ATLANTA - Quando Kamala Harris foi escolhida por Joe Biden como parceira de chapa, a coreógrafa Maisha Land, de 46 anos, reuniu um grupo de mulheres para mobilizar eleitores este ano. Ela e Kamala têm algo em comum: as duas pertencem à mesma irmandade – tipo de associação tradicional de mulheres nas universidades americanas, com especial força entre as negras.
Desde o século 18, os estudantes de universidades nos EUA começaram a se organizar em associações. Para fazer parte das fraternidades, os alunos pagam e dedicam parte do tempo às atividades do grupo. Em troca, têm acesso a uma rede de apoio e, em alguns casos, moradia durante a vida universitária. Mas mulheres e negros estavam excluídos de boa parte das associações.
Em 1850, elas começaram a criar as próprias fraternidades, que receberam o nome de irmandades, em uma época em que as mulheres eram minoria no ensino superior. Em 1906, foi a vez de alunos negros criarem sua primeira organização e, dois anos depois, foi fundada a primeira irmandade de alunas negras, a Alpha Kappa Alpha (AKA), da qual Maisha e Kamala fazem parte.
“Família é minha amada Alpha Kappa Alpha, nossos Nove Divinos, e meus irmãos e irmãs de HBCU (sigla para universidades historicamente negras nos EUA)”, disse Kamala, em discurso no qual aceitou a indicação a vice. Ela entrou na AKA durante os estudos na Howard University, em 1986, e é hoje uma das 300 mil integrantes do grupo.
As nove fraternidades e irmandades de negros mais relevantes nos EUA são conhecidas como “Nove Divinos”, ou apenas D9, e reúnem cerca de 1 milhão de pessoas. O poder informal exercido por esses grupos é visto como um motor na campanha de Biden.
Dona de um estúdio de dança em Atlanta, Maisha Land decidiu organizar mulheres para criar um vídeo que estimule os eleitores a votar. “Essas organizações estão focadas no serviço à comunidade e na promoção de mulheres e comunidades negras em todo o mundo. Queremos encorajar os membros da comunidade a sair e votar. É isso que estamos fazendo”, afirma Maisha.
Nascidas da exclusão, as organizações de alunos e alunas negros passaram a estar diretamente ligadas aos movimentos pelos direitos civis americanos. Desde a escolha de Kamala para a chapa presidencial, o Comitê Nacional Democrata começou a receber doações com o mesmo valor: US$ 19,08. O número é a referência ao ano de criação da AKA, 1908. Segundo o jornal The Washington Post, até o início de outubro os democratas haviam recebido mais de 14 mil doações neste valor, com total aproximado de US$ 275 mil das "irmãs" de Kamala.
Primeira mulher negra a concorrer à vice-presidência por um grande partido nos EUA, Kamala tem usado a ligação com o movimento negro desde a universidade como um ativo de campanha. Na sexta-feira, em campanha na Geórgia, a candidata a vice democrata se reuniu com 17 líderes de HBCU, a reunião de universidades criadas para negros na época que leis de segregação racial limitavam o acesso superior aos brancos.
Um dos problemas dos democratas em 2016 foi a queda no comparecimento dos eleitores negros nas urnas. Neste ano, a campanha de Biden precisa garantir maior apoio dos negros. Maisha Land diz que as organizações são apartidárias. "Nosso trabalho é garantir que nossas comunidades estejam engajadas", afirma Maisha, mas emenda:"Se estamos orgulhosas de ter uma integrante concorrendo? Absolutamente."