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Com coronavírus, apresentações musicais migram para o mundo virtual

Um quarteto de cordas se apresentou no dia 2 de março diante de uma plateia vazia na casa de ópera La Fenice, em Veneza; o concerto foi transmitido ao vivo no YouTube

Por Michael Cooper e Alex Marshall
Atualização:

A bela casa de ópera de Veneza, La Fenice, sobreviveu às enchentes e foi reconstruída depois de incêndios devastadores. Assim, o estabelecimento estava determinado a seguir funcionando depois que o coronavírus obrigou o cancelamento das apresentações: no dia 2 de março, um quarteto de cordas se reuniu no teatro vazio e estranhamente silencioso para tocar uma peça de Beethoven, transmitindo o concerto ao vivo e conquistando uma salva de aplausos com emojis. O gerente geral da companhia, Fortunato Ortombina, disse que a ideia do concerto virtual era mandar um recado: “Ainda tocamos aqui".

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Ainda que o coronavírus tenha causado um forte impacto no mundo da arte, com estabelecimentos fechados e eventos cancelados, a situação também inspirou muita criatividade entre aqueles que acreditam que o espetáculo deve continuar em algumas das regiões mais afetadas, e as organizações tentaram se adaptar.

A epidemia obrigou a Orquestra Sinfônica de Xangai a cancelar todas as apresentações em fevereiro e março, deixando os músicos trabalhando em casa, o que os levou a publicar aulas em sua página do WeChat, além de vídeos informais mostrando os músicos ensaiando em casa e listas de músicas destinadas a ajudar as pessoas sob quarentena a “afastar o tédio em casa".

“Com todos mantidos em casa por tanto tempo, pensamos em criar algo para os jovens, para os estudantes interessados em aprender instrumentos musicais", disse Hao Jie, principal trombonista da orquestra. Os vídeos se mostraram populares, com centenas de milhares de visualizações. “O público adora", disse ele. 

Música pop

O mundo do pop também foi duramente afetado. Quando os superastros do conjunto de K-pop BTS lançaram seu mais recente álbum no mês passado, a epidemia os levou a repensar a entrevista coletiva planejada. “Decidimos realizar a entrevista coletiva sem a presença da mídia", anunciaram eles antes de começarem a transmissão ao vivo pela internet. Mesmo sem os repórteres, centenas de milhares de fãs assistiram à transmissão.

Uma atitude que diz que o show deve continuar, com vídeos e transmissões ao vivo. Foto: Orquestra Sinfõnica de Xangai

Na Suíça, uma apresentação da ópera Salomé, de Richard Strauss, no Teatro de Lucerna, quase foi cancelada quando a Orquestra Sinfônica de Lucerna recebeu ordens de permanecer em quarentena. O teatro procurou um pianista solo para tocar uma versão da peça, composta para as maiores orquestras da ópera, envolvendo frequentemente mais de 100 músicos. “Tínhamos um público esgotado e, por isso, o intendente do teatro me telefonou às 9 da manhã pedindo que eu tocasse", disse Valeria Polunina, diretora do corpo de músicos.

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Valeria conhecia bem a peça para piano, mas temeu não fazer jus à obra naquela noite. Quando recebeu outro telefonema dizendo que a apresentação não aconteceria sem ela, concordou em participar. “Foi uma aventura", disse ela, calculando ter tocado por mais de 10 horas seguidas entre os ensaios do dia e a apresentação à noite. “Não havia um só lugar vazio, e eles gostaram muito da apresentação, sabendo que tudo estava fechado.”

Na televisão

Até a televisão está se ajustando ao coronavírus. Em muitos programas, o público ao vivo foi vetado. Um reality show musical na China chamado Cantor, que tinha candidatos se apresentando diante do público e dos jurados ao vivo transmitiu recentemente um episódio no qual os jurados davam sua opinião telefonando de casa, de acordo com a BBC. E alguns programas de entrevistas são transmitidos de casa via streaming.

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Em Veneza, onde o Quartetto Dafne, composto por membros da orquestra do teatro de ópera, tocaram obras de Beethoven e Borodin diante de uma plateia vazia no auditório rococó do La Fenice em apresentação transmitida pela internet, foi estranho ver os músicos entrando em silêncio e agradecendo em silêncio (um dos espectadores se manteve fiel à etiqueta das apresentações de música clássica, comentando “Shhhhh” enquanto outros espectadores publicavam mensagens).

Ortombina, gerente-geral da companhia, disse que seu medo era perder o relacionamento do teatro com o público. “Quando cancelamos uma noite que já está com ingressos esgotados o resultado é um desastre", disse ele. “Do ponto de vista musical, econômico e humano.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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