Uma saída desordenada

Parlamento britânico é contra Brexit sem acordo, mas não pode impedi-lo facilmente

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Por THE ECONOMIST
Atualização:

Todos no Parlamento britânico, exceto talvez a própria primeira-ministra Theresa May, esperam perder na votação de hoje sobre o Brexit. Mas ninguém sabe o que pode acontecer em seguida. May simplesmente avisou aos parlamentares que eles entrariam em “território desconhecido”.

Isso não ocorre por falta de planos alternativos. Eles variam de um acordo de livre-comércio no estilo canadense, por meio de uma opção semelhante à da Noruega, até um segundo referendo. Mas, no momento, parece não haver maioria no Parlamento para nenhum deles. 

Theresa May garantiu que enquanto for primeira ministra não será realizado novo referendo sobre o Brexit Foto: Paul Grover/Pool Photo via AP

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E há uma outra verdade inconveniente. De acordo com a lei britânica e com o Artigo 50 do Tratado da União Europeia, o Brexit acontecerá em 29 de março, com acordo ou sem acordo. Por isso, o governo britânico está intensificando o planejamento para uma saída sem acordo, que incluiu eventos tão comicamente ineptos como a concessão de um contrato de serviços de balsa para uma empresa que não possui barcos.

O real propósito de tais exercícios não é se preparar para uma saída da União Europeia sem acordo, para o qual agora é tarde demais. O clima de terror serve para intimidar membros hesitantes do Partido Conservador para apoiar o acordo de May. 

Até agora, isso não parece estar funcionando, em parte porque os adeptos de linha dura do Brexit, como a maioria dos conservadores, preferem o que eles gostam de chamar de um “não acordo administrado”. No entanto, como ficou claro na votação sobre o projeto de lei de finanças, na semana passada, a maioria dos parlamentares, incluindo dezenas de conservadores, são veementemente contra um Brexit sem acordo.

Apesar disso, tal resultado é surpreendentemente difícil de ser interrompido. Trata-se agora, na verdade, da opção padrão. Como diz Cathy Haddon, do centro de estudos Institute for Government, “o Parlamento pode votar em qualquer número de moções, resoluções e emendas a projetos de lei, mas nenhum deles por si só é suficiente para impedir o não acordo”. 

Apenas três coisas, diz ela, podem fazer isso: a aprovação de um Brexit acordado; uma extensão do Artigo 50, que precisa da aprovação unânime dos outros 27 governos da União Europeia, alguns deles relutantes; ou a revogação do Artigo 50, que pode ser feito unilateralmente até 29 de março, mas seria extremamente constrangedor para a primeira-ministra britânica.

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Um grupo multipartidário de parlamentares está estudando agora maneiras de forçar o governo a retirar da mesa de negociações um Brexit sem acordo. Como já fez várias vezes recentemente, o governo pode ignorar uma votação no Parlamento, mesmo que ela tenha alguma força política. 

No entanto, na semana passada, Yvette Cooper, uma deputada do Partido Trabalhista, aprovou uma emenda ao projeto de lei de finanças para tornar ilegal que o governo qualquer alteração dos impostos após um Brexit sem acordo que não tenha recebido explícita aprovação parlamentar. Isso pode também antecipar novas rodadas da guerra de guerrilha entre parlamentares.

Existem muitos alvos em potencial. Pelo menos nove projetos de lei relacionados à saída do Reino Unido da União Europeia precisam ser aprovados antes de 29 de março, até mesmo em questões como comércio, imigração e agricultura. Qualquer um destes poderia ser alterado para dificultar um Brexit sem acordo. 

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Alguns deputados também sugeriram que eles poderiam votar para reduzir os salários ministeriais. Vários legisladores conservadores e até mesmo alguns ministros britânicos ameaçaram abrir mão de direcionar seu voto para lutar contra o Brexit sem acordo. No limite, eles poderiam se unir aos trabalhistas votando para derrubar o governo, provocando a necessidade de uma eleição geral. Mas, como diz Haddon, mesmo isso não impediria uma saída da União Europeia sem acordo.

Sem contar que um Brexit sem acordo é inevitável se o projeto de May for rejeitado hoje. No final, seria uma escolha do governo não permitir o Brexit sem acordo. A maioria dos deputados, como a maioria das empresas e dos eleitores britânicos, não acredita que uma pessoa ordeira e pragmática, como Theresa May, possa se entregar voluntariamente a esse ato de autoflagelação. / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO © 2018 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO  ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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