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'Transição em Cuba já está desenhada'

Segundo professor da Universidade de Denver, poder deve ser renovado com renúncia de Raúl Castro em 2016

Por Denise Chrispim Marin
Atualização:

A transição da velha para a nova geração no poder em Cuba já está desenhada pelo presidente Raúl Castro. O vice-presidente cubano, Miguel Diáz-Canel, é um "enigma", segundo Arturo López-Levy, professor da Universidade de Denver, no Colorado, mas seu nome tende a ser consagrado no próximo Conselho do PCC, em 2016, se Raúl vier a renunciar nesse evento. A seguir, trechos da entrevista. Quão sinceras são as intenções do governo de Cuba ao assinar o acordo com os EUA? Não vejo por que o governo de Cuba não estaria sendo sincero. A liberação dos presos cubanos, dos dissidentes e dos americanos, com o acordo, custou pouco aos dois lados. Há dúvidas, porém, sobre novas prisões de dissidentes. O fato de assinar um acordo não quer dizer que Raúl Castro tenha saído do armário como um democrata. Ele é comunista e vai continuar se comportando como tal. Mas o acordo não deixa de ser um avanço. Há uma reforma econômica em curso e, com vistas à sucessão presidencial em Cuba, os EUA deram incentivos para a adoção de políticas mais moderadas pelo governo cubano. Não há efetiva abertura política? Há abertura econômica. Quanto à permissão à concorrência política, não creio haver abertura ampla. Não haverá mudança no sistema de partido único. Mas agora se torna mais fácil promover a descentralização, para dar maior poder às províncias e aos municípios. E quanto à reforma econômica? Cuba pode se tornar semelhante à China ou ao Vietnã? Esse é o interesse. O governo quer construir uma economia mista, valendo-se do investimento já realizado em saúde e educação no capital humano. Há abertura aos capitais estrangeiros. Creio que as reformas econômicas se darão em menor escala do que as do modelo chinês porque, em um país ocidental, elas ameaçarão o sistema de partido único. A abertura econômica não levará a mais distensão política? Sim. Com o acordo, as remessas de divisa dos EUA para Cuba poderá aumentar para US$ 500 milhões. O número de viajantes americanos pode duplicar ou triplicar. A importação de máquinas agrícolas beneficiará a produção de alimentos. Essa conjuntura pode abrir espaço para pequenas reformas políticas. Raúl tem 83 anos. Como ele está conduzindo a sua própria sucessão? Isso já está definido. Estou seguro que o atual primeiro-vice-presidente, Miguel Díaz-Canel, será o dirigente de Cuba. Ele é um homem de 54 anos, que fez carreira no Partido Comunista (PC) e mantém vínculos com os militares. O fato de Díaz-Canel estar articulado com vertentes regionais do partido lhe dá um espaço político particular no PC. O interessante da movimentação de Obama, está na indução de Díaz-Canel a adotar posição mais moderada, uma política exterior menos propícia a criar problemas com os EUA. Fidel deu apoio a Raúl para a reaproximação de Cuba com os EUA e as reformas econômicas? Há sinais de que sua saúde se deteriorou bastante, que não teria capacidade de seguir o governo. Ele não se pronunciou sobre o acordo. Mesmo que quisesse deter as reformas, duvido que pudesse fazê-lo. Raúl pode renunciar? Sim. Um dado interessante foi a convocação do próximo Congresso do PC para abril de 2016. Nesse momento, Raúl pode renunciar. O surgimento de uma oposição articulada está nos cálculos do governo? No longo prazo, a projeção dos opositores vai aumentar. O próprio Raúl disse recentemente que o PC deveria acolher no governo pessoas que, embora não comunistas, não sejam inimigas do partido. Raúl Castro teria feito o acordo com se Cuba estivesse recebendo todo o petróleo a preços subsidiados da Venezuela? Creio que Raúl Castro o faria de qualquer maneira porque é de interesse de Cuba. Não se tratou de um acordo forçado. Obama negociou como um cavalheiro, com seriedade. Ele fez o que era politicamente possível com Cuba. Saiu da praia e entrou no mar até onde deu pé.

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