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Mulheres afegãs protestam contra as restrições de direitos impostas pelo Taleban

Uma campanha nas redes sociais dentro da diáspora afegã celebra as tradições de vestimentas pré-Taleban e lamenta a perda dessa liberdade

Por Anna P. Kambhampaty
Atualização:

Neste verão (no hemisfério norte), Bahar Jalali assistiu ansiosamente aos Estados Unidos retirarem seus militares do Afeganistão e o Taleban começar a reassumir o controle do país. As mulheres foram orientadas a ficar em casa e se cobrir - um indicador inicial de que outros direitos, proteções e serviços para as mulheres seriam eliminados em breve, incluindo o direito de frequentar a Universidade de Cabul.

O Taleban ordenou queas aulas devem ser segregadas por sexo no Afeganistão a partir de agoraou pelo menos dividido por uma cortina. Foto: Aamir QURESHI / AFP

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Jalali, uma professora visitante associada da Loyola University Maryland, é membro da diáspora afegã - nascida em Cabul, criada nos Estados Unidos, mas ainda ligada ao seu país natal, para onde voltou em 2009 para lecionar na American University of Afghanistan. Ela partiu novamente em 2016, depois de sobreviver a um violento ataque do Taleban à universidade.

Quando surgiram relatos neste verão de que, com o controle do Taleban, as mulheres afegãs estavam destruindo seus diplomas e que casas seguras para mulheres estavam fechando suas portas, ela ficou perturbada.

Então, em 11 de setembro, ela viu imagens de centenas de mulheres em Cabul usando roupas pretas em véus completos e longas túnicas em uma manifestação pró-Taleban. (O momento da manifestação - o aniversário dos ataques terroristas de 11 de setembro - junto com a presença de combatentes do Taleban e declarações oficiais do Taleban divulgadas posteriormente sugerem que a manifestação foi organizada pelo Taleban.)

“Isso confirmou meus temores de que nossa cultura, nossa herança esteja sob ataque”, Jalali, 46, disse em uma entrevista por telefone. “Uma das maiores preocupações que tenho, agora que o Taleban voltou ao poder, é a soberania afegã, a identidade afegã, a cultura afegã, a herança afegã. Mesmo antes de o Taleban chegar ao poder, 43 anos de guerra realmente transformaram nossa cultura a ponto de perdermos aspectos muito importantes dela”.

Compelida a se manifestar, ela tuitou uma foto sua de 2005, usando um vestido verde esmeralda com delicados bordados - uma roupa tradicional que ela usou em seu primeiro casamento. “Esta é a cultura afegã”, ela escreveu na legenda.

O tuíte viralizou e, logo, mulheres em todo o mundo começaram a compartilhar suas fotos com roupas tradicionais afegãs, geralmente com a hashtag #DoNotTouchMyClothes.

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Jalali compartilhou outra foto dela quando adolescente nos Estados Unidos na década de 1990, usando um kuchi afegão azul e dourado, “um vestido que os nômades do Afeganistão usavam”, ela disse. “As mulheres Kuchi usam esse vestido diariamente. É o seu traje diário. ”

Jalali não esperava que seus tuítes viralizassem, mas agora ela espera que a hashtag possa ensinar mais ao mundo sobre a cultura afegã. “Só espero que o mundo veja através desses vestidos que a verdadeira cultura afegã é colorida, vibrante, viva, animada e realmente foi feita para celebrar a vida”, ela disse.

Zarifa Ghafari, uma ativista que se tornou uma das primeiras prefeitas do Afeganistão aos 26 anos em 2019 e teve que fugir do país em agosto, compartilhou no Twitter uma foto das roupas afegãs vibrantes que ela usou no início deste mês para os PeaceTalks de Genebra. “Com meu vestido colorido tradicional e uma mensagem poderosa de todas as partes do meu país representando o Afeganistão, particularmente as mulheres afegãs na #GenevaPeaceTalks”, ela escreveu.

“É importante criar consciência e mostrar as verdadeiras cores das mulheres no Afeganistão”, escreveu Ghafari mais tarde, em um comunicado por e-mail. “O Taleban está tentando apagar a presença das mulheres - apagá-las dos muros, das ruas, das escolas, do trabalho, do governo.

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“Somos muito mais do que um vestido, uma roupa”, ela escreveu. Mas “minha mãe, avó e gerações mais velhas usaram vestidos semelhantes com cores brilhantes. Esta é nossa bela herança, nossa rica cultura, nossa alegria de viver. ”

Na década de 1990, durante o primeiro regime do Taleban, o acesso das mulheres afegãs à educação, trabalho e saúde foi severamente restringido. As burcas eram obrigatórias, as mulheres não podiam ser vistas em público sem os homens e quase toda a educação feminina foi proibida.

Desde que o Taleban assumiu o poder em agosto, eles têm tentado parecer mais flexíveis. Ainda assim, embora as escolas tenham reaberto para alunos do sexo masculino, não foi anunciada uma data para o retorno das alunas. Além de exigir que as mulheres usem um hijab nas escolas, as alunas não terão permissão para estudar ao lado dos alunos, anunciou o ministro do ensino superior do Taleban, Abdul Baqi Haqqani.

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“É alarmante para mim porque sinto que as mulheres não terão mais um papel na sociedade e perderíamos todo o progresso que fizemos nos últimos 20 anos, desde que retomamos o controle do Taleban”, disse Marjan Yahia, 28, que nasceu em Cabul e se mudou para o Canadá quando tinha 6 anos.

Yahia, agora maquiadora meio-período e estudante em Virgínia, também se juntou à campanha nas redes sociais com um post no Instagram que a mostrava usando um kuchi ornamentado com moedas e espelhos costurados.

Foi um presente de seu pai, que o comprou para ela durante uma visita ao Afeganistão, disse Yahia. “O vestido é especial para mim porque simboliza a liberdade”, ela disse. “Antes de o Taleban assumir o governo do Afeganistão, as mulheres tinham a liberdade de se expressar através das roupas e é triste ver a liberdade sendo tirada delas.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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