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Os planos de renovação da Notre-Dame revoltam alguns preservacionistas

Uma comissão de especialistas em patrimônio aprovou propostas para trazer arte contemporânea e mudar alguns móveis para dar mais espaço aos visitantes. Os críticos dizem que a medida vai rebaixar a Igreja centenária

Por Constant Méheut
Atualização:

PARIS - A última de uma série de polêmicas que cercaram a renovação da Notre-Dame ocorreu na quinta-feira, quando uma comissão de especialistas em patrimônio deu luz verde para uma reforma no interior da catedral atingida pelo fogo.

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A Comissão de Arquitetura e Patrimônio Nacional da França aprovou propostas da diocese de Paris para dar um visual mais moderno à Notre-Dame antes de sua reabertura planejada para 2024, incluindo a instalação de obras de arte contemporâneas e novos efeitos de iluminação. Os oponentes dizem que as mudanças vão rebaixar a catedral de 850 anos e perturbar a harmonia de seu design gótico.

A comissão de patrimônio também autorizou os administradores da catedral a reorganizarem o tabernáculo e outros itens para criar mais espaço para os visitantes. O Monsenhor Patrick Chauvet, pároco da Notre-Dame, disse que as propostas permitiriam uma visita mais fácil e agradável ao monumento religioso e criariam "um diálogo" entre a arquitetura medieval da Notre-Dame e características novas e mais modernas.

Os planos de renovação da Notre-Dame revoltam alguns preservacionistas Foto: Christian Hartmann/Reuters

Obras de arte dos séculos 20 e 21 podem ser colocadas ao lado de pinturas de antigos mestres da coleção da catedral, como "Natividade da Virgem Maria", de Mathieu Le Nain, disse Chauvet.

Ele acrescentou que a diocese também está considerando projeções de luz nas paredes de algumas capelas que exibiriam pequenos trechos da Bíblia.

A maioria dos confessionários mudaria para o primeiro andar na reorganização dos cerca de 2.000 itens de mobiliário da catedral, disse Chauvet, e os mais de 12 milhões de visitantes anuais da Notre-Dame entrariam pelo portal central em vez de por uma porta lateral.

“A ideia é que os fiéis, ou visitantes, fiquem primeiramente impactados pela grandeza, pela beleza da Notre-Dame”, disse Chauvet.

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No entanto, a adição de toques modernos ameaça desfigurar a catedral, de acordo com dezenas de figuras culturais e intelectuais que se manifestaram contra as propostas.

A Notre-Dame já passou por mais de dois anos de cuidadosos esforços de restauração, depois de um incêndio no local em abril de 2019, que destruiu a torre e a maior parte do telhado. O prédio já está seguro o suficiente para que se inicie o processo de reconstrução, que deve ser concluído a tempo para as Olimpíadas de 2024 em Paris.

Inicialmente, as autoridades francesas pensaram em aproveitar a oportunidade para retrabalhar significativamente a arquitetura da catedral. Os especialistas em patrimônio recomendaram que o monumento fosse restaurado ao seu estado anterior e, no ano passado, o presidente Emmanuel Macron abandonou a ideia de substituir a torre do século 19 por algo mais contemporâneo.

Na terça-feira, cerca de 100 figuras públicas na França assinaram uma carta aberta no jornal conservador Le Figaro intitulada “Notre-Dame de Paris: O que o fogo poupou, a diocese quer destruir”.

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Os signatários, que incluem Alain Finkielkraut e Pierre Nora da prestigiosa Académie Française, disseram que algumas propostas lembram projetos culturais “ ‘imersivos”’onde, muitas vezes, a futilidade compete com o kitsch".

O jornal Le Monde disse que as propostas levaram a uma batalha feroz dentro da Igreja Católica Francesa entre “os defensores da modernidade e do ecumenismo e os guardiões de um conservadorismo nostálgico”.

Alguns jornais britânicos conservadores criticaram trechos do plano de renovação sobre a criação de "espaços emocionais" e "um tour de descoberta". Uma manchete do The Daily Telegraph dizia que a Notre-Dame enfrentava uma "reformulação estilo Disney".

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Didier Rykner, editor-chefe da revista de arte La Tribune de l'Art e um dos signatários da carta aberta no Le Figaro, disse que as críticas da imprensa britânica se baseavam em caricaturas, mas que concordava com sua tônica geral.

“É uma senhora idosa”, ele disse sobre a igreja. “Tem uma história que devemos respeitar, que as pessoas de hoje não podem apagar em uma canetada.”

A comissão de patrimônio pode ter ouvido algumas das críticas. Ela não aceitou a proposta apresentada pela diocese na íntegra e rejeitou ou questionou alguns elementos. O comitê negou um pedido, por exemplo, para remover estátuas de santos de várias capelas. Ele também pediu uma revisão de um projeto para bancos removíveis que foram propostos como uma substituição para as tradicionais cadeiras de madeira da catedral, de acordo com um comunicado divulgado na quinta-feira pelo ministro da Cultura.

Chauvet disse que as mudanças no interior de Notre-Dame não eram revolucionárias e apenas "trariam um pouco mais de sentido aos visitantes".

“Não pense que vamos fazer uma Disneylândia”, ele disse. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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