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Tentando conquistar a Alemanha, candidata do Partido Verde diz que resolverá crises de Merkel

Annalena Baerbock entrou no cenário político nacional há apenas três anos e pretende sacudir o status quo

Por Katrin Bennhold
Atualização:

BOCHUM, Alemanha - A mulher que quer substituir a chanceler Angela Merkel subiu ao palco vestindo tênis e jaqueta de couro. Atrás dela, o esqueleto de aço de uma torre de mineração de carvão fora de uso. Na sua frente, um mar de rostos em expectativa. Para abrir o evento, um cara com topete de Elvis e envolto numa bandeira do arco-íris cantou Imagine.

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Annalena Baerbock, a candidata do Partido Verde, está pedindo aos alemães que façam exatamente isso. Que imaginem um país movido inteiramente a energias renováveis. Que imaginem uma mulher de 40 anos, relativamente desconhecida e pouco experiente, no cargo de chanceler. Que imaginem seu partido, que jamais governou a Alemanha, liderando o governo após as eleições do mês que vem.

“Esta eleição não vai definir apenas o que acontecerá nos próximos quatro anos, vai definir o nosso futuro”, disse Baerbock à multidão, levando seu discurso a uma tradicional região carvoeira que fechou sua última mina três anos atrás.

“Precisamos mudar para preservar o que amamos e estimamos”, disse ela no território não necessariamente hostil, mas cético. “A mudança exige coragem. E a mudança está na eleição de 26 de setembro”.

Resta saber quantas mudanças os alemães realmente querem após 16 anos de Merkel. A chanceler se tornou indispensável ao atravessar inúmeras crises – financeiras, migratórias, populistas e pandêmicas – e solidificar a liderança da Alemanha no continente. Outros candidatos estão competindo para ver quem consegue ser mais parecido com ela.

A candidata do Partido Verde alemão Annalena Baerbock participa de plenária na Bundestag Foto: Michele Tantussi/REUTERS

Baerbock, ao contrário, pretende sacudir o status quo. Ela está desafiando os alemães a lidar com as crises que Merkel deixou praticamente de lado: descarbonizar o poderoso setor automotivo; desmamar o país do carvão; repensar as relações comerciais com concorrentes estratégicos, como China e Rússia.

Nem sempre é uma ideia fácil de vender. Numa disputa incomumente acirrada, ainda existe uma chance remota de que os verdes alcancem os dois partidos que vêm governando a Alemanha. Mas, mesmo que não o façam, é difícil imaginar uma coalizão partidária que não os inclua no próximo governo. Isso confere a Baerbock, a suas ideias e a seu partido uma importância central para o futuro do país.

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Mas os alemães ainda estão só começando a conhecê-la.

Atleta de trampolim na juventude que se formou advogada aos 32 e tem duas filhas, Baerbock entrou no cenário político nacional da Alemanha apenas três anos atrás, quando foi eleita uma das líderes verdes. “Quem é Annalena?”, um jornal perguntou na época.

Depois de ser nomeada em abril como a primeira candidata a chanceler dos Verdes, Baerbock por um breve momento ultrapassou seus rivais dos partidos que há muito dominam a Alemanha: Armin Laschet, líder dos democratas-cristãos, e Olaf Scholz, dos social-democratas de centro-esquerda, que neste momento lidera a corrida.

Mas ela ficou para trás depois de tropeçar algumas vezes. Rivais acusaram Baerbock de plágio após revelações de que ela não fez a citação correta em certas passagens de um livro recém-publicado. E algumas imprecisões de seu currículo chegaram às manchetes dos jornais.

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Mais recentemente, ela e seu partido não conseguiram aproveitar as inundações que mataram mais de 180 pessoas no oeste da Alemanha para energizar sua campanha, mesmo quando a catástrofe catapultou as mudanças climáticas – a principal pauta dos Verdes – para o topo da agenda política.

Na esperança de dar um novo começo para sua campanha, Baerbock, que viaja num ônibus verde brilhante, com dois andares e coberto por painéis solares, está apresentando sua proposta aos eleitores alemães em 45 cidades e vilas de todo o país.

Nascida em 1980, ela tem a mesma idade de seu partido. Quando era criança, seus pais a levavam a protestos anti-Otan. Na época em que ela entrou para os Verdes, ainda estudante, em 2005, o partido tinha completado sua primeira passagem pelo governo como parceiro menor dos social-democratas.

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A esta altura, muitos eleitores passaram a ver os Verdes como um partido que amadureceu, mas permanece fiel a seus princípios. É pró-meio ambiente, pró-Europa e assumidamente pró-imigração.

Baerbock propõe gastar 50 bilhões de euros, cerca de R$ 300 bilhões, em investimentos verdes a cada ano, durante uma década, para financiar a transformação da Alemanha numa economia neutra em carbono – e pagar a conta eliminando a estrita regra de equilíbrio orçamentário do país.

Um pôster de campanha de Annalena Baerbock em Berlim Foto: John MacDougall/AFP

Ela diz que irá aumentar os impostos sobre os que ganham mais e impor tarifas sobre as importações que não sejam neutras em carbono. Ela imagina painéis solares em todos os telhados, uma indústria de carros elétricos de primeira linha, um salário mínimo mais alto e subsídios climáticos para quem tem baixa renda. E quer se juntar aos Estados Unidos para ser dura com a China e a Rússia.

Ela também está comprometida com a crescente diversidade da Alemanha – foi a única candidata que falou da responsabilidade moral do país em receber alguns refugiados afegãos, além daqueles que ajudaram as tropas ocidentais.

As ambições de Baerbock de quebrar tabus em casa e no exterior – e sua ascensão como uma séria desafiadora do status quo – estão chamando a atenção dos eleitores à medida que a eleição se aproxima.

Isso também a tornou alvo de campanhas de desinformação online da extrema direita e de outros. Uma foto falsa dela nua circulou com a legenda “Eu precisava de dinheiro”. Citações falsas dizem que ela quer proibir todos os animais de estimação para minimizar as emissões de carbono.

Observadores políticos dizem que os ataques contra Baerbock foram desproporcionais e revelam um fenômeno mais profundo. Apesar de ter uma mulher como chanceler por quase duas décadas, as mulheres ainda enfrentam um escrutínio mais rígido e, às vezes, um sexismo absoluto na política alemã.

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“Minha candidatura polariza de uma maneira que não era imaginável para muitas mulheres da minha idade”, disse Baerbock, sentada entre painéis de madeira brilhante no nível superior de seu ônibus de campanha.

“De certa forma, o que experimentei é semelhante ao que aconteceu nos Estados Unidos quando Hillary Clinton concorreu à presidência”, disse ela. “Eu defendo a renovação, os outros defendem o status quo. E, claro, aqueles que têm interesse no status quo veem minha candidatura como uma declaração de guerra”.

Quando Merkel concorreu pela primeira vez, em 2005, aos 51 anos, muitas vezes ela era descrita como a “garota” do chanceler Helmut Kohl e ouvia não apenas intermináveis comentários sobre seu corte de cabelo, mas também perguntas implacáveis sobre sua competência e prontidão para o cargo. Na época, até os aliados de seu partido a rejeitaram como líder interina.

A resposta de Baerbock a tais desafios não é esconder sua juventude nem sua maternidade, mas sim se apoiar nelas.

“Depende de mim, como mãe, depende de nós, como sociedade, de nós adultos, estarmos preparados para as perguntas de nossos filhos: você tomou alguma atitude?”, ela disse. “Será que estamos fazendo tudo para garantir o clima e, com ele, a liberdade dos nossos filhos?”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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