Turquia ameaça enviar força naval à costa de Israel

Premiê turco diz que reforçará bases que dão acesso ao sul do Mar Mediterrâneo e rompe comércio do setor militar com israelenses

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ANCARAVisivelmente irritado, o primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, anunciou ontem o corte de todo o comércio com Israel ligado ao setor de Defesa e ameaçou enviar navios de guerra para perto da costa israelense no Mediterrâneo, colocando as forças navais dos dois países aliados dos EUA sob um clima de forte tensão.A decisão ocorre menos de cinco dias depois de Ancara expulsar o embaixador de Israel, rebaixando os contatos entre os dois países para o nível de terceiro secretário - um dos postos mais baixos na hierarquia diplomática. Toda a cooperação militar entre os governos também foi rompida e, na segunda-feira, turistas israelenses reclamaram de maus tratos no aeroporto de Istambul.As medidas foram tomadas pela Turquia diante da recusa de Israel em pedir desculpas pela morte - em mãos de soldados israelenses - de nove ativistas turcos que estavam a bordo da flotilha que levava ajuda humanitária à Faixa de Gaza, interceptada em maio de 2010 pela Marinha israelense. Na semana passada, uma investigação da ONU concluiu que Israel usou a força "de modo excessivo" contra a embarcação turca. O relatório, porém, reconheceu a legalidade do bloqueio imposto a Gaza. O governo israelense aceitou o resultado do inquérito, mas o gabinete turco irritou-se com as conclusões."O sul do Mar Mediterrâneo não é um lugar estranho para nós. Askaz e Iskenderun (bases navais turcas) têm o poder e a chance de efetuar escoltas", afirmou Erdogan ontem. "Claro que nossos navios serão vistos com maior frequência por aquelas águas." Ao mesmo tempo, Erdogan anunciava que negocia com o Egito uma visita a Gaza - em outro movimento que deve ampliar a tensão com Israel. Momentos antes das declarações do premiê turco, o ministro da Defesa de Israel, Ehud Barak, pediu moderação e diálogo para resolver a crise. "Israel e Turquia são os países mais fortes do Oriente Médio e, em muitos aspectos, os mais importantes. Temos desentendimentos, mas é importante que os dois lados ajam de modo racional. Seria o melhor para todos os envolvidos e para a estabilidade regional", disse.O único alto funcionário de Israel a se pronunciar após as declarações de Erdogan foi Dan Meridor, vice do prêmie Binyamin Netanyahu. "Lamento que tenhamos chegado a esse ponto. Espero que, no fim, a raiva diminua e a razão prevaleça."Nos bastidores, a Casa Branca e o Departamento de Estado dos EUA indicaram ontem que estão trabalhando para evitar que o clima entre turcos e israelenses piore ainda mais. A Turquia integra a Otan, tem bases da aliança atlântica e está prestes a assinar um acordo para instalar em seu território radares voltados para o Irã. Aliado histórico de Washington, Israel é um dos principais destinos de ajuda militar dos EUA no mundo.A porta-voz da diplomacia dos EUA, reconheceu que a crise entre os aliados é motivo de "preocupação". Fontes disseram que funcionários de alto escalão do governo dos EUA, incluindo a secretária de Estado, Hillary Clinton, já estão empenhados em evitar que o distanciamento entre Israel e Turquia cresça.Aliança estratégica. As relações entre o governo Erdogan e Israel estão abaladas desde 2008, quando o líder turco criticou duramente a ofensiva israelense contra Gaza. Meses depois, ele deixou o presidente de Israel, Shimon Peres, falando sozinho numa mesa de debate no Fórum Econômico Mundial, em Davos. Turcos e israelenses compartilhavam informações de segurança e inteligência havia cerca de três décadas. A relação diplomática entre os países era considerada um dos principais eixos estratégicos do Oriente Médio. / AP e REUTERSPara ex-secretário de Defesa dos EUA, "Bibi é um ingrato"Pouco antes de deixar seu cargo, em julho, o ex-secretário da Defesa dos EUA Robert Gates teria dito ao presidente Barack Obama que o premiê de Israel, Binyamin "Bibi" Netanyahu, era "um ingrato". Gates supostamente reclamou ainda que, apesar dos grandes esforços americanos para garantir a segurança do aliado, o governo israelense "não retribuiu com nada". Segundo o chefe do Pentágono, Netanyahu colocaria Israel em perigo por ser incapaz de compreender como seu país está se isolando internacionalmente e sofre uma pressão demográfica insustentável com a ocupação da Cisjordânia.As revelações foram feitas por Jeffrey Goldberg, um dos repórteres mais prestigiados dos EUA, colunista da revista "The Atlantic" e da "Bloomberg View". As informações teriam sido transmitidas ao jornalista por funcionários de alto escalão dos EUA que estavam na reunião em que Gates fez o comentário a Obama.Os comentários do ex-secretário teriam sido feitos durante um encontro do Conselho Nacional de Segurança da Casa Branca. Nenhum dos outros participantes do encontro teria discordado de Gates. O chefe do Pentágono supostamente reclamou ainda das críticas de Bibi à venda de armas à Arábia Saudita.

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