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Trump, sob suspeita de obstrução à Justiça

Comey depõe e leva a crer que presidente cometeu crime passível de impeachment

Por Cláudia Trevisan , Correspondente e Washington 
Atualização:

Em uma das conversas que teve com James Comey, Donald Trump disse que gostaria de ver dissipada a “nuvem” da suspeita de que ele poderia estar sob investigação no caso da interferência da Rússia nas eleições dos EUA, relatou o ex-diretor do FBI. Na quinta-feira, Comey declarou que o presidente não estava sob investigação em 9 de maio, quando ele foi demitido.

Trump contratou, em maio de de 2017, advogado com fortes ligações com a Rússia Foto: Evan Vucci/AP

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Mas seu depoimento no Senado jogou sobre o governo uma nuvem ainda mais carregada: a possibilidade de que Trump possa ter cometido o crime de obstrução de Justiça, uma das ofensas passíveis de impeachment. Ao demitir Comey, o presidente desencadeou uma sucessão de eventos que levaram à indicação de um procurador independente para investigar o imbróglio russo e garantiu que a “nuvem” continuará a assombrá-lo por meses.

“Isso está longe do fim”, disse Robert Spitzer, cientista político especializado em presidência e Constituição americanas e professor da Universidade Estadual de Nova York, em Cortland. Em sua opinião, será difícil provar a obstrução de Justiça nos termos da legislação criminal, que exige a demonstração de que Trump agiu de maneira deliberada e sabia que seu ato era ilegal.

Spitzer ressaltou que há outro ângulo, o do “senso comum”, que é o adotado em casos de impeachment. “Desse ponto de vista, para mim, é impossível chegar a qualquer outra conclusão que não seja a de que Trump tentou várias vezes fazer Comey desacelerar ou parar a investigação relativa ao general (Michael) Flynn”, observou. Ex-conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Flynn foi demitido por ter mentido sobre seus contatos com o embaixador russo em Washington.

“Provar obstrução de Justiça é extremamente difícil”, observou o professor Leo Ribuffo, especialista em história americana do Século 20 da Universidade Georgetown. “É preciso mais que a declaração de uma pessoa, negada pelo outro participante da conversa. Richard Nixon não teria sido forçado a renunciar se não existissem as fitas que provaram que ele estava mentindo.” Trump insinuou, em 12 de maio, que tinha gravações das conversas com Comey, mas rejeitou confirmar sua existência na sexta-feira. 

Especialistas estão longe de um consenso sobre se os atos do presidente podem ser caracterizados como obstrução de Justiça. Mesmo que possam, muitos acreditam que não é possível iniciar um processo criminal contra um presidente em exercício.

Restaria o caminho do impeachment, que hoje está bloqueado pela maioria republicana na Câmara e no Senado. A menos que Trump se transforme em um peso morto para seu partido, é improvável que eles se movam para afastá-lo.

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Ainda assim, sua presidência continuará sob a “nuvem” de suspeição enquanto existir a investigação conduzida pelo procurador independente e ex-diretor do FBI Robert Mueller. Foi para ele que Comey entregou as notas que escreveu depois de cada uma das nove conversas que teve com Trump desde 6 de janeiro.

“O presidente piorou sua situação hoje (sexta-feira) ao chamar Comey de mentiroso. Isso se tornará uma questão que poderá demandar depoimentos adicionais”, avaliou Michael Traugott, do Centro de Estudos Políticos da Universidade de Michigan. Outro erro de Trump, em sua opinião, foi ter declarado que está “100% disposto” a depor sob juramento. “Tenho certeza que Mueller aceitará a oferta.”

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