Um assassinato que se converte num erro estratégico de Israel

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Por É CODIRETOR DO CENTRO PALESTINO-ISRAELENSE PARA PESQUISA e INFORMAÇÃO
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Análise: Gershon Baskin / NYTAhmed Jabari, o homem forte do Hamas, responsável pelo sequestro do soldado israelense Gilad Shalit, foi assassinado na quarta-feira por mísseis israelenses. Por que? Segundo o governo de Israel, o objetivo dos recentes ataques contra Gaza é criar novamente uma dissuasão de modo que nenhum foguete seja lançado contra Israel. No passado, as mortes de líderes do Hamas por Israel levaram a liderança do grupo à clandestinidade e temporariamente impediram ataques com foguetes contra solo israelense. A dissuasão, segundo autoridades de Israel, será obtida novamente com a eliminação de líderes políticos e militares em Gaza e destruindo a infraestrutura militar do Hamas. Mas essa política jamais foi eficaz no longo prazo, mesmo quando o fundador e líder espiritual do Hamas, o xeque Ahmed Yassin, foi morto por Israel. O Hamas não depôs as armas na ocasião e também não vai deixar de lançar foguetes contra Israel agora se não houver acordo de trégua. Quando negociamos a libertação do soldado Shalit com o Hamas, membros do governo achavam que Jabari não assinaria um acordo, pois a posse de Shalit era uma espécie de "apólice de seguro de vida". O governo israelense ficou com as mãos livres para matar Jabari depois de o soldado ser libertado em outubro de 2011. Sua apólice de seguro estava ligada ao valor conferido pelos israelenses de o soldado ser mantido vivo. Este semana, a apólice expirou. Acho que Israel cometeu um grave erro estratégico quando decidiu matar Jabari. Claro que ele não era um homem da paz; não acreditava na paz com Israel e rejeitava qualquer contato direto com líderes israelenses. Meus contatos indiretos com ele foram realizados por meio do meu contraparte do Hamas, Ghazi Hamad, vice-ministro do Exterior, que estava autorizado a tratar do assunto diretamente comigo. Encarregado de trocar mensagens entre os dois lados, soube em primeira mão que Jabari não estava apenas interessado num cessar-fogo de longo prazo; ele também era o responsável pela adoção de entendimentos anteriores intermediados pela agência de inteligência egípcia. Jabari aplicou os acertos de cessar-fogo só após confirmar que Israel estava pronto para suspender seus ataques contra Gaza. Na manhã em que foi morto, havia recebido o esboço de uma proposta para um cessar-fogo ampliado com Israel, incluindo mecanismos para confirmar as intenções das partes e garantir o cumprimento do acordo. A proposta foi firmada por mim e pelo vice-ministro do Exterior, Hamad, quando nos reunimos na semana passada no Egito. O objetivo era ir mais além de pontos acertados no passado. Outros líderes e membros influentes do Hamas, do Conselho da Shura, a alta cúpula decisória, apoiaram a nova tentativa de cessar-fogo, pois, como Jabari, compreendem a futilidade dos sucessivos ataques com foguetes contra Israel, que não provocam nenhum dano efetivo do lado israelense, mas causam dezenas de vítimas em Gaza. Jabari não desejava ceder à estratégia de "resistência", ou seja combater Israel, mas via a necessidade de um novo enfoque e estava disposto a firmar um acordo de cessar-fogo de longo prazo. Esta guerra está sendo novamente apresentada por Israel como sendo a única alternativa. Mas devemos perguntar se não existe uma outra maneira de alcançar o mesmo objetivo sem o uso da força. A única coisa que Israel não tentou até agora foi um acordo de trégua mútua de longo prazo. Um projeto foi traduzido e entregue a Jabari e às autoridades da segurança israelenses que sabiam da nossa mediação. Pela proposta esboçada, que eu sei que Jabari leu horas antes de ser morto, informações da inteligência israelense transmitidas ao egípcios seriam entregues a Jabari para ele adotar medidas evitando algum ataque contra Israel. Mas Jabari está morto e com ele morreu a possibilidade de um longo cessar-fogo. Quem o substituirá? Não estou convencido que os líderes de Israel respondam adequadamente a esta questão.

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