Os cabarés de Paris podem ir além do cancã?

Turistas ainda se encantam com lugares como o Moulin Rouge, cujos shows são exóticos, porém antiquados

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Por Laura Cappelle
Atualização:

PARIS - Há atrações que os parisienses preferem deixar aos turistas, como a Torre Eiffel e os Champs-Élysées, assim como alguns dos programas mais populares da cidade: os dos cabarés. Enquanto os turistas em massa procuram o Moulin Rouge, o Lido ou o Crazy Horse, muitos dos apaixonados pelos teatros da capital nunca puseram os pés ali. O gênero que outrora era festejado em Paris perdeu interesse à medida que o tempo foi passando, nos últimos dez anos do século 20.

Os clientes do Lido e do Moulin Rouge podem beber e jantar, com um serviço de primeira, em dois espetáculos todas as noites. O show Féerie, do Moulin Rouge, é visto anualmente por cerca de 600 mil pessoas, a metade delas estrangeiras. Ela apresenta 100 artistas, mil figurinos cobertos de lantejoulas, cinco jiboias e custa 8 milhões de euros, o equivalente a mais de R$ 38 milhões.

Os shows do Moulin Rouge continuam extravagante, mas ainda estão presos ao passado. Foto: Stephane Franzese via The New York Times

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Mas os cabarés de hoje exigem que os clientes suspendam não apenas suas expectativas teatrais modernas, mas também a ironia. A dramaturgia é batida e o exotismo, antiquado. Além disso, o que predomina é o preconceito de gênero. 

O único objetivo é o deslumbramento, seja das plumas, das joias, dos acrobatas ou das mulheres nuas. Embora os cafés-concertos tenham iniciado a tendência do entretenimento ao vivo juntamente com a comida e as bebidas depois da Revolução Francesa, a cena do cabaré de Paris chegou ao ápice no final do século 19. O fim das restrições impostas às empresas teatrais em 1864 levou a um boom de locais como o Moulin Rouge, no bairro boêmio de Montmartre.

A Paris daquela época está retratada no Féerie do Moulin Rouge, e no Paris Merveilles do Lido. Paris Merveilles tem um espetáculo de mímica, projeções dos pontos mais importantes da cidade e mulheres em topless agitando a bandeira de três cores. O Moulin Rouge preservou as elegantes características de seu auditório Belle Époque, e Féerie faz referência a Toulouse-Lautrec, que pintava o cabaré.

O Moulin Rouge também conta com seu espetáculo mais famoso, o cancã, apresentado pela primeira vez no local em 1889, ano de sua inauguração. A dança em que as garotas jogam as pernas para o alto, originado nos bailes do século 19, tem lugar de destaque em Féeries, com os bailarinos vestidos nas cores da bandeira francesa.

Os conjuntos femininos - mulheres altas, magras, quase uniformemente brancas - foram reproduzidos em parte nos corpos de baile das mulheres das Ziegfild Follies americanas, que fizeram enorme sucesso nos anos 1910 e 1920. Suas herdeiras são as Rockettes de Nova York, mas, ao contrário delas, as “girls” de Paris (como elas são chamadas pelos parisienses) também devem se apresentar em topless.

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Há quadros que mostram as bailarinas exibindo uma técnica muito apurada, enquanto outros as tratam como mera decoração. O Crazy Horse oferece uma vitrine das melhores artistas, com seu show Totally Crazy!

No histórico show de abertura, God Save Our Bareskin, doze bailarinas usam chapéus de pele de urso e pouca coisa mais, mas outras vezes, o quadro maravilhosamente iluminado destaca a qualidade das artistas e suas habilidades na dança. Nahia Vigorosa (todas as bailarinas usam nomes artísticos) traz força bruta e projeções em Lay Laser Lay, um número solo em uma roda que gira. Já em Striptease Moi, Daizy Blu e Lolita Kiss-Curl recriam uma brincadeira com os sexos, em que uma delas se veste como homem.

Há uma abundância de talentos, mas pouca criatividade. Que rumo tomará o teatro de revista do século 21? Será ainda viável? A resposta talvez seja não, mas pelo menos os turistas encontrariam em Paris mais portas de acesso para o futuro.

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