
20 de janeiro de 2020 | 06h00
COCODRIE, LOUSIANA - O laboratório marinho a cerca de 140 quilômetros a sudoeste de Nova Orleans foi projetado para ser uma fortaleza. Mas poderá ser derrotado pela mudança climática. Localizado no final da Rodovia Estatal 56 da Louisiana, onde o terreno se torna pântano e, em seguida se transforma no Golfo do México, o laboratório W.J. DeFeliced Marine Center suportou com sucesso muitos furacões desde a sua inauguração, em 1986. Construído cinco metros acima do solo sobre pilares, sua armadura chega a mais de 30 metros abaixo do solo. Suas paredes podem suportar ventos de até 400 quilômetros horários.
Mas a água está avançando. Nos Estados Unidos, de Nova Jersey ao Massachusetts, Virginia e Oregon, centros educacionais e laboratórios marinhos como este enfrentam a elevação dos níveis do mar e a mudança climática. O ataque do aquecimento global é mais lento, mas mais persistente do que qualquer tempestade. Ela ameaça a capacidade dos pesquisadores de estudarem os ambientes marinhos de perto em uma época em que é mais vital do que nunca compreendê-los.
Bob Cowen, diretor da Associação Nacional de Laboratórios Marinhos, considera a mudança climática uma grande ameaça, mas também uma oportunidade científica. “Nós a sofremos, e ao mesmo tempo a estudamos da melhor maneira possível”, afirmou. O estacionamento do Centro Marinho DeFelice, que faz parte de um consórcio, já foi uma área elevada e seca. Agora, ele inunda várias vezes ao ano, o que determina ocasionalmente o seu fechamento. As autoridades preveem que, se não forem tomadas as medidas necessárias, o laboratório poderá fechar vários dias seguidos todos os anos, nos próximos 10 a 15 anos.
A água salgada ataca a estrutura, e sobe através do solo penetrando nos cabos elétricos enterrados, e já causou um apagão. Certas inundações são acompanhadas por centenas de caranguejos violinistas que às vezes chegam até os elevadores. “Cheiram mal”, disse Murt Conover, diretora associada de educação e divulgação. “Alguns definiram o odor como cheiro de carniça. Carniça podre”.
“O edifício foi construído para funcionar lá onde o mundo termina”, disse Ursula Emery McClure, projetista sênior da firma de arquitetura Perking & Will e pesquisadora de arquitetura no centro marinho, “ não no mar aberto”. Alex Kolker, professor adjunto do consórcio marinho, afirma que, pelo fato de no sul da Louisiana a terra baixar enquanto os oceanos sobem, a região registra possivelmente a maior elevação do nível relativo do mar nos EUA.
Muitos laboratórios marinhos se preparam para enfrentar desafios semelhantes. Na Woods Hole Oceanographic Institution, em Massachusetts, Robert S.C. Munier, vice-presidente de laboratórios e operações marinhas disse que o complexo está sentindo os efeitos da mudança climática no ataque à doca atual.
A instituição planeja uma reforma da área da orla no valor de US$ 80 milhões, com docas mais elevadas e um complexo de edifícios adjacentes. Mas o planejamento é problemático, afirma Munier: segundo as projeções, a elevação do nível do mar poderá ser inferior a um metro nos próximos 50 anos, ou superior a um metro.
Em Nova Jersey, a Estação do Campo Marinho da Universidade Rutgers incluiu a mudança climática em seu plano de 30 anos como “um experimento de longo prazo para saber como as pessoas reagirão à urbanização desse trecho”, disse Oscar Schofield, diretor em exercício da estação do campo e presidente do Departamento de Ciências Marinhas e Costeiras da Rutgers. Ele afirmou que a elevação do nível do mar e o abaixamento da terra fazem com que a estrada até a estação inunde frequentemente com as marés altas.
Os diretores do laboratório na Louisiana planejam mantê-lo como está, apesar da inclinação dos pisos e da frequente inundação do estacionamento, a ponto de os gerentes discutirem a compra de um buggy próprio para circular nos pântanos, destinado ao transporte das pessoas até o local. Entre outras possibilidades estudadas, está o prolongamento de um deck, do centro até um estacionamento em terreno mais alto e mais próximo da estrada, que é ligeiramente mais alta.
A instalação já elevou a altura das docas para os dois navios de pesquisa e passou por uma reforma a fim de transferir o equipamento para os andares superiores. Segundo Kolker, que as futuras modificações da instalação incluem a incorporação de parte da infraestrutura usada nos terminais de petróleo em alto mar, como cabos elétricos resistentes à água salgada.
O consórcio está construindo também uma instalação adicional em um terreno mais elevado, a cerca de 50 quilômetros ao norte, na cidade de Houma, Louisiana, onde seria possível continuar as operações nos dias em que o centro DeFelice não pudesse ser utilizado. A arquiteta Ursula McClure disse que a invasão dos mares a inspirou a estudar o que fazer quando os edifícios são desativados com a chegada do oceano. Derrubar estas construções “custaria muito dinheiro”, ela afirmou. O pior, acrescentou, é quando olhamos ainda mais para frente: “O que acontecerá com comunidades inteiras?” / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.