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O mal de Alzheimer pode ser previsto por meio de textos escritos

Pesquisadores da IBM treinaram inteligência artificial para captar indícios de mudanças na linguagem antes do aparecimento de doenças neurológicas

Por Gina Kolata
Atualização:

Será possível prever quem desenvolverá o mal de Alzheimer simplesmente observando padrões de escrita, anos antes do aparecimento dos sintomas? Segundo um novo estudo de pesquisadores da IBM, a resposta é sim.

Eles e outros acrescentam ainda que o mal de Alzheimer é apenas o começo. Pessoas com uma grande variedade de problemas neurológicos têm diferentes padrões de linguagem que, suspeitam os investigadores, podem servir como sinais de alerta de suas doenças.

Pesquisadores acompanham pessoas mais velhas para tentarverificar sinais precoces de futuras doenças degenarativas, como oAlzheimer. Foto: Gerd Altmann via Pixabay

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Para o estudo sobre o Alzheimer, os pesquisadores observaram um grupo de 80 homens e mulheres com mais de 80 anos – a metade deles tinha Alzheimer e os outros não. Mas sete anos e meio antes, todas estas pessoas eram normais do ponto de vista cognitivo.

Os homens e mulheres participavam do Framingham Heart Study, uma iniciativa de pesquisa federal que, há vários anos, exige testes físicos e cognitivos regulares. Como parte da iniciativa, eles foram submetidos a um teste escrito antes que qualquer um deles desenvolvesse AlzheimerNele pede-se que os participantes descrevam o desenho de um menino que está em pé em cima de um banquinho pouco seguro procurando um jarro de biscoitos em uma prateleira alta enquanto uma mulher, de costas para ele, está desatenta, preocupada com uma pia que transborda.

Os pesquisadores examinaram o emprego das palavras pelos participantes com um programa de inteligência artificial que procurava diferenças sutis na linguagem. Ele identificou um grupo de candidatos mais repetitivos em seu uso da linguagem em uma época anterior quando todos eles eram normais do ponto de vista cognitivo. Estes sujeitos também cometeram erros, como erros ortográficos ou o uso inapropriado da letra maiúsculas, e usaram uma linguagem telegráfica, o que significa uma linguagem que tem uma estrutura gramatical simples que carece de sujeitos e de palavras como “o”, “é” e “são”.

Foram os integrantes do grupo que desenvolveram o mal de Alzheimer.

O programa de IA previu com 75% de precisão quem teria a doença, segundo resultados publicados na revista ECinicalMedicine da Lancet.

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“Nós não trabalhamos com nenhum pressuposto de que o emprego das palavras mostraria alguma coisa”, disse Ajay Royyuru, vice-presidente de assistência médica e pesquisa nas ciências da saúde no Thomas J. Watson Research Center da IBM, em Yorktown Heights, Nova York, onde foi realizada a análise pela IA.

Os pesquisadores do Alzheimer ficaram intrigados, afirmando que quando existir maneiras de frear ou parar a doença – objetivo que até momento continua fugidio – será importante ter testes simples que possam alertar de antemão que sem uma intervenção uma pessoa desenvolverá uma doença cerebral.

“O que está acontecendo aqui é algo muito inteligente”, disse Jason Karlawish, pesquisador do Alzheimer da Universidade da Pensilvânia. “Considerando um grande volume de comunicações, faladas ou escritas, teremos condições de extrair algum sinal?”

Há anos, os pesquisadores vêm analisando mudanças no discurso e na voz em pessoas que têm sintomas de doenças neurológicas – Alzheimer, esclerose lateral amiotrófica, demência frontotemporal, Parkinson, doenças bipolares, esquizofrenia, entre outras.

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Mas, afirmou Michael Weiner, que pesquisa o Alzheimer na Universidade da Califórnia em San Francisco, o relatório da IBM é pioneiro. “Este é o primeiro estudo que eu tenha visto que pegou pessoas completamente normais e previu com certa precisão, qual delas teria problemas anos mais tarde”, afirmou.

Espera-se que seja possível estender o trabalho sobre o Alzheimer para descobrir mudanças sutis no uso da linguagem por pessoas sem qualquer sintoma óbvio, mas que continuarão desenvolvendo outras doenças neurológicas.

Cada doença neurológica produz mudanças peculiares na fala, que provavelmente ocorrem muito antes do momento do diagnóstico, disse Murray Grossman, professor de neurologia na Penn e diretor do centro de demência frontotemporal da universidade.

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Ele se dedica ao estudo da fala de pacientes com uma forma de demência frontotemporal comportamental, distúrbio causado pela perda progressiva de nervos nos lobos frontais do cérebro. Estes pacientes apresentam apatia e declínio no julgamento, autocontrole, e empatia que se revelou difícil de quantificar objetivamente.

O discurso é diferente, disse Grossman, porque as mudanças podem ser medidas.

Na instalação da doença, ocorrem mudanças no ritmo da fala dos pacientes, com pausas distribuídas aparentemente ao acaso. Mudanças no emprego das palavras também – os pacientes usam  menos termos abstratos.

Estas alterações estão diretamente ligadas a mudanças nas partes frontotemporais do cérebro, segundo Grossman. E elas parecem ser universais, não exclusivas da língua inglesa.

Adam Boxer, diretor da unidade de pesquisa clínica de neurociências da UC de São Francisco, também está estudando a demência frontotemporal. A sua ferramenta é um aplicativo de smartphone. Os seus pacientes são pessoas saudáveis que herdaram uma predisposição genética a desenvolver a doença. O seu método é mostrar aos pacientes uma imagem e pedir que eles gravem uma descrição do que estão vendo.

“Nós queremos medir mudanças muito precoces, de cinco a dez anos antes deles apresentarem os sintomas”, afirmou. “A coisa boa a respeito dos smartphones é que você pode fazer tudo o que quiser”.

Os pesquisadores podem pedir às pessoas que falem por um minuto sobre algo que aconteceu naquele dia, ou repetir sons como tatatatata. Boxer disse que ele e outros se concentraram no discurso porque queriam testes não invasivos, e baratos. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

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