Contra a solidão, caminhoneiros levam seus pets para a estrada nos EUA

Muitos caminhoneiros contam com a companhia de cachorros, gatos, pássaros, porquinhos, ou até mesmo um porco-espinho

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Por Jim Motavalli
Atualização:

Ela pode estar sozinha na estrada, mas Rebecca Washington motorista de caminhão que percorre longas distâncias e às vezes fica meses longe de casa, tem sempre ao seu lado Ziggy, Polly, Junior e Tucker – os seus “rig pets” (animais adotados por caminhoneiros que os levam em suas viagens).

“As pessoas dizem que viajo com um zoo itinerante”, disse ela.

Rebecca Washington com Ziggy, seu companheiro de estradas. Foto: Anna Ottum/The New York Times

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“Ficamos longe das nossas famílias por muito tempo”, acrescentou Rebecca, que vive em Springfield, Missouri, e cujos filhos já cresceram e já têm seus filhos. “Os animais são uma boa companhia e caminhar com meus cães quando faço uma parada é uma boa maneira de perder peso e me manter saudável. Eu saio com dois de cada vez. É uma rotina”.

As empresas de transporte de longa distância não se queixam dos pets e algumas até incentivam, porque quanto mais felizes estão seus motoristas mais provável que continuem no trabalho. A escassez de motoristas de caminhão em todo o país é aguda e o coronavírus só piorou a situação.

“O volume de frete retornou aos níveis de antes da pandemia”, disse Avery Vise, vice-presidente da FTR Transportation Intelligence. Mas o número de caminhoneiros ainda está 3,2% abaixo do registrado em fevereiro do ano passado e o setor só conseguiu preencher metade das vagas que perdeu. Há muita pressão no sistema”.

Viajar com pets é muito comum no caso dos caminhoneiros, disse Vise. A revista FleetOwner reportou em 2013 que mais de 60% deles tinham um pet – com 40% levando seus animais de estimação em suas viagens.

Esses números ainda persistem, disse Wendy Miller, editora do jornal e website The Trucker.

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“Dos caminhoneiros que entrevistei”, disse ela, “diria que a vasta maioria possui pets e muitos os levam nas viagens”. Os motoristas que são proprietários dos caminhões têm mais liberdade para levar junto com eles seu melhor amigo, disse ela. 

Rebecca Washington, motorista de caminhão que percorre longas distâncias,às vezes fica meses longe de casa, mas tem sempre ao seu lado Ziggy, Polly, Junior e Tucker. Foto: Anna Ottum/The New York Times

Indagado se existem algumas regras no tocante a pets à bordo de caminhões que trafegam pelos Estados, Duane DeBruybe, porta-voz da Federal Motor Carrier Safety Administration, respondeu que não. Mas algumas empresas de transporte impõem limites de peso para os animais ou proíbem determinadas raças. Outras exigem um depósito para cobrir possíveis danos aos caminhões da empresa.

Washington, que trabalha para a empresa Road Legends e é uma ávida participante de um grupo no Facebook chamado Trucking Fur Babies, deparou com caminhões enormes com os motoristas tendo ao lado macacos, porquinhos, papagaios e outros à bordo. “Uma senhora tinha um porco-espinho”, disse ela.

Também é o caso de Sarah Giles, 27 anos, de Breckenridge, Texas. Ela é motorista da All Freight Carriers e sempre leva consigo dois cães, e até recentemente levava também seis periquitos.

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“São pássaros pequenos divertidos – cada um tem sua própria personalidade e excentricidades”, disse ela, que construiu um trepa-trepa para eles.

Infelizmente os periquitos descobriram algumas rotas de fuga perigosas e ela os levou de volta para casa e trouxe então Bonnie, um periquito maior e com bochechas verdes.

Os trajetos de Giles na maior parte são longos na Costa Leste. “Dirigir é fácil – o pior é o aspecto mental. Você está sozinho durante longos períodos e ter uma companhia ajuda. Um pouco de felicidade ajuda a continuar a viagem”. Ela disse que os cães também são uma boa proteção para uma mulher sozinha na estrada.

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Sarah Giles com seu cachorro, Caco, e Bonnie, um periquito conure de bochechas verdes, na cabine de sua caminhonete. Foto: Allison V. Smith/The New York Times

Pets fazem parte do cenário mesmo quando maridos e esposas viajam juntos. Austin e Krystal Martin são do Texas, mas estão na estrada a maior parte do tempo, conduzindo o caminhão Freightliner Cascadia para a FedEx Custom Critical quase cinco mil quilômetros por semana – atualmente transportando vacinas contra a covid-19 – ao lado uma gata, que se dava bem com Chassis, uma terrier que já fazia parte da tripulação.

“Ela morreu em Memphis, disse Austin Martin, 42 anos, observando que o casal recebeu 300 a 400 mensagens de condolências de outros caminhoneiros.

Embora viajem juntos “quando estou acordada, Austin está dormindo”, disse Krystal Martin, 50 anos. “Os animais são um grande apoio emocional. Eu dirijo durante a noite e, às vezes, quando chego numa cidade grande, fico inquieta e Clutch sabe que estou nervosa – ela salta no meu colo para ser acariciada”.

Jennifer Hancock, de Madisonville, Kentucky, também viaja com um gatinho chamado Sheldon. “O apelido dele é Mudflap (paralama) porque quando eu a levo na coleira para caminhar em alguma área de descanso ela cheira todos os paralamas dos trailers. No terminal de carga, todos a conhecem”.

Bonnie, um periquito conure de bochechas verdes, na cabine do caminhão de Sarah Giles em Breckenridge, Texas. Foto: Allison V. Smith/The New York Times

Kelly e Robyn Brunson, de Tooele, Utah, dirigem o Peterbilt 389 de sua propriedade e trabalham para a Godfrey Trucking, e dividem o espaço no caminhão com Truffles, uma porquinha de raça americana.

“Nós a escolhemos para viajar no caminhão porque ela é limpa e não cheira mal, disse Kelly.

“Os empregados e motoristas adoram a Truffles. Ela acorda todas as manhãs às oito horas para o seu café da manhã, composto de ração e frutas. E vai conosco a todos os lugares”.

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Convencer os abrigos e centros de resgate de pets a permitirem que caminhoneiros adotem animais é um obstáculo maior do que conseguir que as empresas de transporte permitam esses companheiros, disse Shannon Ashley, também motorista da FedEx Custom Critical.

“Tivemos de ir a uma dezena de abrigos diferentes e fazer o pedido, mas a resposta foi não. Tínhamos de viver dentro de tantos quilômetros de distância da organização. Não temos uma casa. Nosso caminhão é a nossa casa”.

Jim Mason, membro da diretoria da fundação Two Mauds, que faz doações para abrigos de animais, ecoou esse sentimento. “Não são todos assim exigentes, mas alguns são tão rigorosos que ninguém é bom o bastante para adotar seus animais”.

Discriminar os caminhoneiros é um equívoco, disse Mason, “porque os cães querem estar na companhia de humanos o máximo possível”. “Nada os deixa mais felizes. É muito melhor para um cão do que ficar fechado em casa enquanto seu proprietário está no trabalho”. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

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