John Steinbeck é mais conhecido por seus clássicos essencialmente americanos, como As vinhas da ira e A Leste do Eden. Mas um dos contos de sua autoria, que acaba de ser publicado em inglês, pela primeira vez, não fala de árduas jornadas nem da incomensurável crueldade humana. É uma história engraçada sobre um chef que tem um gato como companheiro na cozinha.
No período em que trabalhou em Paris, em meados do século passado, Steinbeck escreveu uma série de 17 contos para o jornal Le Figaro . Redigidos em inglês, posteriormente foram traduzidos para o francês. Um deles, um conto de ficção intitulado Ther Amiable Fleas, pode ser encontrado na última edição de The Strand Magazine, publicação trimestral sediada em Michigan. A revista já havia descoberto obras de Ernest Hemingway e Raymond Chandler.
Em 2014, publicou mais uma história de Steinbeck, desta vez para um programa patriótico de rádio durante a Segunda Guerra Mundial, que foi lida por Orson Welles em uma transmissão radiofônica em 1943. Andrew F. Gulli, editor-chefe da Strand, contratou um pesquisador para procurar no Harry Ransom Center uma coleção de manuscritos raros na Universidade do Texas em Austin. “Li este e pensei: ‘Meu Deus’”, espantou-se Gulli, referindo-se a The Amiable Fleas. E acrescentou: “Havia algo universal no gourmet, no gato, nos conflitos de família, na tensão”.
Enredo
Na história, na margem do Sena, há um restaurante fictício chamado The Amiable Flea. O local é dirigido por um chef, chamado Sr. Amité, que recebeu uma estrela Michelin e está ansioso por conquistar mais uma. “Ele fica muito nervoso por qualquer coisa”, lembrou Gulli. “Mas confia no gato para experimentar a comida, e acenar dando a sua aprovação ou desaprovação. O gato é magnífico, o seu nome é Apollo”.
No dia em que o inspetor da Michelin é esperado para jantar, há uma série de contratempos, e Amité acaba pisando no rabo de Apollo. O gato sai da cozinha aparentemente irritado. Com a saída de Apollo, a refeição é um desastre. Mas depois há um golpe de cena, uma segunda chance e a revelação de um ingrediente secreto.
'Cronista do sofrimento'
The Amiable Fleas pode parecer uma brincadeira para um escritor que se tornou famoso como cronista do sofrimento. Ocorre que a comédia era importante para Steinbeck, segundo Susan Shillinglaw, ex-diretora do Martha Heasley Cox Center for Steinbeck Studies, na San Jose State University, Califórnia. “Ele tinha um grande senso de humor”.
Os romances de Steinbeck dos anos 30, como Ratos e homens e As vinhas da ira, que recebeu o Prêmio Pulitzer de ficção, falavam das pessoas que lutavam na época da Depressão. Os anos 40 foram um período de transição. Steinbeck escreveu um relato de viagem, foi repórter de guerra por algum tempo e concluiu alguns romances. Casou-se pela última vez em 1950, publicou A Leste do Eden em 1952 e fez viagens frequentes com a esposa Elaine. Apesar de uma vida de profunda inquietação, o amor de Steinbeck por Paris era evidente, afirmou Shillinglaw. Quando escrevia para Le Figaro, em 1954, ela acrescentou: “provavelmente era um homem feliz”. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA