Vitória serve de teste para rivais de Chávez

Apresentação de um modelo alternativo e viável de gestão é o grande desafio da oposição, afirmam analistas

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Por Ruth Costas
Atualização:

Até o fim de semana, ser oposição na maior parte da Venezuela significava apenas atacar os projetos do presidente Hugo Chávez. Ou seja, falar muito, mas não fazer nada. Agora, à frente de Estados onde está concentrada quase metade da população e 70% da atividade econômica do país, os adversários de Chávez terão o desafio de mostrar que têm um modelo de gestão viável, alternativo ao "socialismo bolivariano" do presidente. Ouça a análise de especialistas sobre as eleições "Trata-se de uma mudança radical no mapa político venezuelano, apesar de Chávez ter obtido uma votação muito grande", disse ao Estado Luis Vicente León, diretor do Instituto de Pesquisas Datanálise, lembrando que os opositores não têm nenhum assento na Assembléia Legislativa (eles boicotaram as eleições de 2005). "A vitória de adversários de Chávez em Estados e prefeituras importantes derrubou o mito de que não existe uma liderança alternativa à do presidente." A oportunidade é grande. Se forem identificados com melhorias em setores como saúde, educação e segurança em Estados e municípios populosos, os opositores podem ganhar espaço na política nacional e chances maiores na disputa pela Assembléia Legislativa em 2010. León diz ser particularmente importante o caso de Sucre, um dos quatro municípios de Caracas, em que o candidato chavista, o ex-ministro das Comunicações Jesse Chacón, foi derrotado. É lá que fica o Petare, um dos maiores e mais violentos complexos de favelas da América Latina, que já foi conhecido como um dos principais redutos de Chávez. Surpreendentemente, o candidato vencedor foi Carlos Ocariz, um engenheiro jovem, que estudou fora do país e chegou a trabalhar no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Washington. "A vitória de Ocariz derrubou outros dois mitos. Primeiro, que só Chávez pode vencer em bairros pobres. Depois, que a disputa política na Venezuela é apenas uma luta de classes entre pobres, que apoiariam a revolução, e ricos, que são oposição", diz León. "A sua gestão terá o desafio de consolidar essa mudança." É claro que uma reação agressiva do presidente a derrotas simbólicas como essa pode ser um obstáculo a mais para ser superado por seus adversários. Durante a campanha, Chávez ameaçou militarizar e cortar o repasse de recursos para Estados em que a oposição vencesse. Apesar de ter voltado atrás e adotado um tom um pouco mais conciliador, é difícil prever quanto tempo esse "Chávez moderado" durará. "O presidente também conteve seu discurso após perder o referendo constitucional de dezembro, quando anunciou uma revisão de seu projeto revolucionário", lembra a cientista política Elsa Cardozo, da Universidade Central da Venezuela. "Meses depois, ele aprovou por decreto um pacote de 26 leis que continham muitas das mudanças incluídas no referendo. Dessa vez, também deve ser um recuo tático." Elsa lembra que entre essas 26 leis aprovadas em julho há uma que prevê uma "nova geografia do poder no país", permitindo ao Executivo agrupar os Estados em macrorregiões cujos recursos e administração seriam entregues a autoridades indicadas diretamente pelo presidente. "Essas eleições abrem uma excelente oportunidade para Chávez dialogar com a oposição e encontrar saídas conjuntas para problemas que castigam os venezuelanos: inflação, violência e crise econômica", diz a analista. "Mas, com tantos sinais de que o presidente está pouco disposto a dividir o poder, não excluo um cenário de confronto entre o governo e as regiões. Chávez tem nessa lei os instrumentos que lhe permitiriam reduzir o peso desse avanço opositor."

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