PUBLICIDADE

Memorial chama atenção para linchamento de negros que manchou história dos EUA

National Memorial for Peace and Justice foi recentemente inaugurado

Por Campbell Robertson
Atualização:

MONTGOMERY, Alabama - O Board of Pardons and Paroles do Alabama é uma entidade criada para as pessoas que foram consideradas culpadas pelos seus crimes e expressaram o seu remorso. A poucos metros de distância, na mesma rua, há um centro de reabilitação diferente, que não se atém à mesma norma.

PUBLICIDADE

O National Memorial for Peace and Justice, recentemente inaugurado, ocupa 2,5 hectares e pede o reconhecimento de uma das atrocidades menos admitidas nos Estados Unidos: o linchamento de milhares de negros em uma campanha de terror racista que se espalhou ao longo de uma década.

No centro, há um calçadão com 800 colunas de aço pendendo do teto. Gravado em cada uma delas, está o nome de um condado e das pessoas que foram linchadas nele - muitas simplesmente citadas como “desconhecidos”. As colunas aparecem inicialmente na altura dos olhos, mas o piso desce persistentemente e, no final, elas estão penduradas no alto, fazendo com que o espectador se encontre na posição dos que assistiam aos linchamentos públicos.

Algumas dessas atrocidades estão descritas resumidamente: "Parks Banks, linchado no Mississippi em 1922 por carregar a foto de uma mulher branca; Caleb Gadly, enforcado em Kentucky em 1894 por 'caminhar atrás da esposa do seu empregador branco'; Mary Turner, que, depois de denunciar o linchamento do marido, foi enforcada, pendurada de cabeça para baixo, queimada e depois esquartejada de maneira que o filho que ela carregava no ventre caiu ao chão."

Bryan Stevenson, fundador da Equity Justice Iniciative, a organização que criou o memorial, foi auxiliado por um pequeno grupo durante anos de pesquisas em arquivos e bibliotecas dos condados. Eles catalogaram 4,4 mil casos de linchamento.

O National Memorial for Peace and Justice em Montgomery, Alabama, inclui a estátua de um escravo, colunas com os nomes das vítimas de linchamentos, e uma mostra interativa com presos que estiveram no corredor da morte. (Audra Melton/The New York Times) Foto: Audra Melton para The New York Times

No local, estão também as reproduções de cada coluna, que deverão ser enviadas para os condados onde os linchamentos ocorreram. Moradores poderão solicitá-las - muitos já fizeram isto - mas terão de demonstrar que realizaram esforços nos respectivos locais para “corrigir a injustiça racial e econômica”.

Para Stevenson, cujos bisavós foram escravos na Virginia, os planos do memorial e de um museu ligado a ele têm suas raízes nas dezenas de anos passados nos tribunais do Alabama, testemunhando um sistema de justiça criminal que trata os afro-americanos com uma crueldade particular, ou com indiferença.

Publicidade

“Não estou interessado em falar sobre a história dos Estados Unidos ou por querer punir os Estados Unidos”, prosseguiu Stevenson. “Quero libertar os Estados Unidos. E acho que é importante para nós fazermos isto, enquanto organização que criou uma identidade dissociada da punição, na medida do possível”.

A poucas quadras dali, em um edifício que no passado abrigava o mercado de escravos de Montgomery, está o Museu do Legado, um monumento que complementa o memorial.

Não se trata de um museu convencional. Talvez possa ser descrito de maneira mais adequada como a apresentação de um argumento, respaldada por relatos em primeira mão e por documentos contemporâneos, mostrando que o sistema escravagista não acabou, apenas evoluiu.

Entre os relatos, está o de Anthony Ray Hinton, que passou 28 anos no corredor da morte no Alabama depois de ter sido condenado injustamente por dois assassinatos por um júri formado exclusivamente de brancos. Hinton sabe como é a injustiça que teima em persistir, mas é incisivo: "Se desistisse desesperado, estaria morto."

“Eu me recuso a acreditar que não haja esperança porque eu sou um produto do que pode acontecer quando a pessoa decide lutar”, afirmou. “Se nós não lutarmos, quem irá lutar?”

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.