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The Economist: Guinada à direita da Flórida faz governador pensar na Casa Branca

Governador republicano Ron DeSantis usa Estado como trampolim para divulgar sua plataforma política

Por The Economist
Atualização:

LONDRES - O governador republicano da Flórida, Ron DeSantis, publicou recentemente seu orçamento anual “Liberdade Primeiro”. Se isso soa como slogan de campanha, não é por acaso. DeSantis está concorrendo à reeleição em novembro, e acredita-se que esteja planejando concorrer à presidência em 2024. 

Governador da Flórida, Ron DeSantis, ao lado do ex-presidenteDonald Trump Foto: Jabin Botsford/Washington Post

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Com a legislatura do governo estadual a todo vapor – encerrando-se em março –, vale a pena acompanhar os acontecimentos do Capitólio de Tallahassee pelo que eles podem revelar tanto a respeito da ambição de DeSantis quanto sobre a direção política da Flórida. O terceiro Estado americano mais populoso está guinando para a direita. 

Em 2018, Donald Trump, que transferiu seu domicílio eleitoral para a Flórida, e na época ocupava a Casa Branca, transformou a carreira de DeSantis, ajudando o então desinteressante deputado a vencer as primárias para disputar o governo ao apoiá-lo inesperadamente. 

A resposta desafiadora de DeSantis à covid-19 – combatendo restrições, como obrigatoriedade de uso de máscaras e pressionando pela reabertura de escolas – elevou sua estatura nacionalmente, assim como seus ataques ao presidente Joe Biden e seu “estado de segurança biomédica”. 

DeSantis descreve a Flórida como o “Estado mais livre dos EUA”. Seu histórico com a covid lhe rendeu amigos e inimigos: as 64 mil mortes na Flórida representam uma taxa de mortes per capita mais elevada do que o índice nacional dos EUA, mas que não é tão alta como previram alguns, dada a aversão do governador por restrições comuns em outras partes. 

DeSantis está usando a Flórida como um trampolim peninsular para divulgar suas políticas. Em sua proposta de orçamento, de US$ 100 bilhões, ele está pressionando por uma força especial de polícia para supervisionar eleições estaduais, que ele chama de “unidade de integridade eleitoral”, e pretende tornar mais simples penalizar empresas que “facilitem imigração ilegal” para a Flórida. Ele prevê bônus para policiais que se mudarem para a Flórida e quer criar uma milícia estadual de voluntários que poderia trabalhar juntamente com a Guarda Nacional durante emergências. 

Governo federal democrata financia agenda de republicano

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O governo federal e Biden podem ser os inimigos favoritos de DeSantis, mas também financiam parte de sua agenda. O governador propõe aumento de salários para professores e policiais, assim como US$ 1 bilhão para oferecer aos moradores da Flórida uma isenção do imposto estadual sobre a gasolina. O Estado usará pelo menos US$ 3,8 bilhões do estímulo federal para programas como esses no próximo ano fiscal, constata o centro de análise Florida Policy Institute.

Moradores de Tampa, na Flórida;governo evitou restrições no combate à pandemia, que incluiu até o uso de máscaras Foto: Octavio Jones/Reuters

A legislatura está alinhada com o governador em temas sociais. Está tentando banir discussões em sala de aula sobre assuntos que façam os alunos sentirem “constrangimento, culpa, angústia ou qualquer forma de sofrimento psicológico em razão de sua raça”, aludindo para a teoria crítica da raça, um tópico que ajudou republicanos a vencer eleições, como no caso do governo da Virgínia. Outra proposta é banir discussões sobre sexualidade e identidade de gênero em escolas públicas. 

Um projeto legislativo proibindo abortos após a 15.ª semana de gestação deverá virar lei em breve. “Os legisladores estão trabalhando para que, se a Suprema Corte decidir a favor do Estado do Mississippi, que foi pioneiro em estabelecer o limite de 15 semanas, aprovando sua controvertida legislação, a Flórida terá em seu código uma lei que poderá ser aplicada”, afirma Chris Sprowls, presidente da Câmara dos Deputados da Flórida.

O que explica a guinada da Flórida para a direita? Recentemente, o número de eleitores registrados como republicanos excedeu o número de democratas registrados pela primeira vez na história moderna. 

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Agora, 35,9% dos eleitores registrados identificam-se como republicanos. Democratas e independentes são 35,6% e 26,8%, respectivamente. Os republicanos veem ímpeto a seu favor. Sprowls afirmou que pessoas mudando-se para a Flórida estão “se dando conta de que existem motivos para escolherem vir para cá” – no caso, as políticas republicanas. 

O eleitorado volúvel, agora próximo a DeSantis, também tem parte nisso. “Aqui é um território amigável, e os republicanos que você encontra por aqui são muito orientados para DeSantis”, explica Steve Schale, militante democrata. 

Muitos notam que jamais viram tão pouca discórdia dentro do Partido Republicano quando se trata da agenda do governador. DeSantis “emerge como o mais poderoso governador na história do Estado”, de acordo com James Clark, autor de Hidden History of Florida (“A história oculta da Flórida”).

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Com os republicanos aproximando-se de uma supermaioria na Câmara estadual, os democratas veem-se impotentes para impedi-los. Evan Jenne, líder da oposição, afirma que os democratas possuem um “senso de humor definitivamente ácido”. Ele compara a atual experiência no governo do Estado a ter de “deitar sobre os trilhos do trem, mesmo que saibamos que o trem nos atropelará”. 

A legislatura testará a amplitude do poder de DeSantis. Ele interveio no processo de redefinição distrital, submetendo os próprios mapas para favorecer a posição dos republicanos em eleições futuras – a primeira vez, segundo registros conhecidos, que um governador da Flórida foi tão longe nesse sentido. Oponentes afirmam que a proposta poderia violar a lei estadual. 

Governador promete criar a Polícia Eleitoral

 Outro teste será se a legislatura criará ou não a força de polícia eleitoral que ele propõe, que foi recebida com indiferença e tem mais “transparência política do que outras de suas propostas”, segundo Aubrey Jewett, professor da Universidade Central da Flórida. 

Tudo isso sugere que esperar de DeSantis um republicanismo mais brando que o de Trump pode ser um engano. O pragmatismo pós-eleitoral abriu caminho para uma propensão à grandiloquência. O homem que ensaia para uma função nacional é complexo: é bem formado e tem pinta de estudioso, mas lhe falta carisma. Sua mulher, Casey, que luta contra o câncer, é impressionante, impulsionando sua campanha nacional e defendendo políticas “com base na fé” entre os doadores. 

Neste momento, o governador parece a caminho da reeleição. A Flórida está prosperando: a maioria das empresas permaneceu aberta, apesar da covid-19, e pessoas estão se mudando para o Estado. Isso dificulta para os oponentes democratas: Charlie Crist, ex-governador republicano, que agora concorre como opositor, e Nikki Fried, a comissária de agricultura do Estado – apesar de ela ter prejudicado suas perspectivas quando comparou DeSantis a Hitler, afirmando que ele age como um ditador.

A candidata mais convincente é Annette Taddeo, a primeira democrata latina a ser eleita para o Senado estadual, representando o condado de Miami-Dade. Ela considera que a maior fraqueza de DeSantis “é ele se preocupar com os eleitores de Iowa e de New Hampshire, e não com os da Flórida”. 

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Em novembro, os eleitores do Estado poderão expressar nas urnas se a ambição nacional de seu governador os irrita ou não. Um cidadão com base na Flórida que assiste a tudo atentamente é Trump, que tem disparado críticas veladas contra seu protegido, que virou um potencial rival. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO