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Ninho de pássaros: as aves são os melhores engenheiros da natureza

“Nossa hipótese é de que um ninho de pássaro pode ser na prática uma bomba de gravetos, contendo energia armazenada suficiente para mantê-lo rígido", diz pesquisador

Por Siobhan Roberts
Atualização:

O termo "ninho de pássaro” é usado para descrever emaranhados de todo o tipo. Mas isso é uma injustiça com as aves. Elas produzem maravilhas que ainda deixam os cientistas perplexos. Uma tentativa de desembaraçar a dinâmica estrutural do ninho está em andamento no laboratório do físico Hunter King, da Universidade de Akron, Ohio.

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“Nossa hipótese é de que um ninho de pássaro pode ser na prática uma bomba de gravetos, contendo energia armazenada suficiente para mantê-lo rígido", disse King. Ele publicou um estudo preliminar, “Mecânica dos filamentos aleatoriamente compactados — O 'ninho de pássaro’ como meta-material”, na Journal of Applied Physics. 

King e outros estão investigando questões simples: qual é o princípio mecânico por trás da estratégia de construção do ninho de pássaro? Quais são as características estatisticamente robustas do “estado de ninho”? O que distingue um ninho do mesmo punhado de gravetos dispostos de maneira aleatória ou compacta?

“As aves fazem algo que tenho chamado de ‘síntese mecânica’”, disse King. “Um químico sintetiza polímeros de diferentes comprimentos e resistências calculando quais serão as propriedades mecânicas desse material em massa", disse ele, mas “o pássaro escolhe elementos finos a partir do seu ambiente, usando algum critério de seleção com a expectativa do desempenho do ninho".

Um ninho possui certa química - uma alquimia. A partir de elementos elementos humildes, o resultado é maior que a soma de suas partes. E, supostamente, esse princípio genérico não seria exclusividade dos ninhos. Talvez seja algo que se aplique e maneira geral a estruturas da arquitetura, embalagem e outros setores.

Na Universidade de Akron, construção de ninhos de pássaros está sendo estudada Foto: Andrew Spear

King escolheu estudar o cardeal, ave que, ao fazer seu ninho, basicamente empurra alguns gravetos reunidos; o tordo, por exemplo, complica as coisas usando lama. Como escreveram King e outros: “Quando um cardeal constrói seu icônico ninho circular, ele usa o próprio corpo para moldar gravetos finos, fiapos de grama e pedaços de casca em uma estrutura que, apesar da maciez, mantém seu formato contra as mais diferentes perturbações mecânicas".

Ao criar um modelo da delicada interação da geometria do ninho, sua elasticidade e fricção, King e outros construíram um ninho artificial: um cilindro contendo centenas de lascas de bambu, cortadas a laser e reunidas aos montes. Então, ao redor delas, criaram uma câmara para medir a resposta do ninho ao ser repetidamente comprimido. King descobriu que, quando os elementos são compactados aleatoriamente, comportam-se de maneira coletiva, em um processo chamado de entalo.

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Karola Dierichs e Achim Menges, arquitetos do Instituto de Design Computacional e Construção da Universidade de Stuttgart, criaram partículas semelhantes a estrelas que são depositadas no lugar para formar uma estrutura semelhante a um ninho, exemplo do que chamam de “arquitetura da compactação". “A estabilidade é alcançada somente por meio de contatos aleatórios, e não de mecanismos adesivos locais, como a cola e os parafusos", disse Dierichs.

É claro que o ninho do pássaro não é totalmente aleatório; a ave entrelaça os elementos. Mas qual é a lógica universal por trás disso? Qual é a quintessência do “estado de ninho”? Como uma ave construindo seu ninho, King espera que uma “flexibilidade de pensamento” permita que “os princípios subjacentes venham à tona".

Ele e seus colaboradores exploraram como os materiais no ninho artificial são compactados, e como esse conjunto absorve a energia. Até o momento, observaram o que King chamou de “estado estável de histerese causado pelo escorregamento reversível". O termo “histerese” é derivado do grego antigo, significando “deficiência” ou “atraso". Descreve como um sistema físico se comporta diferentemente dependendo do que foi feito a ele anteriormente — o sistema tem uma história.

No laboratório de King, os gravetos foram lentamente comprimidos até alcançar o estresse máximo, e então soltos, repetidas vezes. Durante cada ciclo, os gravetos eram comprimidos cada vez mais, e recuavam, mas não completamente; é a histerese em ação. No fim, para uma dada espessura de graveto, o sistema identificava seu estado de densidade máxima, ou estado estável.

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Então eles embaralharam um pouco mais os gravetos. Mas seus dados indicavam que a histerese continuava. Foi algo inesperado e intrigante; os gravetos tinham densidade máxima, e não pareciam estar se reposicionando na câmara de esmagamento. A equipe passou a chamar isso de “histerese de estado estável".

Eles chegaram a uma explicação. Os gravetos estavam, afinal, se comprimindo mais, rearranjando-se levemente com a interação de cada um com seus vizinhos. Mas esse rearranjo se desfazia quando a compressão era liberada — “escorregamento reversível". O ninho se tornou uma mola assimétrica: rígido ao ser pressionado, macio ao ser liberado. Talvez esse seja o fenômeno que eles estão buscando: um processo subjacente às maquinações do ninho — sua resposta mecânica fundamental sob pressão — e que deve estar presente em outros sistemas. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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