Dando mais sabor à comida de um hospital

O chef Patrick Wodni conta como transformou a culinária de uma instituição de saúde na Alemanha

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Por Sally McGrane
Atualização:

BERLIM - Com a habilidade de um chef de restaurante merecedor das estrelas do guia Michelin, Patrick Wodni logo reuniu os ingredientes de que precisaria para preparar o especial do dia, uma torta de cebolas. Mas, em vez de colocá-los em seu misturador de aço inox, ele despejou o creme azedo, os ovos, cominho, feno-grego, pimenta vermelha e açafrão-da-terra num recipiente de dimensões industriais e começou a bater a mistura com as mãos.

"Normalmente, provaríamos o prato com uma bela taça de Riesling", disse Wodni, 29 anos. "Infelizmente, estamos num hospital".

André Nagy e sua mulher, Kathleen Kuntzsch, escolheram o hospital Havelhöhe em parte porque a comida era saborosa. Foto: Gordon Welters para The New York Times

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Parte de um experimento incomum - que levou Wodni a abandonar seu emprego em um dos restaurantes mais badalados de Berlim para ter mais tempo para dedicar à iniciativa -, o hospital substituiu seus schnitzels padronizados por legumes orgânicos de cultivo local, carne de gado de pasto e peixes criados numa fazenda sustentável.

Muitos hospitais simplesmente requentam refeições congeladas trazidas de fora, mas Wodni mostrou que é possível melhorar a qualidade da comida servida nos hospitais e manter seu custo baixo. Ele espera que esse projeto seja um passo inicial na transformação da abordagem de instituições como escolas e hospitais para o preparo do alimento.

"Quando comecei, dei uma olhada no orçamento e disse, 'O que é possível fazer com os recursos de que dispomos?'", contou Wodni recentemente na cozinha do hospital. Fazendo uma pausa para morder uma cenoura cultivada numa fazenda orgânica comunitária das imediações, Wodni explicou que, seguindo o padrão da indústria, o hospital Havelhöhe gasta diariamente € 4,74 (cerca de US$ 5,50) por pessoa em alimentação.

O chef conta que não conseguiria comer direito gastando tão pouco. "Mas, se pensarmos no preparo de 500 refeições por dia, conseguimos aumentar a produtividade", explicou.

A primeira medida adotada por Wodni foi parar de encomendar as refeições da empresa que fornecia a maior parte da alimentação do hospital. "Era impossível dizer se aquilo era um picadinho ou um pedaço de borracha", disse ele.

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Em seguida, ele entrou em contato com agricultores orgânicos, padeiros, açougueiros e pesqueiros sustentáveis da região. Em questão de sete meses, o hospital passou de três fornecedores para seis fornecedores e nove produtores parceiros.

"Meu objetivo principal era criar um relacionamento comercial direto entre agricultores, granjeiros, padeiros e pescadores e o hospital", contou Wodni. "A parte mais importante do meu trabalho é identificar os fornecedores dos melhores ingredientes".

Wodni começou, então, a moer trigo-vermelho e centeio, além de fazer seu próprio queijo. "Fazemos a partir do zero tudo aquilo que podemos produzir", explicou. "Criar algo a partir do nosso interior é uma escolha".

Patrick Wodni, primeiro à esquerda, espera que suas refeições saudáveis preparadas com ingredientes locais possam inspirar outras instituições. Foto: Gordon Welters para The New York Times

Apontando para estudos que mostravam o impacto positivo de uma dieta saudável num quadro de diabetes e doença cardíaca, o gastroenterologista Harald Matthes, um dos diretores do hospital, descreveu Wodni como "uma pedra preciosa".

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André Nagy, cuja mulher, Kathleen Kuntzsch, estava amamentando a filha recém-nascida no hospital, concordou. Ele disse que o casal escolheu Havelhöhe em parte por causa da comida. "A alimentação é importante, estamos aqui para nos recuperarmos", disse Nagy.

Agora que o programa de alimentação saudável no Havelhöhe estava funcionando, Wodni disse que está se afastando das tarefas diárias na cozinha para assumir um papel de supervisor.

A ambição dele é levar essa reforma para além das paredes do hospital. Está consultando outras instituições públicas e se oferecendo para melhorar a qualidade do alimento servido.

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"Acho que sempre fui crítico à sociedade", refletiu Wodni durante uma breve pausa antes de ser chamado pela equipe da cozinha para ajudar no preparo do arroz. "Quando criamos uma demanda por bons produtos, o potencial de mudanças é imenso".

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