WASHINGTON - A Venezuela acusou nesta quinta-feira, 5, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luiz Almagro, de extrapolar suas funções e atuar em acordo com a oposição ao presidente Nicolás Maduro e os Estados Unidos para aplicar a Carta Democrática Interamericana ao país. A medida foi solicitada na semana passada em Washington por um grupo de parlamentares que se opõe ao chavismo.
Sentada ao lado de Almagro durante reunião do Conselho Permanente da instituição, a ministra das Relações Exteriores da Venezuela, Delcy Rodríguez, afirmou que ele atua com parcialidade em relação a seu país. A reunião foi convocada por Caracas para contestar a possibilidade de invocação da Carta Democrática pelo secretário-geral. Segundo o governo Maduro, apenas um país-membro da organização pode tomar essa decisão.
Pouco antes de Delcy falar ao Conselho Permanente, a assessoria jurídica de Almagro divulgou estudo no qual sustentou que o secretário-geral tem o poder de pedir a aplicação da Carta, caso haja “alteração da ordem constitucional que afete gravemente e ordem democrática”. Para prosperar, a medida precisa do apoio de 18 governos - a OEA tem 35 integrantes. A eventual suspensão do país só ocorre com dois terços dos votos da Assembleia Geral, que reúne os chanceleres.
Caso Almagro decida invocar a Carta Democrática, é pouco provável que consiga apoio suficiente para aplicá-la contra a Venezuela, avaliam fontes da OEA. Para elas, o cenário poderia mudar com o eventual governo do vice brasileiro Michel Temer, que deve ser menos conciliador em relação a Maduro. A chegada de Mauricio Macri à presidência da Argentina criou a expectativa de que sua gestão seria favorável à aplicação da Carta Democrática no caso da Venezuela. Durante sua campanha, ele defendeu essa medida no âmbito do Mercosul. Nesta quita, no entanto, a ministra das Relações Exteriores do país, Susana Malcorra, declarou que é “precipitado” invocar o documento.
Resistência. A representante de Caracas deixou claro que seu governo não aceita qualquer ação da OEA. “Não viemos aqui em busca de soluções”, declarou. “Viemos denunciar a gravidade de que outro Estado membro pretenda derrocar um governo que é a expressão da vontade popular.”
Durante sua intervenção, o representante do Brasil, José Luiz Machado e Costa, defendeu o diálogo e o respeito ao Estado de Direito e à vontade popular, sem fazer referência à Carta Democrática Interamericana.
Almagro não se manifestou durante a sessão e o papel de contraponto à Venezuela foi desempenhado pelo representante interino dos EUA, Michael Fitzpatrick. “Se a OEA não falar agora, quando o fará?”, perguntou. “A prisão de apenas um indivíduo em razão de suas convicções políticas deveria despertar grande preocupação da comunidade democrática interamericana.” No documento que entregaram a Almagro, parlamentares de oposição a Maduro afirmaram que há 115 presos políticos no país. Também denunciaram a falta de independência dos Poderes e a escassez de alimentos e remédios.
O porta-voz de Almagro, Sergio Jellinek, disse que o secretário-geral está analisando as informações apresentadas pelos deputados e pedirá a aplicação da Carta Democrática caso conclua que seus princípios foram desrespeitados. “O secretário não faz um cálculo com base no número de votos”, afirmou. Essa seria a primeira vez em que o documento seria invocado contra um governo em exercício. A carta foi aplicada uma única vez, em 2009, quando houve golpe de Estado em Honduras. Almagro se distingue de seus antecessores por expressar posições pessoais em relação a várias questões da região, incluindo críticas ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.