Maioria conservadora da Suprema Corte encara com ceticismo plano de vacinação obrigatória de Biden

Juízes debatem se governo federal tem poder legal de impor regra que obriga empresas a exigir imunização de seus funcionários

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Por Adam Liptak
Atualização:

WASHINGTON - Membros da maioria conservadora da Suprema Corte dos EUA se mostraram céticos nesta sexta-feira, 7, ao debater se o governo do presidente americano, Joe Biden, pode exigir que empregadores em todo o país cobrem certificados de vacinação ou testes frequentes de seus trabalhadores. 

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A lei federal de segurança no local de trabalho proposta por Biden foi debatida por duas horas, durante as quais os juízes indicaram que o governo federal não teria autoridade legal suficiente para uma medida de emergência tão abrangente.

O tribunal parecia mais propenso a sustentar uma exigência separada de que profissionais de saúde que trabalhem em instalações financiadas com dinheiro federal sejam vacinados. Esse regulamento, objeto de um segundo argumento, estava de acordo com outros tipos de supervisão federal e era apoiado por praticamente toda a área médica, observaram alguns ministros.

O presidente do tribunal, John G. Roberts Jr., e o juiz Neil M. Gorsuch defenderam que os Estados e o Congresso, em vez de uma agência federal, estão mais preparados para intervir em questões de trabalho em todo o país. A juíza Amy Coney Barrett disse que a regulamentação parecia ter um alcance amplo demais. Os juízes Gorsuch e Brett M. Kavanaugh sugeriram que o estatuto governante não autorizou a agência a impor o mandato com clareza suficiente, dadas as apostas políticas e econômicas.

Já os três juízes mais liberais do tribunal disseram que o mandato era uma resposta necessária à crise de saúde pública. “Sabemos que a melhor maneira de prevenir a disseminação é vacinar as pessoas”, disse a juíza Elena Kagan. "É inacreditável achar que seria do interesse público interromper essas vacinações", disse o juiz Stephen G. Breyer.

O debate acontece após meses de apelos públicos, por parte do governo Biden, às pessoas indecisas ou relutantes a tomarem a vacina. O presidente aumentou a pressão em torno do tema em setembro.  "Fomos pacientes, mas nossa paciência está se esgotando", disse. 

Biden tornou as vacinas anticovid obrigatórias nas empresas que empregam 100 trabalhadores ou mais, assim como para os profissionais da saúde nas instalações que recebem fundos federais.  Os funcionários não vacinados teriam que apresentar testes negativos semanais e usar máscaras no trabalho. 

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A Suprema Corte americana, em Washington Foto: Mandel Ngan/AFP

A Administração de Saúde e Segurança Ocupacional (OSHA, na sigla em inglês) estabeleceu o prazo até 9 de fevereiro para as empresas cumprirem as regras. Em caso contrário, enfrentarão a possibilidade de multas.

A obrigação de se vacinar foi imediatamente questionada por alguns deputados republicanos e por proprietários de empresas como uma violação dos direitos individuais e um abuso de poder por parte do Executivo. 

Isso gerou uma onda de denúncias e, agora, a Suprema Corte deve decidir se as ordens podem ser implementadas enquanto os processos jurídicos são tramitados. Uma decisão é aguardada em poucas semanas. 

As empresas com 100 funcionários ou mais representam cerca de 80 milhões de pessoas, o que corresponde a aproximadamente dois terços da força de trabalho do setor privado. A obrigação de vacinação para profissionais da saúde afeta em torno de 10 milhões de pessoas. 

Em uma carta apresentada ao tribunal em nome do governo, a procuradora-geral Elizabeth Prelogar afirmou que as medidas são necessárias "contra a pandemia mais mortal na história da nação". 

"Os trabalhadores adoecem gravemente e morrem, porque estão expostos ao vírus", declarou Prelogar, defendendo que a obrigação de se vacinar salvará a vida de mais de 6.500 trabalhadores e evitará mais de 250.000 hospitalizações em seis meses. 

"Dano irreparável"

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Um grupo de 26 associações empresariais considerou, porém, que a imposição da vacinação "infligirá um dano irreparável a centenas de milhares de empresas".

As empresas serão obrigadas a repassar os custos das vacinas e dos testes aos consumidores, o que resultará em "preços ainda mais altos em um momento de inflação recorde", argumentaram. 

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Outra possibilidade é que sejam repassados aos funcionários não vacinados, "que deixarão de trabalhar em massa, em vez de sofrerem cobranças adicionais a cada semana". "O choque que isso vai gerar nos empregos devastará as já frágeis cadeias de abastecimento e os mercados de trabalho", concluíram.

Liderados pelo Missouri, os Estados governados por republicanos alegaram que obrigar os trabalhadores da saúde a se vacinarem "ameaça gerar uma crise nas instalações de atenção médica nas áreas rurais dos Estados Unidos". "Estaria obrigando milhões de trabalhadores a escolherem entre perder seus empregos, ou cumprir uma ordem federal ilegal", afirmaram. 

O governo respondeu que o número de pessoas que deixaram seus empregos, devido à obrigação de se vacinarem, foi realmente muito baixo. Em um hospital de Houston, no estado do Texas, por exemplo, apenas 153 dos 26.000 funcionários se demitiram para evitar cumprir a ordem. 

Várias grandes corporações americanas, incluindo a gigante da carne Tyson Foods e a companhia aérea United Airlines, ordenaram a vacinação aos seus funcionários em setembro, sem sofrer grandes alterações. 

O Supremo é formado por seis magistrados conservadores e três liberais (progressistas). Todos eles foram vacinados e receberam doses de reforço, segundo o próprio órgão.

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O tribunal confirmou, anteriormente, a obrigação da vacinação imposta a estudantes universitários e a profissionais da saúde pelas autoridades locais, mas também bloqueou decisões federais relacionadas com a pandemia. Anulou, por exemplo, uma moratória sobre a falta de moradia. 

Se a corte bloquear a decisão do governo de impor a vacinação, será um grande golpe para Biden, que fez do controle da pandemia uma de suas prioridades e está lutando contra um aumento dos casos, devido à variante ômicron. 

A vacinação se tornou um tema de polarização política nos Estados Unidos, onde 62% da população está vacinada. O país registrou até agora mais de 58 milhões de casos de coronavírus e mais de 830.000 mortes./NYT e AFP

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