Benedict Cumberbatch risca o último papel da sua lista de sonhos

Série ‘Patrick Melrose’ acompanha inglês da alta sociedade em uma jornada de superação

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Por Jennifer Schuessler
Atualização:

Faltavam poucas horas para a estreia de "Os Vingadores: Guerra Infinita", da Marvel, no final do mês passado, e Benedict Cumberbatch não estava disposto a violar a proibição de spoilers imposta pelo estúdio a respeito do penúltimo capítulo da franquia de filmes mais lucrativa de todos os tempos.

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“Não me pergunte”, ele disse, respondendo a uma brincadeira sobre seu papel como Doutor Estranho. 

“Tudo o que posso lhe dar é uma ótima receita de Aperol spritz”.

Mas Cumberbatch ficou feliz ao falar sobre outro complexo trabalho de narrativa em série que chegou às telas nesta primavera - um trabalho que também mobiliza uma legião de aficionados e o apresenta como um homem extraordinariamente inteligente lutando contra forças obscuras (embora armado apenas com inteligência afiada e insuperável ironia, e não com círculos mágicos).

‘Patrick Melrose’, série em cinco capítulos que estreou no Showtime este mês, é baseada em cinco romances autobiográficos do escritor britânico Edward St. Aubyn, cuja prosa primorosa e sutil capacidade de retratar a realidade lhes renderam verdadeira devoção por parte dos admiradores. 

Publicados entre 1992 e 2011, os volumes seguem um inglês da alta sociedade por 40 anos de uma jornada de superação de horríveis abusos da infância, dos vícios e do excruciante esnobismo de seu meio.

Tudo bem, pode ser que Patrick não consiga superar essa última aflição, como notaram alguns dissidentes da reverência que gira em torno do universo de St. Aubyn. Mas Cumberbatch tem pouca paciência com aqueles que ficam batendo nessa tecla.

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Mesmo que a série revele seu melhor em seus personagens glamorosos, a campanha publicitária se apoia em temas “relacionáveis”, como família, trauma, vício, superação e perdão.

“Não acho que o esnobismo, a autodepreciação, o cinismo e a hipocrisia sejam exclusivos dessa classe”, disse Cumberbatch, formado em Harrow (e bisneto do cônsul-geral da Rainha Vitória na Turquia e no Líbano). O que os romances de St. Aubyn fazem, “com grande humor e dolorosos insights, é expor os extremos da condição humana”.

Benedict Cumberbatch, de 41 anos: uma carreira que se alterna entre blockbusters e filmes de arte.(Harry Eelman/The New York Times) Foto: Harry Eelman para The New York Times

O alter-ego literário de St. Aubyn era o papel dos sonhos de Cumberbatch, que desde a chegada à fama com ‘Sherlock’, da BBC, vem alternando sucessos de bilheteria (‘Star Trek: Além da Escuridão’, o próximo ‘The Grinch’ do Dr. Seuss) com projetos mais artísticos, como "O Jogo da Imitação" e a recente adaptação televisiva do romance de Ian McEwan, "A criança no tempo".

Em uma entrevista ao Reddit, em 2013, ele disse que Patrick Melrose era o personagem literário que ele mais gostaria de interpretar. O comentário chegou ao Twitter, e logo depois ele recebeu um telefonema dos produtores Michael Jackson e Rachael Horovitz, que haviam adquirido os direitos dos romances e estavam trabalhando com o roteirista e romancista David Nicholls (‘Longe Deste Insensato Mundo’).

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O outro papel na lista dos sonhos de Cumberbatch, disse ele, era Hamlet - personagem que compartilha com Patrick o brilhantismo, a arrogância, a inteligência, a crueldade, a autodestruição e os problemas de relacionamento com o pai.

O pai de Hamlet “era um homem frio, alguém muito distante e difícil de amar”, disse ele. E, assim como acontece com Patrick, “é o desfazer do mito do pai que traz Hamlet para um relacionamento mais afetuoso” com o mundo.

Cumberbatch interpretou Hamlet em Londres, no ano de 2015, em uma produção que teve ingressos esgotados quase instantaneamente e gerou o frenesi que nunca mais deixou de cercar essa estrela de 41 anos.

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Embora o papel parecesse inevitável, o caminho que o levou até Patrick Melrose foi mais incerto. Jackson disse que ganhou o primeiro romance de um amigo em comum dele e de St. Aubyn. Os romances de St. Aubyn têm enredos sensuais e diálogos afiados, mas foi necessário o último capítulo, “At Last” [Enfim], para convencer Jackson de que uma adaptação seria possível. “Só então você realmente consegue seguir a causa até o efeito, da infância por um longo de um período de tempo, que é o formato clássico da televisão”, disse ele.

Cada episódio, como quatro dos romances, acontece em um dia único e crucial da vida de Patrick.

O primeiro episódio, o bizarramente cômico “Bad News” [Má notícia], no qual Patrick visita Nova York para pegar as cinzas de seu pai e encher a cara, soa como um sofisticado ‘Trainspotting’, cheio de alucinações e pelo menos uma indelével cena de banheiro. O segundo, “Never Mind” [Deixa pra lá], volta para um dia particularmente apavorante da infância de Patrick na casa da família Melrose no sul da França, culminando com um jantar de diálogos tão viciosos que quase envenenam a comida.

Cumberbatch disse que espera que a humanidade dos personagens guie as pessoas em meio à escuridão da história. “O que Patrick está enfrentando como personagem, a mudança definitiva, é abandonar o fantasma de seu pai”, disse. “Ele se comporta de maneira abominável, mas está evoluindo, deixando de ser uma vítima para se tornar um sobrevivente”.

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