Trump demite assessor extremista

Posições de Steve Bannon vinham causando polêmica e entrevista na qual ele comparou o presidente ao líder norte-coreano foi a gota d’água

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Por Lucia Guimarães , Correspondente e Nova York 
Atualização:

A queda do mais controvertido assessor de Donald Trump, Steve Bannon, anunciada ontem, foi objeto de especulação intermitente durante meses. Bannon representa a ala nativista de ultradireita que assumiu a campanha Trump em agosto de 2016 e levou o candidato à vitória. Uma entrevista de Bannon, publicada na quarta-feira, foi a última gota e tornou insustentável a permanência do ex-investidor e empresário de mídia.

"Sobre a Coreia do Norte, apenas nos provocam, não é nada além de uma distração", afirmou Steve Bannon Foto: AP Photo/Carolyn Kaster

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Em suas primeiras declarações após ser demitido, Bannon afirmou ontem que “continuará lutando por Trump” mesmo fora da Casa Branca. “Vou lutar por Trump contra seus adversários, no Capitólio, nos meios de comunicação e nas corporações americanas”, disse ele à Bloomberg News. O site Breitbart News, que Bannon dirigiu antes de se unir à equipe de Trump, anunciou seu regresso como presidente-executivo. 

Na quarta-feira, numa conversa franca que estarreceu até quem está acostumado aos sobressaltos cotidianos da Casa Branca, Bannon tomou a iniciativa de telefonar para um jornalista do progressista site The American Prospect e ridicularizou o próprio chefe comparando Trump ao líder norte-coreano, Kim Jong-un: “O risco de dois tolos arrogantes tropeçando num confronto nuclear é mais alto hoje do que em qualquer momento desde outubro de 1962”, disse, numa referência à crise dos mísseis em Cuba, no governo de John F. Kennedy.

Na mesma entrevista, Bannon disse que os EUA estão a caminho de uma guerra comercial com a China. O tom das declarações foi de quem é presidente, não assessor. Ele provocou os que considera inimigos ou “globalistas”, nos Departamentos do Tesouro e de Estado. Disse que ia demitir uma subsecretária de Estado para trazer “falcões”. A entrevista irritou Trump e deixou claro para observadores que Bannon estava promovendo sua própria agenda como um renegado instalado a passos do Salão Oval.

O empurrão final foi organizado pelo recém-nomeado chefe de Gabinete, general John Kelly, ex-comandante dos fuzileiros navais. Kelly foi trazido para tentar impor ordem na Casa Branca mais cheia de facções da memória recente. 

Um fator decisivo foi a reação impulsiva de Trump ao atentado de Charlottesville no sábado, quando um militante neonazista jogou um carro contra um grupo que se manifestava contra uma marcha supremacista branca, matou uma mulher e feriu 19 pessoas. O incidente provocou consternação entre aliados do presidente e foi aplaudido por Bannon. Durante a improvisada entrevista de terça-feira na Trump Tower, quando o presidente disse que havia pessoas de bem entre os neonazistas e nacionalistas brancos, Kelly foi visto sacudindo a cabeça, incrédulo. No dia seguinte, as declarações de Bannon à American Prospect deixaram claro que o assessor estava desafiando a autoridade de Trump e Kelly.

Bannon fez fortuna em Wall Street, passou por Hollywood como produtor e era editor-chefe do site ultradireitista Breitbart News quando foi recrutado pela bilionária família Mercer, de importantes doadores da campanha de Trump. Ele teve de se afastar oficialmente do Breitbart, mas, em Washington, poucos acreditavam que a redação não refletia sua orientação editorial. Nas últimas semanas, o site passou a atacar o assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, outro militar, H.R. McMaster, general da reserva com grande reputação nas Forças Armadas. McMaster reivindica um aumento de tropas no Afeganistão – na contramão do isolacionista Bannon.

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O ex-estrategista-chefe também bateu de frente com a filha e o genro do presidente, Ivanka Trump e Jared Kushner, ambos com funções oficiais na Casa Branca, e foi apontado como fonte anônima de vazamentos comprometedores sobre as finanças de Kushner. O conselheiro especial nomeado pelo Departamento de Justiça, Robert Mueller, está investigando Kushner no inquérito sobre a interferência da Rússia na campanha presidencial de 2016.

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