. "Estamos cansados das políticas do governo central e o povo crucenho é contra a imposição de forma ditatorial de um regime socialista com tendências comunistas", afirmou Richard Romero, empresário, que participava da manifestação. Segundo ele, os protestos de terça-feira começaram pacificamente, mas a situação saiu do controle quando os militares chegaram. "Numa situação como essa, o povo fica revoltado e não há como controlar (a violência). Romero explicou que muitos estão protestando também contra o Comitê Cìvico e o governo departamental. "Os jovens são os que mais se descontrolam e acabam se aproveitando da manifestação para fazer saques." Os violentos protestos de anteontem deixaram cerca de 50 feridos quando a polícia tentou reprimir a ocupação de quatro prédios estatais - do Serviço Nacional de Impostos, do Instituto Nacional da Reforma Agrária, da Secretaria de Migração e da empresa telefônica Entel. Até a tarde de ontem, as linhas telefônicas e a internet na região estavam instáveis, sem previsão para voltar ao normal. O prédio da Entel foi totalmente destruído e alguns dos manifestantes ainda permaneciam no local no período da manhã. "Pretendemos tomar outras instituições do governo para pressionar o Estado", disse Romero. Na madrugada de ontem, manifestantes também fecharam a estrada que dá na principal entrada do Aeroporto Internacional Viru-Viru. As manifestações - lideradas pela União Juvenil Crucenhista e pela Federação Universitária Local - foram qualificadas de um "assalto às instituições do Estado" pelo ministro de Governo, Alfredo Rada. De acordo com ele, os protestos foram organizados pelo governador de Santa Cruz, Rubén Costas, e pelo diretor do Comitê Pró-Santa Cruz, Branko Marinkovic. Por seu lado, Costas disse que a violência foi a resposta dos 86% da população que votaram a favor da autonomia do departamento às políticas de Evo.

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