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Artefatos de um navio dão pistas para solucionar um mistério  

Parte da investigação se dedicará a desvendar como era a vida dos membros da tripulação que enfrentaram a própria morte sob condições extremas

Por Christine Hauser
Atualização:

Um mata-borrão com impressão digital, uma escova emaranhada com mechas de cabelo e um conjunto de dragonas de tenentes. Estes são alguns dos cerca de 350 artefatos que recentemente foram retirados das fendas e cabines afundadas do H.M.S. Erebus, um dos dois navios que desapareceram depois de partirem da Inglaterra há mais de 170 anos, em busca de uma passagem pelo noroeste do Ártico canadense.

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O desaparecimento do Erebus e do H.M.S. Terror ainda é um mistério, parte de uma história que escapa a cientistas e historiadores há mais de um século. Em 20 de fevereiro, o Parks Canada, o serviço nacional de parques canadenses, e representantes da população inuíte disseram esperar que os artefatos recém-recuperados do Erebus os ajudassem a reconstituir o que aconteceu a bordo dos navios antes de afundarem.

Parte da investigação se dedicará a desvendar como era a vida dos membros da tripulação que enfrentaram a própria morte sob condições extremas, disse Ryan Harris, arqueólogo subaquático e diretor de projetos do Parks Canada. “Como eram suas vidas em um navio de exploração, ao longo de três, quatro anos de jornada?”, disse ele. “Eles veem seus companheiros caírem e sabem que nunca mais voltarão para casa”.

Uma barcaça acima do H.M.S. Erebus, um navio inglês que desapareceu no Ártico canadense nos anos 1800 Foto: Parks Canada Agency

O desaparecimento dos navios cativou historiadores e cientistas e atraiu muitas missões de busca ao longo de um século e meio. Os navios partiram da Inglaterra em uma manhã de maio de 1845, com um gato, um cachorro chamado Netuno e um macaco chamado Jacko, de acordo com o livro de 2017 Ice Ghosts (Fantasmas de gelo, em tradução livre) de Paul Watson, que documenta a história da expedição. Sob o comando do explorador Sir John Franklin, seu objetivo era traçar uma passagem pelo noroeste para a Índia e a China.

Em 1846, depois que a expedição partiu para o arquipélago ártico do Canadá, os navios ficaram presos no gelo da Ilha King William. Em 1847, Franklin morreu e, em 1850, a Marinha Real Britânica iniciou uma busca pelos navios, escreveu Watson. Os 129 marinheiros morreram e os navios foram levados para suas sepulturas congeladas.

Em 1858, uma equipe de busca encontrou dois bilhetes deixados pela tripulação, descrevendo como os navios ficaram presos no gelo, a morte de Franklin e os planos de chegar a um posto comercial na Baía do Hudson. Mas os destroços ficaram em silêncio por mais de um século, até 2014, quando um veículo subaquático controlado por controle remoto vislumbrou a silhueta do Erebus perto da Ilha King William, no território Nunavut – local onde os inuítes, nativos da região, há muito tempo dizem que os navios foram esmagados pelo gelo marinho.

Em 2016, a pista de um caçador inuíte levou à descoberta do H.M.S. Terror. No ano passado, o Parks Canada e os inuítes enviaram uma equipe subaquática ao local do Terror, para mapear os destroços, registrando em vídeo um passeio fantasmagórico pelo convés do navio: garrafas e pratos decorados nas prateleiras, camas e outros móveis, tudo congelado no tempo.

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As explorações do Terror ainda não começaram. Na mais recente exploração do Erebus, em agosto e setembro, as equipes examinaram áreas do navio que prometiam render alguns artefatos, como os alojamentos dos oficiais, a despensa, cabines e baús. A equipe ficou intrigada com uma descoberta em particular: um acordeão. “Você sempre se depara com achados que surpreendem”, disse Marc-André Bernier, gerente da equipe de arqueologia subaquática do Parks Canada. “Faz sentido ter um acordeão no navio – era parte do entretenimento nas longas noites de inverno”.

Os itens que vieram à superfície do Erebus podem sinalizar uma virada na compreensão sobre os últimos e desastrosos meses do navio, disse John G. Geiger, chefe da Real Sociedade Canadense de Geografia. “Os navios são um incrível armazém de informações”, disse ele.

“Tudo o que havia sido encontrado até então eram os itens que os homens carregaram em uma espécie de marcha fúnebre, que eles quiseram levar consigo. Existe a promessa, a esperança, de encontrar documentos escritos sobre o que aconteceu”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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